A paisagem pós-guerra nas cidades mais atingidas pelo terremoto que desencadeou um grande tsunami no Japão, no último dia 11, poderia ser bem pior em países onde a capacidade de reagir e se mobilizar não são traços tão marcantes na cultura local. Submetidos desde cedo a rígidos códigos morais e a educação metódica, japoneses levam vantagem diante de alguns outros povos, por exemplo, no respeito a seus idosos — mais de 29 milhões passaram da barreira dos 65 anos.
No país onde os mais velhos são reverenciados pelos mais novos, não é de se estranhar que valores como doação, renúncia e solidariedade tenham se destacado tanto em mais essa triste catástrofe, que reúne fatores ambientais — a fúria da natureza — e relacionados à economia, pelo fato de estar alicerçada sobre uma matriz energética nuclear.
Mas mesmo em condições extremas — um dos mais fortes sismos da história, ondas gigantes que cobriram prédios inteiros, e não só casas, inverno rigoroso e risco de colapso nuclear e econômico —, os japoneses prosseguem praticamente sistemáticos nos cuidados com feridos e órfãos, na busca por sobreviventes e nos esforços para evitar novas tragédias.
Seria algo como misturar ação, razão, emoção e fé. No Japão, falhar é motivo de vergonha. Mas ainda que mais vidas venham a ser perdidas em consequência do terremoto, pode-se dizer dessa sociedade que obteve êxito desde as primeiras horas após a tragédia — exemplo de cidadania.
Esse comportamento se reflete na comunidade nipônica fora da ‘Terra do Sol Nascente’, visto a articulação de imigrantes e descendentes no Brasil, onde fica a maior parte da população de origem oriental fora no Japão. Nesses momentos, a ajuda é o que faz diferença.
Onda de solidariedade com o Japão envolve comunidade global
Nove dias depois do desastre natural que deixou milhares de pessoas sem lar no Japão, uma onda de solidariedade percorre o mundo inteiro, se prolifera pela internet, arrecada doações e chega também a países tradicionalmente hostis à nação asiática. Pelo menos 8.277 pessoas morreram e 12.722 desapareceram em consequência do terremoto de magnitude 9 na escala Richter e do posterior tsunami que varreu do mapa localidades inteiras do nordeste do Japão, levando quase 400 mil pessoas a viver em abrigos temporários.
A rede de televisão "NHK" informou neste domingo que as equipes de emergência resgataram duas pessoas com vida sob os escombros na província de Miyagi - uma mulher de 80 anos e um adolescente de 16 -, com a passagem das horas é cada vez mais improvável que haja sobreviventes e quase certo que o número de vítimas aumentará.
A tragédia, considerada pelo primeiro-ministro Naoto Kan o maior desastre natural no Japão desde a Segunda Guerra Mundial, foi respondida com incontáveis e incomuns mostras de solidariedade para um país desenvolvido, particularmente a terceira maior economia mundial que vive uma crise sem precedentes.
Além de donativos provenientes de todo o mundo, já são mais de 100 os países que forneceram soldados, material humanitário e equipes de resgate para ajudar na reconstrução da faixa devastada do nordeste japonês. E entre esses países estão China e Rússia, com os quais o Japão teve recentes atritos.
Os Estados Unidos, principal aliado de Tóquio, forneceu 17 mil militares para auxiliar nos trabalhos de resgate, além de 100 aviões, 4 mil marines (fuzileiros navais) e 14 navios, enquanto a Coreia do Sul enviou 230 mil garrafas de água, Taiwan concedeu 500 geradores de eletricidade e a China despachou 15 soldados de resgate.
Quanto aos donativos, estão a cargo da Cruz Vermelha japonesa ("http://www.jrc.or.jp/"), com a colaboração de sites de empresas como a rede de televisão "NHK", a loja virtual Rakuten, as companhias aéreas JAL e ANA e os buscadores Google e Yahoo!, entre outros.
O dinheiro, em muitos casos, é enviado por celulares - há mais de 100 milhões no Japão, quase todos com acesso à internet -, mediante um sistema de pontos ou milhas que são convertidos para ienes (moeda japonesa).
Através do Yahoo! Japan, por exemplo, só neste domingo já haviam sido arrecadados 1,244 bilhão de ienes (R$ 25,746 milhões), doados por 761.478 pessoas. O dinheiro será entregue à Cruz Vermelha para a reconstrução no norte do Japão e para o atendimento aos desabrigados.
Outros 278.645 japoneses preferiram colaborar através dos sites da loja de vídeos Tsutaya e das lojas de conveniência (combini) Familiy Mart, que arrecadaram até este domingo 133 milhões de ienes (R$ 2,752 milhões).
Além disso, nas ruas do Japão, muitos estudantes estão há dias recolhendo donativos em caixas, instaladas também em numerosos restaurantes e lojas, que recebem dinheiro para a Cruz Vermelha.
Fora do Japão, os que também querem, podem entregar seus donativos para a reconstrução do país asiático através de sites como Amazon, Paypal e iTunes.
Também foram organizados outros métodos de solidariedade. A marca Ralph Lauren está vendendo camisas brancas desenhadas com o sol nascente vermelho da bandeira japonesa.
Já a cantora pop Lady Gaga comercializa pulseiras com os dizeres "We pray for Japan" ("Nós rezamos pelo Japão"), que, em 48 horas, já arrecadaram mais de US$ 250 mil (R$ 418 mil).
O principal objetivo das coletas é atender às 380 mil pessoas que ficaram sem casa e permanecem em 2,2 mil abrigos no território japonês.
Em um deles, no estádio de Saitama, ao norte de Tóquio, vive praticamente toda a população da vila de Futaba, localizada próximo à usina nuclear de Fukushima (nordeste do Japão), de onde foram desalojadas cerca de 200 mil pessoas diante da ameaça de fuga radioativa. |
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