Maquiagem para crianças é alvo de nova consulta
pública da Anvisa (Foto: Reprodução/TV Tem)
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) abriu nesta sexta-feira (7) uma
consulta pública com novas regras para cosméticos e produtos de higiene destinados às crianças. Entre os 33 itens previstos, cujas
indicações e proibições podem ser avaliadas pela população em geral nos próximos 60 dias, estão desodorantes, esmaltes e maquiagens.
Na opinião da dermatologista Márcia Purceli, do Hospital Israelita
Albert Einstein, em São Paulo, crianças não são adultos em miniatura e,
por isso, devem usar produtos específicos, que causem menos reação
alérgica e levem em conta o peso e a área corporal delas.
"Essa consulta serve para as pessoas entenderem o que está proposto,
antes de isso chegar ao mercado. Existe uma demanda das empresas, que
querem mais uma fatia de consumidores; das crianças, que se espelham na
mãe, nas irmãs e amigas; e dos pais, que incentivam esse comportamento
precoce", avalia a médica.
O foco da indústria de cosméticos, que até então eram os adolescentes,
com várias linhas "teen" nas prateleiras de farmácias e supermercados,
agora parece estar se voltando para os pequenos.
Prova disso é que, segundo a proposta da Anvisa, uma sombra para os
olhos poderá ser usada por crianças a partir de 3 anos, desde que
aplicadas por um responsável, e desodorantes para axilas e pés serão
destinados ao público a partir dos 8 anos – desde que não sejam em
aerossol, para não atingir os olhos, não tenham ação antitranspirante e
apresentem sabor amargo, para evitar que os menores ingiram os produtos.
"O desodorante só tira o odor, não bloqueia o suor. Mas em geral, até
os 12 anos, a criança não tem cheiro embaixo do braço ou chulé. Se tem, é
preciso pensar em puberdade precoce, que é uma doença. Os fungos gostam
de outro tipo de suor, que é produzido por glândulas ativadas na
adolescência", explica a dermatologista.
Em caso de uma puberdade antes do tempo, também pode aparecer acne e
descer a menstruação das meninas. Para ter certeza do diagnóstico, é
feito um exame no punho, que estabelece a idade óssea do paciente.
Outras regras
A Anvisa também prevê que os produtos próprios para crianças não
contenham apelo que incentive a compra, como desenhos, imagens de
artistas, nomes e cores. Além disso, a remoção deles precisa ser fácil,
com uma simples lavagem com água, sabonete ou xampu.
De acordo com a pediatra Ana Escobar, do Instituto da Criança do
Hospital das Clínicas (HC) em São Paulo, os produtos precisam sair
rápido, sem a necessidade de usar outro cosmético para retirar o
primeiro. "E não se deve friccionar a pele da criança, pois isso pode
tirar as defesas do corpo", destaca.
Já o gosto amargo dos produtos não adianta muito, na opinião da médica,
pois até senti-lo os pequenos já engoliram o conteúdo. O que pode
acontecer, segundo Márcia Purceli, é essa ação de levar o cosmético à
boca não se repetir depois disso.
Esmalte, protetor solar e itens sem álcool
A dermatologista diz que, cada vez mais cedo, as meninas têm passado
esmalte, mas usam os de adulto porque têm maior duração – não saem na
água – e são mais baratos.
"As crianças reclamam que o esmalte infantil é removido no banho e as
mães também não querem ficar passando todo dia, desejam algo que dure
uma semana. Mas o produto para adultos é uma exposição muito precoce a
substâncias tóxicas, que podem causar coceira e alergias no futuro, pois
essa é uma fase em que o sistema imunológico, das defesas, ainda está
se formando", explica.
No caso de protetores solares, Márcia esclarece que a linha infantil
cria uma barreira maior contra o sol e sai menos na água. Já os
repelentes de insetos contêm menos elementos químicos.
"Além disso, nada que seja ingerido por crianças deve ter álcool, para
não incentivar o alcoolismo nem prejudicar o fígado", cita Márcia. Foi
por essa razão que a fórmula do fortificante Biotônico Fontoura foi
proibida pela Anvisa em 2001, já que continha 9,5% de álcool etílico.
Reparador de pontas é 'forçação'
Na opinião da dermatologista, a ideia da Anvisa de regulamentar um
reparador de pontas específico para os cabelos das crianças já é "forçar
a barra", pois os fios são iguais na infância e na vida adulta.
"O cabelo é uma proteína morta, só a raiz é viva. Por isso que, quando a
gente corta, não sente dor. Então pessoas de qualquer idade podem usar
um óleo de silicone, de argan", comenta Márcia.
Segundo a médica, muitas mulheres estão expondo as filhas ainda muito
jovens a esmaltes, maquiagens e alisantes de cabelo, porque o medo do
bullying é na verdade da mãe, que se preocupa e se incomoda demais com o
que os outros vão pensar.
A pediatra Ana Escobar complementa: "Acho que não tem nada a ver
incentivar uma criança a usar sombra aos 3 anos. Ela tem que brincar com
coisas que estimulem a imaginação e a criatividade, não a vaidade".