4.03.2011

Apesar de vocês

A busca contínua de sentido para a vida é o caminho para prosseguir adiante, suplantando barreiras e superando obstáculos

Quem tem um porquê suporta qualquer como." (Viktor Frankl)

É comum nos abatermos diante das dificuldades. E superdimensioná-las. Nossos problemas são sempre mais relevantes do que os dos outros. Contratempos revestem-se de tragédias. Sentimo-nos incapazes, impotentes, injustiçados.

A frase que introduz este texto é do psiquiatra e psicólogo austríaco Viktor Frankl, criador da logoterapia, segundo a qual o desejo de encontrar um significado para a vida é a motivação básica do comportamento de um indivíduo. Estabelecer e perseguir um objetivo trilhando o próprio destino é aspecto mais relevante do que satisfazer instintos e aliviar tensões, como sustenta a psicanálise convencional.

Frankl pertencia à corrente judaica socialista marxista, a classe de judeus mais odiados por Hitler. Passando por quatro campos de concentração entre 1942 e 1945, perdeu os pais, a esposa e um irmão, sofrendo com os maus tratos e a fome. Mas sobreviveu, por seus princípios e por seus propósitos.

Teorizando a partir de suas observações e sua própria experiência, Frankl observou que um indivíduo pode encontrar um sentido para sua vida a partir de três vias (com base nos escritos do filósofo Rubem Queiroz Cobra):

1 - Criando um trabalho, realizando um feito notável ou sentindo-se responsável por terminar um trabalho que depende fundamentalmente de seus conhecimentos ou de sua ação. Aqui poderíamos relacionar as contribuições de personalidades como Pasteur, Einstein e Bohr, entre outros.

2 - Experimentando um valor, algo novo, ou estabelecendo um novo relacionamento pessoal. Esse é o caso de uma pessoa que está consciente da  responsabilidade que tem em relação a alguém que a ama e espera por ela. O amor incondicional de uma mãe por um filho exemplifica essa tese.

3 - Pelo sofrimento, suportando as amarguras inevitáveis diante da consciência de que a vida ainda espera muito de sua contribuição em relação às demais pessoas, como aconteceu com o próprio Frankl.

Nestes três casos, a resposta do indivíduo deixa de ser a perda de tempo em conversas e meditação, e se torna a ação correta e a conduta moral objetiva.

Tenho visto empresas que produzem e geram empregos, apesar dos juros elevados, da carga tributária indecente, da indisponibilidade de linhas de crédito.

Tenho visto profissionais que são promovidos, apesar de uma formação acadêmica deficitária, da ausência de um MBA ou da fluência em outro idioma.

Tenho visto pessoas que praticam ações filantrópicas, levando consigo o carinho do olhar, o calor do abraço e o conforto da palavra, apesar de pessoalmente não necessitarem disso.

Tenho visto casais que se reconciliam e amantes que se saciam, apesar das divergências e da eventual discórdia.

Aprecio muito o conceito de resiliência, a capacidade de superar adversidades. E meu amigo Roberto Ambrósio presenteou-me com uma metáfora sobre o boxe, um esporte duro e violento que nos lega de forma muito especial o conceito de assimilação.

Um boxeador toma um direto de direita e assimila, bem ou mal, o choque sofrido. Assimilar é tornar-se semelhante a. Como se o golpe passasse a ser uma parte da própria pessoa, modificando-a externa e internamente. O boxeador sofre, baqueia, devolve a energia potencial em forma de persistência (permanecer em pé), ou em forma de contragolpes defensivos, mas acima de tudo aprende enquanto assimila. Aprende que a guarda deveria estar mais alta, que a esquiva deveria ocorrer um décimo de segundo antes. Aprende com a dor e aprende sozinho.

Também tenho aprendido a oferecer menos resistência aos sacrifícios impostos, a suportar melhor as dificuldades, a ser mais tolerante. E a encontrar um sentido para a vida. Apesar dos que a tudo isso se opõem.


* Tom Coelho

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