Televisão
Temática, texto e ritmo estão entre os elementos elencados por especialistas para explicar o que tem afastado o público das 3 principais tramas da emissora
Mariana Zylberkan
A explicação para o desabamento da audiência de novelas diferentes não apenas no conteúdo, mas também no horário de exibição e no público-alvo, naturalmente, não pode repousar em um único motivo. O diagnóstico é específico para cada trama e contempla elementos como tema, texto, elenco, direção e fotografia (veja lista abaixo). Há, porém, fatores de maior amplitude que afetam a todas, sem distinção. Caso da renovação representada por Avenida Brasil, que paira como um fantasma sobre as fórmulas clássicas – e cansadas – de folhetins como Salve Jorge. O público se acostumou à linguagem proposta pelo autor João Emanuel Carneiro, mais veloz e próxima tanto do cinema como dos seriados americanos, e sente falta da família Tufão.
O que tem afastado o público das novelas da Globo
'Lado a Lado'
A história de época com cara de cinema -- a fotografia é assinada por Walter Carvalho -- tem alcançado meros 18 pontos de média na Grande São Paulo, segundo o Ibope. A explicação para o fraco desempenho de uma trama de apuro visual está na densidade dos temas retratados na faixa das seis, por tradição leve e pouco pretensiosa. “Escravidão e preconceito contra a mulher são assuntos pertinentes, mas fortes demais para o público do horário, acostumado a temas mais leves”, diz Maria Cristina Mungioli, professora adjunta do Centro de Estudos da Telenovela da ECA/USP. Numa cena exibida nesta semana, Zé Maria (Lázaro Ramos) foi açoitado impiedosamente pelo comandante da Marinha, episódio que deflagrou a Revolta da Chibata na trama. Cenas pesadas para quem acaba de chegar em casa do trabalho ou da escola se tornam quase angustiantes pela escuridão de algumas imagens, fiéis ao Rio de Janeiro do início do século XX, que vivia então nos primórdios da iluminação elétrica. Uma boa ideia para o cinema, que se vale mesmo de salas escuras, mas que não funciona tão bem na televisão. “Contrasta com a claridade prolongada do horário de verão”, diz Claudino Mayer, doutor em teledramaturgia pela USP.É certo que existe um tempo de luto que prejudica uma novela estreante – Jane Marques, doutora em ciência da comunicação e professora de Marketing da Universidade de São Paulo (USP), diz que esse período pode ter até um bimestre. Mas, com quase um mês de exibição, apresentar média de 29 pontos na faixa das nove é um fato capaz de levantar dúvidas quanto à capacidade de Salve Jorge de se vender. O que dizer então de Lado a Lado, que estreou em 10 de setembro e tem, portanto, quase três meses?
Oficialmente, a Globo declara satisfação com os números alcançados, mas não deixa de pôr uma parcela da culpa no horário de verão. “Além do tradicional impacto do horário de verão e da natural adaptação do público às novas tramas, todas elas estão indo bem. A TV Globo está satisfeita com seus desempenhos”, declara a Central Globo de Comunicação em nota. A emissora afirma que Lado a Lado, Guerra dos Sexos e Salve Jorge são líderes em seus horários, com grande diferença em relação à concorrência, e cita as médias nacionais de cada uma: Lado a Lado tem 23 pontos, Guerra dos Sexos registra 27 e Salve Jorge, 34 pontos. Melhor que a de São Paulo, a média nacional não é contudo a que interessa ao mercado publicitário. Além disso, responsabilizar o horário de verão não é suficiente para esclarecer a questão.
Especialistas em teledramaturgia ouvidos pelo site de VEJA apontaram detalhes em Lado a Lado, Guerra dos Sexos e Salve Jorge que podem contribuir para o afastamento do público. A novela das seis, por exemplo, trata de temas pertinentes, porém, muito densos para o horário, como escravidão e preconceito contra a mulher, na opinião de Maria Cristina Mungioli, professora adjunta do Centro de Estudos da Telenovela da ECA/USP.
O elenco de Guerra dos Sexos, apesar de recheado de estrelas, está mal dividido e bons atores como Edson Celulari foram designados para papéis que não condizem com seus perfis. “Ele está muito mal. Cada vez que entra em cena, tenho vontade de olhar para o outro lado, a interpretação está muito caricata”, diz a dramaturga Renata Pallottini, professora aposentada de dramaturgia da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP.
Salve Jorge peca pela repetição de elementos vistos em tramas anteriores de Gloria Perez, o que deixa o telespectador entediado. “A autora está se repetindo muito, o que deixa a novela chata. A gente já viu tudo anteriormente”, diz Renata.
Não à toa, já circulam rumores de que a Globo ouvirá espectadores para estudar mudanças em suas novelas, medida que é tradicional na emissora e, agora, altamente providencial. Como qualquer casamento, o que une público e novela há tantos anos precisa de uma conversa transparente e sincera para superar a crise. E ter dias felizes para sempre. Ou, ao menos, até que venha a próxima trama.
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