5.25.2012

Acessibilidade em Porto Alegre é uma das maiores, mas ainda é restrita

G1 acompanhou deslocamento de cadeirante pela capital gaúcha.
Dados são do IBGE sobre características do entorno dos domicílios.

Felipe Truda Do G1 RS

Cadeirante Dilceu Flores Júnior enfrenta dificuldades para se locomover (Foto: Felipe Truda/G1) 
Rampas de acesso mal conservadas dificultam a locomoção de cadeirantes
 (Foto: Felipe Truda/G1)
Porto Alegre é a cidade com a maior proporção de rampas de acesso para cadeirantes entre os 15 municípios brasileiros com mais de 1 milhão de habitantes, segundo estudo divulgado nesta sexta-feira (25) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). O estudo foi realizado em 96,9% dos domicílios urbanos durante a pré-coleta do Censo 2010, com o objetivo de conhecer a infraestrutura urbana brasileira.
De acordo com os dados, a capital do Rio Grande do Sul oferece rampas no entorno de 23,3% dos domicílios. O percentual nacional é de 4,7%, o tipo de infraestrutura urbana menos presente nos municípios brasileiros entre os observados pelo IBGE.
Para quem precisa das rampas, no entanto, a capital gaúcha ainda está longe da situação ideal. Com exceção do Centro da cidade, a maioria dos bairros apresenta problemas que limitam o ir e vir de pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida.
“Quando precisamos ir aos bairros, enfrentamos os obstáculos. E posso dizer tranquilamente que em todos os bairros há problemas”, avalia Dilceu Flores Júnior, de 40 anos, 32 deles sobre uma cadeira de rodas. O G1 acompanhou nesta quinta (24) o trajeto dele do bairro Farrapos, um dos mais movimentados de Porto Alegre, até o Centro.
Dilceu trabalha na Fundação de Articulação e Desenvolvimento de Políticas Públicas para Deficientes no Rio Grande do Sul (Faders). Morador de Viamão, na Região Metropolitana, ele precisa se deslocar até o local de trabalho, que fica na Avenida Duque de Caxias, de ônibus.
Em alguns pontos, Dilceu não consegue andar (Foto: Felipe Truda/G1) 
Em algumas calçadas esburacadas, Dilceu não
consegue avançar (Foto: Felipe Truda/G1)
O ônibus tem porta especial para deficientes físicos. Dos cerca de 1,6 mil veículos que circulam pela cidade diariamente, 887 estão adaptados. Porém, segundo Dilceu, os horários das conduções ou não são planejados ou são muito mal divulgados. “O ônibus adaptado passa três vezes à tarde, mas não há como saber quando eles vêm”, reclama.
No teste feito durante a tarde, a intenção era chegar da Avenida Farrapos até o terminal de ônibus Flórida, próximo à Rua Comendador Azevedo, para se deslocar ao Centro de ônibus.
No início do percurso, a primeira adversidade: parte de uma rampa de acesso estava destruída. Em alguns pontos, o jeito foi usar as rampas para carros. “Aí temos de dar um ‘jeitinho brasileiro’. Eu sei me virar porque me acostumei. Se um estrangeiro cadeirante vem para cá, não vai saber fazer o que faço e não vai sair do lugar. Porto Alegre está preparada para a Copa do Mundo?”, questiona o morador.
 Contêiner Acessibilidade (Foto: Felipe Truda/G1) 
Dois contêineres de lixo também atrapalharam o caminho de Dilceu. No primeiro, ele precisou passar pela faixa. No segundo, precisiu espremer-se entre o contêiner e a parede (Fotos: Felipe Truda/G1)
Já no terminal de ônibus, o cadeirante precisou de ajuda de pessoas que passavam pelo local para chegar ao ponto. Não demorou muito a passar um ônibus adaptado. Ao ingressar no veículo, Dilceu precisou da ajuda do cobrador.
Segundo ele, a intervenção foi necessária devido a uma falha no sistema que recolhe o cadeirante. “Falta manutenção. Não adianta simplesmente adaptar o veículo. A pessoa está tendo acesso ao serviço, é preciso dar toda essa garantia”, afirma.
Paralelepípedo não adaptado causou problemas no desembarque (Foto: Felipe Truda/G1) 
Paralelepípedo não adaptado causou problemas
no desembarque de ônibus (Foto: Felipe Truda/G1)
Ao sair da condução, Dilceu se deparou com mais um problema: o pavimento do terminal de ônibus não é adequado para receber cadeirantes. Resultado: a plataforma por onde o cadeirante desce raspou no paralelepípedo. Foi preciso o ônibus se afastar e o cobrador, novamente, auxiliar Dilceu para que ele conseguisse seguir o seu trajeto.
No Centro da cidade, a equipe de reportagem do G1 conversou com outros dois cadeirantes. Morador da Restinga, Roberto Ferreira, de 43 anos, reclama dos carros estacionados sobre a ciclovia recentemente construída no bairro localizado na Zona Sul. O local também deveria ser utilizado por deficientes. “Ficaria uma maravilha com a ciclovia. O problema é que virou estacionamento.”
Já a locomoção diária da vendedora Ana Cristina Silva, de 39 anos, é ainda mais repleta de contratempos. Ela diz não conseguir andar sem ajuda no bairro Bom Jesus, na Zona Leste, onde mora. “Minha mãe tem de andar comigo, ou meus filhos. E para subir no ônibus, não há rampa de acesso. Nenhuma rua lá tem rampa”, desabafa.
Rampas raras
O número de Porto Alegre contrasta com Fortaleza, que possui apenas 1,6% de calçadas rebaixadas. Entre as regiões, Sul e Centro-Oeste tiveram o melhor desempenho, de 7,8%. As regiões Norte e Nordeste têm o pior percentual registrado: 1,6%.
A Secretaria Municipal de Acessibilidade e Inclusão Social de Porto Alegre informa que está abrindo licitação para 400 rebaixamentos de calçada na cidade. “A Prefeitura também está exigindo dos proprietários (de imóveis) a reforma das calçadas e estamos acompanhando para que sejam calçadas com acessibilidade”, diz o titular da pasta, Aracy Ledo.
Restinga Ciclovia (Foto: Alexandre Cigaran/ Arquivo Pessoal)Na Restinga, carros estacionados sobre a ciclovia,
que também seria usada por cadeirantes
(Foto: Alexandre Cigaran/ Arquivo Pessoal)
Sobre os problemas nos bairros, a secretaria diz que o Projeto Rota Acessível terá início no Centro, sendo estendido para a Cidade Baixa e, posteriormente, para outros bairros, de forma gradativa. O projeto está orçado em R$ 400 mil, mais da metade do orçamento anual da pasta, que é de R$ 600 mil.
Além disso, desde agosto do ano passado, a cidade possui um Plano Diretor de Acessibilidade, elaborado com base em diagnóstico realizado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Pontifícia Universidade Católica (PUC-RS) e viabilizado por convênio com o Ministério das Cidades. A partir da vigência do plano, os novos projetos de arquitetura e infraestrutura só são aprovados se seguirem as diretrizes previstas nele.
Em relação aos ônibus, a Prefeitura diz que, em 2009, instituiu como norma que qualquer ônibus que entre na frota tenha algum tipo de equipamento para possibilitar a subida de deficientes físicos.

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