Avô e mestre de Eduardo Campos condenava políticos progressistas que não viam interesses maiores
O Brasil não aguenta mais
Marcelo Zero (*)
Um conhecido pré-candidato
teria afirmado recentemente que “o Brasil não aguenta mais 4 anos de
Dilma”. O candidato anda meio confuso. Além da confusão gramatical entre
presente e futuro, o candidato parece estar confundindo o apoio que tem
de cerca de 9% da opinião pública com a opinião de todo o país, a qual,
segundo as últimas pesquisas, apoia majoritariamente (55%) a gestão
pessoal da presidenta.
Assim, “o Brasil” da frase, sem
dúvida uma licença poética e política, uma sinédoque recorrente no
discurso oposicionista brasileiro, poderia ser melhor traduzido para
“uma minoria”. A frase, gramatical, política e matematicamente correta,
seria, então, “parte minoritária da opinião pública brasileira não
aguentaria mais 4 anos de governo Dilma”.
Mas as minorias têm as suas razões. Podem não ser lá muito boas, mas elas existem. Com algum esforço, podemos até imaginá-las.
É possível, por exemplo, que “o
Brasil” não aguente mais esse negócio de ficar gerando tantos empregos
com carteira assinada, em meio à pior crise internacional desde 1929.
Com efeito, foram criados mais de 21,5 milhões de empregos desde que o
PT chegou ao poder. Só no governo Dilma, foram gerados cerca 4,5 milhões
de empregos, até janeiro deste ano. É por isso que a nossa taxa de
desemprego está no mais baixo nível de toda a sua história (4,8 %). “O
Brasil” do candidato talvez prefira, no entanto, a situação de países
como Portugal, Grécia, Itália e muitos outros que hoje convivem com
taxas de desocupação estratosféricas. Ou então “o Brasil” talvez sinta
saudades da situação de desemprego e precariedade que predominava na
época em que o país era comandado pelos principais aliados políticos do
candidato.
Também é possível que “o
Brasil” não suporte mais o aumento inaudito da renda do trabalho. Com
Dilma, a renda dos trabalhadores cresceu, em média, 3% acima da
inflação, a cada ano, mesmo no contexto de uma crise internacional que
provoca diminuição significativa dos salários reais em muitos países do
mundo. Portanto, em somente 3 anos, Dilma, a que “ninguém mais aguenta”,
segundo o candidato, aumentou a renda dos trabalhadores em 9,3% acima
da inflação. Hoje, o salário mínimo é de R$ 724,00, ou mais de US$
300,00. No entanto, “o Brasil” do candidato provavelmente considere mais
“suportável” a época em que a renda dos trabalhadores encolhia em mais
de 7% ao ano e o grande sonho era o salário mínimo de US$ 100,00.
Pelos mesmos misteriosos
motivos, “o Brasil” do candidato possivelmente considere que “ninguém
aguenta mais” esse processo esquisito, tão ao contrário da nossa
histórica tradição, de distribuição célere da renda e de combate sólido à
pobreza. Trinta e seis milhões de brasileiros já deixaram a pobreza
extrema, desde que os “insuportáveis” do PT chegaram ao governo. Neste
ano, graças à busca ativa implantada pela presidenta que “ninguém mais
aguenta”, serão incluídas as últimas 700 mil famílias que estavam fora
do cadastro dos programas sociais e, com isso, o Brasil será considerado
um país livre da miséria, conforme os critérios do Banco Mundial. No
mesmo período, mais de 42 milhões de brasileiros ascenderam à classe
média, injetando R$ 1 trilhão ao ano na economia e dinamizando o mercado
de consumo interno. Assim, nosso índice de Gini caiu de cerca de 0,600,
em 2002, para quase 0,500, em 2012.
Trata-se de uma verdadeira
revolução social, algo profundamente novo, num país que estava
acostumado à “mofada” situação de exclusão e de profundas desigualdades.
Porém, há setores políticos que não gostam muito disso. Talvez eles se
identifiquem mais com “o Brasil” do candidato.
Com alta probabilidade, “o
Brasil” do candidato não se identifica com os grandes e recentes
progressos feitos na Educação e Saúde, por iniciativa da presidenta que
‘ninguém mais aguenta”.
A duplicação do número de
matrículas nas universidades, o crescente acesso dos mais pobres ao
ensino superior, a geração de 5,8 milhões vagas para ensino
profissionalizante pelo PRONATEC, o envio de dezenas de milhares de
jovens brasileiros para estudar nas melhores universidades do mundo com o
Ciência Sem Fronteiras, o vasto e inédito programa de implantação de
creches e pré-escolas e a construção de mais unidades de ensino técnico
que em toda a história anterior do país não parecem comover “o Brasil”
do candidato.
Comove menos ainda,
aparentemente, o Programa Mais Médicos, o qual, conforme a opinião de
alguns que se identificam com “o Brasil” do candidato, utiliza os
serviços da OPAS/ONU, notórias agências de intermediação de mão-de-obra
escrava.
Da mesma forma, não sensibiliza
“o Brasil” do candidato o fato da ONU considerar o Brasil, sob a
liderança da presidenta que "ninguém mais aguenta”, o país que mais
contribui para a redução das emissões dos gases do efeito-estufa.
Prefere-se a mofada tese da insensibilidade ambiental da presidenta.
Enfim, “o Brasil” do candidato
parecer preferir o tempo mofadíssimo dos vestibulares, do ensino
elitizado, dos postos de saúde sem médicos e dos desmatamentos sem
controle. Talvez “o Brasil” do candidato também sinta falta dos
jurássicos empréstimos do FMI, da dívida pública líquida de mais de 60%,
da inflação de 12,5%, da vulnerabilidade externa e de outras coisas que
a presidenta “que o Brasil não aguenta mais” contribuiu muito para
extinguir.
Tudo isso nos deixa intrigados.
Não conseguimos identificar, com precisão, quais os interesses que
movem “o Brasil” do candidato. Eles não parecem ser consentâneos com uma
identidade política socialista.
Nessas horas de crise de
identidade e confusão, o melhor é recorrer aos frescos e atuais
conselhos dos antigos. Podemos lembrar, em especial, o grande Miguel
Arraes, o qual, em seu discurso de posse como governador de Pernambuco,
em janeiro de 1963, afirmou para a posteridade:
“No Brasil de hoje, como em
qualquer outro país em atraso, as lutas sectárias têm de ser evitadas;
no processo da revolução brasileira devem participar todos aqueles
realmente interessados na superação da miséria e do atraso”.
Definitivamente, “o Brasil” do
candidato parece ter se esquecido dos bons conselhos que nos davam os
avôs. Será que o Brasil aguenta?
Marcelo Zero é formado em Ciências Sociais e assessor legislativo do PT
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