Coloque um pedaço de tomate na boca, deguste lentamente. Repita a
operação com um pedaço de queijo parmesão. Depois de sentir o gosto
ácido e doce do tomate e o gosto salgado do parmesão, o que dá
continuidade ao paladar é o umami, quinto gosto fundamental (junto com
salgado, azedo, amargo e doce) descoberto no início do século XX pelo
cientista japonês Kikunae Ikeda, mas só reconhecido pela comunidade
mundial no ano 2000. Umami, aliás, quer dizer saboroso em japonês, uma
propriedade conferida pela combinação do glutamato monossódico
característico desse gosto (que também é composto pelos nucleotídeos
inosinato e o guanilato) com moléculas de outros alimentos. Isso faz com
que o prato fique mais saboroso, sem que haja vontade de comer mais
quantidade.
— O umami pode ser usado para aumentar a
palatabilidade, realçando o sabor sem aumentar a ingestão de sal (o
sódio até hoje é usado para o mesmo fim). Outro aspecto que ainda
necessita de mais pesquisas mas que já vem sendo estudado é a
possibilidade de o umami contribuir para a sensação de saciedade —
explica o neurocientista Ivan Araújo, professor da Universidade de Yale
que falou esta semana, no Rio, sobre como o gosto age no cérebro no “I
Simpósio Latino-americano sobre Umami”.
Estímulos associados potencializam sabor
Com
os cinco gostos fundamentais a recepção no cérebro se dá da mesma
maneira: há um aumento de atividade em determinadas áreas quando sistema
nervoso central recebe sinais transmitidos pelos receptores na cavidade
oral e identifica o que á salgado, doce, azedo, amargo ou umami. Mais
especificamente as áreas do córtex gustatório primário, na ínsula, e o
córtex orbital, acima dos olhos, associado à resposta a quaisquer
estímulos agradáveis, não só de comida.
Esses receptores, no
entanto, se encaixam melhor quando há mais de um estímulo, segundo o
estudo do neurocientista. Um prato bonito, com cheiro ótimo, portanto,
melhora a sensação do gosto no cérebro. Com o umami, que consegue
potencializar o sabor do prato, esta interpretação do cérebro fica mais
intensa.
— Isto também pode ser exemplificado quando uma foto de
um alimento familiar à pessoa, que traz a lembrança de uma boa
experiência, causa reações de salivação como se estivesse na boca — diz o
professor Ivan Araújo, que nos EUA ensina como o cérebro controla a
fome e os mecanismos de recompensa.
O umami foi percebido pela
primeira vez no dashi, um caldo típico da culinária japonesa composto de
alga marinha seca, peixe bonito desidratado e cogumelo shiitake seco.
Carnes (principalmente maturadas), aspargos, frutos do mar, queijos e
cogumelos (champignon, shiitake e shimeji) são fontes de umami.
Identificação começa no útero
Um
estudo publicado este ano na revista “Current Biology” pelo
Departamento de Nutrição da Universidade de Drexel, na Filadélfia,
defende que a habilidade de perceber sabores começa no útero, com o
início do funcionamento e desenvolvimento dos sistemas gustativo e
olfativo. Como o líquido amniótico e o leite materno contêm moléculas
derivadas da dieta da mãe, essa iniciação determina as preferências ao
longo da vida. Logo após o nascimento, os gostos doce e umami têm
respostas positivas do bebê. Amargo e azedo, têm respostas negativas.
“Essas
preferências gustativas podem refletir um impulso biológico para os
alimentos que são calorias — e proteínas — densas e uma aversão aos
alimentos que são venenosos ou tóxicos”, explicam os autores da
pesquisa.
A quantidade de glutamato no leite materno chega a 50%
do total dos aminoácidos livres, que não estão presentes na estrutura
das proteínas, mas estão no plasma sanguíneo ou dentro de diversas
células, usados como materiais para síntese de vitaminas, hormônios e
novas proteínas.
Assim como as crianças, os idosos também são
sensíveis ao umami. Dois estudos japoneses já relacionaram a perda do
gosto umami à falta de apetite e emagrecimento em idosos, resultando em
diversos problemas de saúde. A perda de paladar foi apontada ainda como
causadora da falta de salivação, problema que afeta todo o trato
digestivo, já que a saliva é responsável por ajudar na mastigação e
deglutição, na formação do bolo alimentar e proteção da mucosa da boca
contra infecções. Com a idade avançada e o uso de medicamentos, a
sensibilidade ao gosto, a secreção salivar e a mastigação ficam
alteradas e o restabelecimento dessas habilidades foi conseguido pela
introdução de alimentos umami no cardápio desses pacientes.
Os
pesquisadores investigaram padrões de indução de saliva em adultos
saudáveis depois do estímulo umami, que teve a mesma intensidade do
gosto azedo, usado frequentemente em hospitais para promover salivação.
“De
forma surpreendente o gosto azedo promoveu forte salivação durante um
curto período, até dois minutos após o estímulo. Já o umami induziu a
salivação por mais de dez minutos”, descreve o autor do estudo Hisayuki
Uneyama, que acredita que testes como este podem ajudar a desenvolver
novos tratamentos para distúrbios relacionados à alimentação, como boca
seca, disfagia e anorexia.
No Brasil, o Comitê Umami, filiado ao
Umami Information Center e formado por técnicos de diversas áreas, como
engenharia de alimentos, nutrição, legislação e segurança alimentar,
farmacologia, ciência dos alimentos, toxicologia e comunicação estuda e
divulga o conceito umami, com receitas e informações sobre os principais
alimentos e suas concentrações de glutamato no www.portalumami.com.br.