Projeto do Ministério da Educação, em parceria com o Instituto Ayrton Senna, que prevê inclusão de habilidades sócio emocionais na grade curricular. Estudos mostram como elas melhoram o desempenho escolar
Camila Brandalise (camila@istoe.com.br)A sala de aula é a mesma. Alunos em carteiras enfileiradas se esforçam para prestar atenção ao que diz a professora, estrategicamente posicionada em frente à lousa. Mas no lugar de questões envolvendo temas tradicionais, como raiz quadrada ou uso da crase, o debate entre os estudantes, adolescentes na faixa dos 13 anos, suscita outras discussões. “Como você se vê hoje?” e “O que espera da vida adulta?” são algumas das perguntas feitas durante uma aula de formação social do Colégio Pentágono, em São Paulo. Além de autoconhecimento, os jovens desenvolvem conceitos como respeito e responsabilidade. Apesar de esses não serem temas frequentes no cotidiano do ensino brasileiro, as chamadas competências não cognitivas ou socioemocionais estão no centro do debate de como melhorar a educação no País e devem transformar a forma como o ensino é ministrado nas instituições públicas e privadas do Brasil. Tanto que várias escolas as incluíram em seus projetos – seja com aulas específicas ou com propostas pedagógicas gerais. Em levantamento inédito, o Instituto Ayrton Senna (IAS) concluiu, por meio de uma avaliação aplicada a cerca de 25 mil estudantes da rede estadual de ensino do Rio de Janeiro em outubro de 2013, que o ensino dessas qualidades impacta direta e positivamente o aprendizado de língua portuguesa e de matemática. A intenção é que a ferramenta, elaborada em parceria com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), seja usada para medir o desenvolvimento dessas competências nas escolas.
CLASSE
Aula de formação social do colégio Pentágono, em São Paulo:
alunos trabalham respeito e responsabilidade
Os resultados parciais desse trabalho, ao qual ISTOÉ teve acesso com
exclusividade, serão divulgados no Fórum Internacional de Políticas
Públicas, realizado pelo Instituto Ayrton Senna, a OCDE e o MEC nos dias
24 e 25 de março, em São Paulo. A intenção do IAS ao elaborar um
sistema de medição das chamadas habilidades socioemocionais foi fomentar
o desenvolvimento dessa área, para que possam ser criadas políticas
públicas específicas. A esse projeto somam-se ainda esforços do
Ministério da Educação para desenvolver novas propostas sobre o tema.
Uma delas, que também deve ser anunciada durante o encontro, diz
respeito à formação de especialistas brasileiros com foco nessas
habilidades sócio emocionais. “O governo já se posicionou a favor da
criação de um programa em processo de formulação, e não será difícil
implementá-lo rapidamente. Pode ser, por exemplo, um braço do Ciência
sem Fronteiras”, afirma Mozart Neves Ramos, membro do Conselho Nacional
de Educação (CNE), que faz parte do MEC, e diretor de articulação e
inovação do Instituto Ayrton Senna, referindo-se ao programa de bolsa de
estudos no Exterior para alunos da graduação. “Para nos aprofundarmos
no tema, precisamos de profissionais com formação específica na área, o
que exige conhecimentos multidisciplinares em educação, economia e
psicologia.”Aula de formação social do colégio Pentágono, em São Paulo:
alunos trabalham respeito e responsabilidade
Outro projeto diz respeito à comissão especial do CNE voltada para discutir a importância das habilidades sócio emocionais no sucesso escolar. O conselheiro Francisco Cordão afirma que até meados deste ano haverá um parecer, a ser aprovado pelo conselho, com orientações de como trabalhar essas competências na escola. Essas diretrizes, ainda em fase de estudos, serão enviadas às instituições de ensino do País para que sejam formuladas maneiras de trabalhar as habilidades sócio emocionais na educação básica (ensino infantil, fundamental e médio). “Já discutimos, por exemplo, recomendações para a formação de professores, que precisam estar alinhados a uma perspectiva mais ampla, mobilizando não apenas o aprendizado de conteúdos das disciplinas, mas habilidades, atitudes e emoções que são importantes no processo de ensino”, diz Cordão.
MODELO
Vinicius Pereira e Juliana Gomes, ambos de 16 anos, alunos do colégio
Chico Anysio, no Rio, que passou pelo projeto-piloto do IAS
A ideia é que seja estabelecida uma agenda na área das não
cognitivas. A partir desses esforços, tanto do terceiro setor quanto do
governo, o objetivo é inserir essas questões no projeto pedagógico das
escolas com delimitações específicas. Não é necessário criar uma
disciplina para passar esses conceitos. As medidas podem ser trabalhadas
de maneira transversal, em todas as aulas. Em língua portuguesa, por
exemplo, em vez de pedir aos alunos que escrevam sobre as férias, o
professor pode solicitar uma redação em que as crianças falem sobre um
problema que conseguiram enfrentar. “Há várias possibilidades para o
futuro. O primeiro grande desafio era aprender a medir. Agora o tema
precisa ser desenvolvido”, afirma Daniel Santos, professor de economia
da Universidade de São Paulo e especialista em desenvolvimento infantil e
socioemocional na escola. No atual sistema de avaliação tradicional,
diz o especialista, se uma escola não atinge bom desempenho, a conclusão
é de que não há planejamento ou falta preparo dos professores. “Mas
será que não é a parte não cognitiva que está influenciando esse
resultado?”Vinicius Pereira e Juliana Gomes, ambos de 16 anos, alunos do colégio
Chico Anysio, no Rio, que passou pelo projeto-piloto do IAS
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