Terapias complementares
Como o monge pode ajudar os médicos
No Brasil, o budista Bhante Yogavacara Rahula defende a ideia de que a meditação pode ajudar a tratar doenças. Os médicos brasileiros concordam
Aretha Yarak
O monge budista Bhante Yogavacara Rahula está no Brasil para participar de retiros espirituais e ensinar técnicas da meditação (Divulgação)
Nesta semana, o respeitado Hospital das Clínicas de São Paulo – uma das maiores instituições de saúde do país, referência em pesquisa médica – abriu suas portas para uma visita inusitada e inédita: um monge budista, Bhante Yogavacara Rahula. A convite do ortopedista Rafael Ortiz, professor do Faculdade de Medicina da USP, o americano fez uma palestra a médicos e demais interessados nos benefícios da meditação à saúde, especialmente em casos de depressão, pressão alta, câncer e doenças psicossomáticas. Ex-combatente da Guerra do Vietnã, monge Bhante descobriu na Ásia, após desligar-se das Forças Armadas americanas, o budismo, que o levou a renunciar à vida laica e ordenar-se monge, em 1975. Ali, começaria a aprender as lições que quer ensinar aos médicos."Acredito que a meditação é mais uma forma de prevenção do que de cura", diz Bhante. Da meditação, prática essencial da filosofia budista, tirou o que prega serem as lições efetivas de cuidados com a saúde e prevenção de doenças. Surpreso, constata que é o Ocidente, reino da razão e da ciência, o território em que mais cresce o interesse pela meditação aplicada à saúde. "Nessa porção do mundo, as pessoas têm o costume de tratar seus problemas a partir dos sintomas. É como olhar de fora para dentro", diz. "Ao contrário disso, deveríamos nos esforçar para sintonizar mente e corpo, para perceber os sinais que o organismo nos envia. Isso se faz por meio da meditação."
Rafael Ortiz, do HC de São Paulo
Não é preciso acreditar em tudo o que o religioso diz. Mas é importante saber que ele não prega no deserto. A palestra realizada no teatro do HC de São Paulo estava lotada de médicos de diversas especialidades. A audiência se explica. A prática da meditação vem se tornando mais e mais reconhecida como recurso terapêutico auxiliar a uma série de tratamentos convencionais. A ciência revela por quê. "Os exames de ressonância magnética e tomografias identificam as mudanças de padrão de funcionamento em áreas cerebrais quando se pratica a meditação", diz Ortiz, o ortopedista. Regiões relacionadas à felicidade passam a ser ativadas, enquanto aquelas ligadas à fuga e à luta – reações ao stress – deixam de serem ativadas. "Isso tem reflexo direto na maneira como o organismo mantém seu equilíbrio interno."
Marcelo Saad, fisiatra e acupunturista do Hospital Israelita Albert Einstein, explica que as doses extras de hormônios liberadas em situações de stress são extremamente desgastantes ao organismo: aumentam a frequência cardíaca e desequilibram os níveis de glicose e do sistema imunológico. "Quando a rotina diária, o trânsito ou mesmo o chefe passam a ser vistos como elementos desagradáveis em nossas vidas, há um desgaste precoce do organismo", diz Saad. "A meditação possibilita um restabelecimento do equilíbrio da atividade cerebral e, consequentemente, do organismo."
O próprio hospital Albert Einstein realiza pesquisas para aprofundar o conhecimento na área. E a meditação já é prática oferecida a pacientes do setor de oncologia. Os resultados são positivos, segundo o cirurgião Paulo de Tarso Lima, responsável pela Área de Medicina Integrativa do Centro de Oncologia e Hematologia do Einstein. Na visão dele, com a prática, os pacientes desenvolvem a capacidade de lidar com a dura tarefa de combater a doença e ao mesmo tempo dar continuidade à rotina. "É como se o paciente se religasse ao seu presente, o que inclui seu trabalho, sua família e tudo que continua à sua volta, a despeito da doença", diz Tarso Lima.
Recurso terapêutico: pesquisas científicas confirmam benefícios da meditação à saúde
Desde 2006, o Ministério da Saúde oferece pelo Sistema Único de Saúde (SUS) sessões de meditação na rede pública nacional pela Política de Práticas Integrativas e Complementares. Só em 2010, foram 580.000 sessões. É provável que um bom número de pessoas atendidas no serviço, além de outras tantas que o fazem no âmbito privado, procurem atingir o estado emocional que o monge promete por meio da meditação. "Uma existência simples, com pensamentos positivos." Se a prática oriental ajudar nesse processo, terá feito muito pela saúde.
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