3.23.2021

Pesquisa sobre Lula é profecia que se auto-realiza

 

Pesquisa sobre Lula é profecia que se auto-realiza
Por Paulo Moreira Leite Brasil 247
A pesquisa publicada hoje, pelo DataFolha, é a primeira amostra da luta ideológica que o país irá enfrentar depois que Lula recuperou os direitos políticos, reconquistando o direito de disputar a presidência, já na condição de favorito (50% contra 39% para Bolsonaro, informa o Ipec, 7/3/2021).
Não custa lembrar, para começar, que o respeito ao direitos de Lula não é um caso inteiramente resolvido. No mesmo despacho em que declarou a nulidade das condenações de Lula, o ministro Edson Fachin transferiu a palavra final ao plenário do STF.
"Afeto o julgamento ao Tribunal Pleno," escreveu Fachin, no primeiro parágrafo.
Com essas quatro palavras, o ministro sinalizou um movimento duplo. Devolveu os direitos políticos de Lula, notícia que provocou um pequeno terremoto no país. Ao mesmo tempo, deixou uma porta escancarada para a entrada de pressões interessadas em reverter a decisão. Este é o contexto do DataFolha.
Perguntar, hoje, se o eleitor considera Lula culpado ou inocente de condenações produzidas pelos métodos criminosos revelados pelas gravações da Vaza Jato é um escândalo em si.
Representa um esforço previsível para jogar a opinião publica sobre o Supremo, caso o tribunal, presidido até setembro de 2022 por Luiz Fux, decida pautar o debate sobre sentença de Edson Fachin.
Em vez de fazer uma pergunta objetiva para o eleitor -- em quem pretende votar, por exemplo -- a pesquisa investe num levantamento onde reina a subjetividade -- descobrir a opinião do eleitor sobre a natureza das condenações de Moro.
Basta recordar o caráter inteiramente tendencioso da cobertura midiática da Lava Jato, parte ativa da construção da mitologia que produziu Sérgio Moro e abriu caminho para Jair Bolsonaro, para compreender aonde o levantamento quer chegar quando pergunta sobre a "culpa" de Lula. É de sentir vergonha.
Trata-se de uma típica profecia que se autorealiza -- sem valor algum, portanto.
Após uma década de massacre contínuo por uma midia monopolizada, pergunta-se ao leitor se ele acha que a condenação de Lula foi justa.
Seria ingenuidade esperar uma resposta diferente. O trabalho de investigação-da-investigação da Lava Jato, indispensável para que a população tenha noção do peixe que lhe venderam, não chegou sequer à metade e é provável que já tenha terminado.
Limitou-se à divulgaçao de que a Operação se valia
de métodos de trabalho condenáveis, que justificariam a anulação de várias condenações.
Nenhum veículo, contudo, levou uma investigação até o final, para chegar às consequências práticas e beneficiários diretos de apurações orientadas no compadrio, em benefício de preferências pessoais ou conveniências políticas de Moro, Dallagnoll e Cia.
Eventuais responsáveis jamais foram investigados, muito menos punidos. De uma forma ou de outra, todos foram preservados, seja em gratidão pelos serviços prestados, seja porque podem vir a ser úteis no futuro. Sergio Moro perdeu pontos no Ibope mas segue aparecendo em lista de candidatos a presidente. Nem todos amigos que fez na mídia o abandonaram. Pelo contrário.
Nessas condições, é obrigatório recordar um pensamento desenvolvido em 1846 por Karl Marx e Friederich Engels, numa obra clássica, "A Ideologia Alemã". Ali, eles apontam um ponto básico da sociedades humanas sob o capitalismo: "a ideologia dominante é a ideologia da classe dominante".
Parece difícil negar que o DataFolha encontrou o que buscava e que a grande mídia ajudou a construir -- ideologia.
A resposta é diferente, no entanto, quando se pergunta ao eleitor em quem pretende votar. A comparação entre o DataFolha com os dados do
Ipec mostra uma situação invertida.
A diferença entre os dois levantamentos sublinha que o massacre da mídia teve forças para confundir a visão de muitos brasileiros e brasileiras sobre Lula.
Mas não foi capaz modificar sua visão sobre seus direitos e seus interesses.
Só por isso, não custa lembrar, a força política de Lula preocupa o condomínio reacionário que o impediu de disputar as eleições, em 2018, e pretende voltar à carga contra sua presença em 2022.
Alguma dúvida?
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