Sou apaixonado por cães e gatos. Lógico que é bom o abaixo-assinado. Tenho dúvidas sobre a eficácia de uma mudança legal. Minha impressão, como a de muita gente, é que o Brasil tem leis ótimas que não são aplicadas. O Código Penal prevê pena de seis meses a um ano de reclusão para quem comete crimes ambientais, categoria na qual se inserem as torturas caninas. Multas também são previstas. No caso do falecido Lobo, o Ministério Público multou o culpado em cerca de R$ 1.500 e condenou-o a prestar 120 horas de serviço comunitário no canil municipal. No da cadela Titã, seu dono defendeu-se dizendo que não a enterrara viva. Segundo afirma, Titã costumava fazer buracos no quintal e, ao vê-la caída em um deles, julgou que estava morta. Legalmente, também existem muitas atenuantes que facilitam a defesa de quem maltrata bichos. Se até quem machuca gente consegue sair ileso, que se dirá dos que torturam animais? O sujeito pode até ter alguma dor de cabeça e ficar de mal com os vizinhos. Mas só. Acredito que a solução está na educação e na consciência. E na valorização da sensibilidade.
Até órgãos oficiais são indiferentes à dor dos animais. Na Bahia já houve um Inquérito Civil, instaurado pelo Ministério Público, para apurar denúncias de associações protetoras de animais contra maus-tratos e contra o sacrifício sistemático e indiscriminado de cães, realizado pelo Centro de Controle de Zoonoses da Secretaria de Saúde Municipal. Entre outras coisas, acusa o centro de abater cães e gatos com injeções letais, câmara de gás, câmara de compressão a vácuo, espancamentos, choques elétricos. A realidade de outros centros de controle de zoonoses não parece ser diferente.
Não me choca só a tortura explícita. Há aquela sem pancadaria, mas também sem nenhum sentimento. Muitas pessoas compram um filhotinho. Tratam como um filho. Levam ao veterinário, botam roupinhas, até brincam de fazer “au-au”. De repente, surge uma viagem. Ou uma mudança. Ou não aparece coisa alguma. O dono simplesmente se cansa do bichinho. Solta na rua, bem longe de casa. Joga fora, como se fosse lixo. Sentimento não há, da parte do humano. Só do animal, que late desesperado, porque, todos sabemos, o cão ama devotadamente seu dono. O problema não ocorre só nas grandes cidades. Em Pelotas, Rio Grande do Sul, a Associação SOS Animais luta contra a facilidade com que cidadãos abandonam seus pets na sarjeta.
Existem pessoas dispostas a se doar, como minha amiga Vera, casada com o ator Fúlvio Stefanini, que já entrou numa favela, durante a noite, para resgatar uma cadela que sofria maus-tratos. Ou a atriz Nicole Puzzi, que tem um lar para 500 cães abandonados. Recentemente, salvou do sacrifício 100 filhotes de chihuahuas, deixados por um canil falido. Seus amigos do Twitter e Facebook já sabem. Quem quiser um chihuahua é só pedir, com a promessa de tratar bem. Sem custos. Nicole é contra a venda.
Nesta época do ano, em que tanto se fala de amor e fraternidade, é tão estranho saber que alguém machucou um cãozinho, ou o jogou nas ruas, no intervalo das compras dos presentes de Natal. O tal espírito natalino não vale para cachorros? Simplesmente não entendo o que leva alguém a torturar um bicho. E penso na frase de Guimarães Rosa: “Se todo animal inspira ternura, o que houve então com os homens?”
WALCYR CARRASCO
Época
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