As reivindicações que foram levadas
às ruas das cidades brasileiras em junho do ano passado não foram
esquecidas. Embora tenham perdido força, os protestos continuaram nos
meses seguintes, como as ocupações de Câmaras de Vereadores e as greves
de professores no Rio de Janeiro e dos rodoviários em São Paulo.
Na Copa do Mundo, entretanto, os atos chamados pelos
movimentos sociais, sobretudo pelos Comitês Populares da Copa, não têm
surtido o mesmo efeito. Poucas centenas de pessoas têm participado dos
protestos, que ocorrem simultaneamente aos jogos.
Para Lucas Oliveira, integrante do Movimento do Passe
Livre (MPL), que coordenou em junho do ano passado as manifestações em
defesa da redução da tarifa do transporte público em São Paulo, a pauta
da redução dos R$ 0,20 na tarifa faz falta.
“Ano passado, a gente tinha uma demanda muito objetiva
colocada. Esse ano não existia uma demanda específica.” Ele também cita o
cansaço como um dos fatores para o esvaziamento dos atos. “A gente
fazia um ato a cada dois dias e dormia em média quatro, cinco horas por
noite.” A mobilização, contudo, não parou. Oliveira defende que atos
menores, mas constantes, além de ações nas comunidades, continuam sendo
feitos. “Estamos acumulando.”
Já o cientista político Leonardo Barreto aponta a
violência como motivo para a mudança no perfil das manifestações. Ele
lembra que muitos dos atos terminaram em cenas de violência e depredação
protagonizadas pelos black blocs, ativistas que defendem a ação direta
como forma de chamar atenção e desafiar o Estado. Em fevereiro deste
ano, o cinegrafista Santiago Andrade morreu depois de ser atingido por
um rojão disparado por um desses ativistas, em meio a um protesto.
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“Os
protestos perderam muito apoio depois que isso aconteceu. As pessoas
ficaram com medo de serem expostas”, diz Barreto, explicando que os atos
deixaram de contar com o “protestante de ocasião”, pessoas que não são
vinculadas a grupos políticos. “Nas marchas de junho, você escutava os
amigos dizendo que levariam os filhos para ver. Hoje, você vê pais
pedindo para os filhos saírem dos atos.”
Já Sandra Quintela, integrante do Instituto Políticas
Alternativas para o Cone Sul (Pacs) e da Articulação Nacional dos
Comitês Populares da Copa (Ancop), aponta a violência policial como um
dos motivos para a mudança. Para ela, há uma militarização muito forte
das forças de segurança. “Esse é o grande legado da Copa: a
militarização recente, seja a nível local, com as guardas municipais,
estadual, com as policiais Militar e Civil, e nacional, com as Forças
Armadas.”
Desde junho passou a ser comum ver balas de borracha e
spray de pimenta sendo usadas nas manifestações, que deixaram muitas
pessoas feridas, inclusive jornalistas. Ainda em 2013, levantamento da
Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) apontou que
75% das agressões aos profissionais em manifestações foram cometidas por
policiais. A Anistia Internacional também fez campanha para denunciar a
violência policial e as detenções arbitrárias, bem como para defender o
direito à manifestação.
A opinião é compartilhada pelo coordenador do Movimento
dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos. “Nós achamos que
esse momento está se destacando, infelizmente, como um momento
repressivo, o que já era esperado. Foram gastos R$ 2 bilhões só em
aparato de segurança para essa Copa, exatamente para impedir que
mobilizações tivessem um efeito maior e pudessem crescer nesse
processo.”
Ele pondera, contudo, que o atual momento não encerra o
ciclo de mobilizações iniciado em junho. “Nós achamos que esse processo,
inclusive com as vitórias obtidas, traz um acúmulo importante que, nos
próximos meses e nos próximos anos, devem também se reverter no
fortalecimento das lutas sociais.”
Para Sandra Quintela, ainda é cedo para afirmar o que
vai acontecer depois da Copa. Além dos impactos do endividamento das
cidades-sede, o que vai ser criado pelos novos movimentos e também a
posição dos já consolidados podem produzir mudanças, ou não, na vida
política do país nos próximos anos.
Copa do Mundo 2014: veja as fotos dos protestos pelo Brasil
Rio de Janeiro - O protesto
contra a Copa aconteceu nesta quinta-feira (12) e ganhou ares de
Carnaval no Rio. Manifestantes, sindicalistas e black blocs se
misturaram a ativistas fantasiados na avenida Rio Branco
Foto: Bruno dos Santos / Terra
Agência Brasil