Jovens gerados com doação anônima de óvulos e esperma iniciam movimento pelo direito de conhecer seus pais biológicos
PROCESSO
Olivia luta na Justiça para ter identidade de doador
Simples? Longe disso. Trata-se, na verdade, de uma demanda delicada, complexa, e para a qual ninguém havia se preparado. Há 30 anos, quando os avanços na reprodução assistida começaram a permitir a realização de procedimentos sofisticados, parecia tranquilo imaginar o uso de óvulos ou esperma doados de forma anônima em nome do sonho de ter um filho. E era. Para os pais, representava a solução do problema. No entanto, à época não se imaginou que as crianças geradas dessa forma pudessem manifestar o desejo de conhecer seus outros pais biológicos. A grande questão é que os doadores, em sua maioria, só fizeram as doações por causa da garantia do anonimato e de que ninguém surgiria, anos depois, apresentando-se como seu filho. O impasse, como se vê, está colocado.
À primeira vista pode parecer estranho ir atrás de quem doou o óvulo ou o esperma. A motivação para fazê-lo, porém, não se resume a mera curiosidade. “Não sei qual a influência do meu pai biológico sobre quem sou, mas não poder conhecê-lo significa nunca responder a essa dúvida”, disse Olivia à ISTOÉ. A jovem sempre soube que foi gerada com esperma doado. E é com o apoio dos pais que ela tenta obter na Justiça canadense a autorização para acessar as informações sobre o doador. Alana S. também sabe desde criança que seu pai biológico é um doador de esperma. Mas a inquietação em relação às suas origens a levou a buscar a identidade do doador e a criar um site no qual reúne histórias de jovens como ela, de doadores e de pais. “Reuni diferentes pontos de vista. Todos são relevantes para entender a questão”, disse à ISTOÉ.
AÇÃO
Site de Alana reúne relatos de quem, como ela,
é fruto de doações anônimas de gametas
O fim do anonimato, porém, poderia ter um impacto negativo sobre a quantidade de pessoas dispostas a doar. “O número de doadores cairia”, prevê a médica Vera Féher Brand, diretora do Pro-Seed, um dos maiores bancos de sêmen do País. “Se tivesse de me identificar, não doaria, pois teria o risco de me envolver com a pessoa gerada pela doação”, diz Paulo (nome trocado), 27 anos, doador há um ano.
Uma questão levantada pelos defensores da quebra do anonimato é o direito da criança de conhecer a história de saúde de seus pais biológicos. O argumento é procedente, já que um bom gerenciamento da saúde inclui saber os antecedentes familiares de doenças. “O doador é uma parte do filho gerado”, diz Leann Mischel, presidente de um grupo americano que cruza dados de doadores e filhos de doação. “E o filho precisa conhecer a saúde dos pais.”
Ainda não há consenso sobre o que fazer em relação à demanda. Em alguns países, como a Noruega, jovens com mais de 18 anos podem conhecer seus pais biológicos. No Brasil, o anonimato persiste. E não há sinal de mudança. “Não houve pressão para alterar as normas vigentes”, diz Reinaldo Ayer, coordenador de bioética do Conselho Regional de Medicina de São Paulo.
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