5.07.2012

Doenças relacionadas ao trabalho

D.O.R.T e síndrome de Burnout. 

Em entrevista, o médico Sérgio Roberto de Lucca, da Universidade Estadual de Campinas, explica o que são essas doenças relacionadas ao trabalho, seu tratamento e como empresas e trabalhadores podem juntos acabar com elas.
Por: Fernanda Braune
Publicado em 01/05/2012 | Atualizado em 01/05/2012
D.O.R.T e síndrome de Burnout. Você já ouviu falar?
O médico Sérgio Roberto de Lucca participa de um grupo de discussão de casos relacionados à medicina do trabalho no Hospital de Clínicas da Unicamp. (foto cedida pelo pesquisador)
Fadiga, depressão, falta ou exagero de apetite, dores musculares, irritação, estresse. Em uma sociedade onde “tempo é dinheiro”, esses sintomas são muito fáceis de ser encontrados. Em entrevista à CH On-line, o médico Sérgio Roberto de Lucca, professor do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), explica o que é o Distúrbio Osteo-muscular Relacionado ao Trabalho (D.O.R.T.) e uma nova síndrome que tem se tornado cada vez mais popular entre os trabalhadores, a de Burnout.
Descubra qual deve ser o posicionamento das empresas em relação a esse novo cenário e como o trabalho em conjunto com o empregado pode ajudar a minimizar e até acabar com a ocorrência dessas doenças.

Ciência Hoje On-line: O que é o D.O.R.T?
Sérgio Roberto de Lucca: O Distúrbio Osteo-muscular Relacionado ao Trabalho inclui uma série de doenças do aparelho osteo-muscular resultantes de uma atividade repetitiva ou uma atividade de esforço, de modo geral, uma atividade antiergonômica. Manifesta-se principalmente pela síndrome do carpo (lesão causada por movimentos repetitivos do punho), a epicondilite [degeneração dos tendões que se originam no cotovelo] e a síndrome de impacto do ombro [inflamação no tendão supraespinhoso, localizado no ombro].
O D.O.R.T. é a segunda causa de afastamento do trabalho: são cerca de 9 mil casos por mês
A maioria dos trabalhadores que vêm da indústria metalúrgica e de onde o trabalho exige um esforço físico e repetitivo tem essas doenças. Segundo estatísticas do INSS [Instituto Nacional do Seguro Social], o D.O.R.T. é a segunda causa de afastamento do trabalho: são aproximadamente 9 mil casos por mês.

A síndrome de Burnout é um tipo de D.O.R.T?
Não. A síndrome de Burnout é um transtorno mental. A relação do D.O.R.T com os transtornos mentais ocorre depois do afastamento da pessoa do trabalho. A gente observa que as pessoas que ficam afastadas têm dificuldade de exercer as suas habilidades domésticas por causa da lesão e daí vem alguns dos distúrbios, como depressão, em uma espécie de síndrome pós-traumática. Segundo o INSS, os transtornos mentais – incluindo a síndrome de Burnout – são a terceira causa de afastamento do trabalho.

Existe um grupo de pessoas mais afetadas?
A síndrome de Burnout é uma doença caracterizada por transtornos mentais relacionados ao trabalho. Ela se manifesta em pessoas cuja profissão exija um envolvimento interpessoal direto e intenso. Os profissionais da área de educação, como os professores, que têm um envolvimento direto com os alunos, e os da saúde (médicos, enfermeiros e auxiliares de enfermagem), que têm uma relação direta com o paciente, além de assistentes sociais, policiais, bombeiros e agentes penitenciários, são os trabalhadores que mais frequentemente manifestam Burnout.
Professora em sala
Entre os profissionais mais afetados pela síndrome de Burnout estão os da área de educação, como os professores, que têm um envolvimento direto com os alunos. (foto: Elias Minasi/ Sxc.hu)

Essas são doenças típicas do final do século 20 e início do século 21. Por quê?
A partir dos anos 1990, o desenvolvimento de novas tecnologias aumentou o ritmo de produção. Além disso, o número de horas extras dos trabalhadores também cresceu, houve uma intensificação do trabalho. As pessoas, além de trabalhar mais de oito horas por dia, ficam nas suas casas e não desligam do trabalho; elas continuam trabalhando por meio do computador. Então você tem uma diminuição das atividades de lazer e um aumento das atividades de trabalho.

Como as empresas devem se comportar em relação às doenças do trabalho?
Em primeiro lugar, elas deveriam oferecer pausas compensatórias a esses trabalhadores, pausas com ginásticas laborais, descanso, ciclos de conversa, por exemplo, além de orientar os gestores em relação ao tipo de tratamento a ser dado a seus subordinados, para que não seja muito ríspido.
Há também a questão da falta de solidariedade entre os colegas de trabalho, que faz com que as pessoas se isolem e não procurem ajuda em casos de transtorno mental com medo de perder o emprego. Então as empresas devem estimular as pessoas a procurarem ajuda e oferecer as condições para que elas sejam realmente ajudadas.

Qual é o tratamento recomendado?
Tanto para D.O.R.T quanto para transtorno mental, o tratamento começa com o afastamento provisório da pessoa.
Tanto para D.O.R.T quanto para transtorno mental, o tratamento começa com o afastamento provisório da pessoa do trabalho
No caso de D.O.R.T, esse afastamento pode acontecer por um período de um a seis meses. Nossa experiência mostra que o tratamento tem durado de quatro a seis meses até a recuperação das lesões. Quando a pessoa retorna ao trabalho, tem que realizar uma atividade compatível com o seu estado, porque, se voltar às condições anteriores ao afastamento, vai ter novamente a lesão.
No caso de transtorno mental, o profissional deve fazer psicoterapia, no sentido de conseguir se equilibrar com sua condição de trabalho. Se ele não conseguir, tem que pensar em mudar a sua atividade profissional.

O que se pode fazer para evitar a doença?
As pessoas podem fazer ioga, fisioterapia, uma atividade de lazer para tentar se desligar do trabalho, ou seja, ela pode tentar se fortalecer do ponto de vista psíquico. Mas quem consegue fazer isso hoje?

Você participa de um grupo que se reúne para discutir casos relacionados à medicina do trabalho no Hospital de Clínicas da Unicamp. Quais os resultados dessas reuniões?
Nessas reuniões, discutimos inclusive se a doença tem relação com o trabalho ou não. Depois, são feitas visitas às empresas para estabelecimento de nexo causal. Nessas visitas, muitas vezes nós aproveitamos para orientar o setor produtivo a evitar algumas atividades antiergonômicas que estão desencadeando as lesões. A partir das discussões dos casos clínicos, nós tentamos sugerir atitudes de prevenção para evitar novas ocorrências entre os trabalhadores.

Fernanda Braune
Ciência Hoje On-line

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