2.17.2012

Timidez: como usá-la a seu favor

Novas pesquisas mostram que os introvertidos podem ser mais concentrados, mais criativos - e mais bem-sucedidos

NATÁLIA SPINACÉ. COM NATHALIA ZIEMKIEWICZ

Bianca Salgueiro (Foto: Tomás Rangel/ÉPOCA)

Eles estão em todos os lugares, na vida real e na ficção, da literatura clássica à cultura pop. O introvertido número um da literatura talvez seja Julien Sorel, protagonista do romance O vermelho e o negro, do século XIX. Fã de filosofia e de leituras religiosas, o personagem criado pelo francês Henri-Marie Beyle, conhecido como Stendhal, leva centenas de páginas até conseguir se aproximar de sua amada, Madame de Renal – uma paixão proibida, pois ela é casada com o prefeito da fictícia cidade de Verrières. Na cultura pop, esse papel é exercido por Clark Kent, habitante de outra cidade fictícia, Metrópolis, que ganha a vida como repórter do jornal Planeta Diário. Criação do gigante dos quadrinhos DC Comics, Kent treme quando se aproxima da colega Lois Lane, por quem é apaixonado, e só se torna mais desinibido quando veste a cueca por cima da calça e combate o crime com a capa de Super-Homem.
A ficção imita a realidade, na medida em que Sorel, Kent e os introvertidos da vida real padecem do mesmo desajuste: viver numa sociedade que valoriza os populares, os esfuziantes, os palradores e despreza os que coram, gaguejam, suam nas mãos. Aqueles que, em resumo, lamentam que a espécie humana seja gregária obrigando-os a interagir o tempo todo com seus semelhantes. E que veem uma profunda e incômoda realidade na máxima do filósofo francês Jean-Paul Sartre, que escreveu que “o inferno são os outros”.
Para os representantes dessa turma, o livro Quiet: the power of introverts in a world that can’t stop talking (algo como Quietos: o poder dos introvertidos em um mundo que não para de falar), da americana Susan Cain, é mensageiro de uma boa-nova. A obra, que chegará às livrarias brasileiras em maio pela Editora Agir, contraria um lugar-comum, segundo o qual tímidos e introvertidos devem fazer um esforço para deixar de ser o que são, como se tivessem uma doença. Para Susan Cain, é exatamente o oposto. Os tímidos e os introvertidos mais bem-sucedidos são justamente aqueles que transformam timidez e introversão em aliados ao longo da vida.
Timidez e introversão, embora tratadas corriqueiramente como sinônimos, descrevem, segundo os psicólogos, características distintas. A timidez é o sofrimento pela exposição ao julgamento alheio. Acomete aqueles que temem passar vexame, cometer erros ou não encontrar as palavras adequadas. Já a introversão caracteriza aqueles que preferem ficar sozinhos e se sentem mais à vontade e produtivos no isolamento e no silêncio. Quase todo tímido desenvolve um comportamento introvertido, mas o inverso não é verdadeiro. Alguns introvertidos podem ser até desinibidos, como o presidente americano, Barack Obama. Ele não treme diante do público. Apenas valoriza seus momentos de paz com a família – ou sozinho, lendo e escrevendo.
O que tímidos e introvertidos têm em comum, de acordo com Susan Cain, é uma certa circunspecção que, bem administrada, pode ser útil para o sucesso pessoal e profissional. Claro que Susan não se refere ao antissocial patológico, portador de níveis de ansiedade insuportáveis diante de situações sociais corriqueiras, como frequentar um restaurante lotado. Nesses casos, os especialistas recomendam tratamento com psicólogos e o uso de remédios à base de serotonina. Fora desse extremo, existem vários casos de sucesso entre tímidos e introvertidos, do já citado Barack Obama ao compositor Chico Buarque (leia exemplos nos quadros abaixo).
Entre eles está a própria autora do livro. Quem lê o currículo de Susan Cain não suspeita que a advogada que se tornou consultora de liderança de grandes grupos – como o Merrill Lynch, um dos maiores bancos de investimento do mundo – sue frio antes de dar palestras sobre estratégias de negociação. Susan é formada pelas prestigiadas universidades Princeton e Harvard, defendeu por sete anos causas de empresas como o gigante General Electric e ganha dinheiro ensinando executivos de Wall Street a negociar. Ela garante que seu sucesso no mundo corporativo se deu graças a esses traços – e não apesar deles. As tendências solitárias dos introvertidos são, na verdade, os poderes que podem transformar Clark Kents em Super-Homens. “Aprendi que somos ótimos negociadores porque pensamos antes de falar, nos expressamos com calma e escutamos o que os outros falam”, afirma Susan. Ela não advoga apenas em causa própria. Segundo um levantamento do psicólogo americano Jonathan Cheek, professor da Universidade Wellesley, para cada meia dúzia de pessoas há dois ou três introvertidos.

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