Foto mostra paciente com tela costurada na língua
(Foto: Paul Chugay/Divulgação)
Uma técnica para perder peso que consiste na costura de uma tela
plástica na língua do paciente tem sido praticada por médicos nos
Estados Unidos e em vários países da América Latina. Com o material
rígido preso à língua, torna-se doloroso movimentá-la, o que faz com que
a pessoa só consiga ingerir líquidos.
A técnica ganhou notoriedade nos últimos dias, quando uma das
finalistas do Miss Venezuela 2013, Wi May Nava, afirmou, em um programa
da “BBC”,
que recorreu ao tratamento para chegar ao corpo ideal para o concurso.
Especialistas brasileiros ouvidos pelo
G1 criticam a
prática e afirmam que não existem evidências científicas que comprovem
sua segurança e eficácia. Na base PubMed, plataforma que reúne artigos
com respaldo científico na área de saúde, ainda não há referências à
técnica.
Ainda assim, cirurgiões de países como México, Colômbia, Venezuela,
Nicarágua, República Dominicana e Chile, além dos Estados Unidos,
anunciam o novo método como uma estratégia rápida e prática para perder
peso. Cirurgiões americanos afirmam que um artigo científico sobre o
tema será publicado no próximo mês.
Não há registros de que a técnica seja realizada no Brasil. Para que
uma técnica como essa pudesse ser utilizada no país, seria preciso que
uma instituição desenvolvesse um projeto de pesquisa clínica que fosse
aprovado pelos comitês de ética responsáveis, como lembra o dentista
Celso Augusto Lemos Júnior, professor da Faculdade de Odontologia da USP
e membro da Sociedade Brasileira de Estomatologia e Patologia Oral
(Sobep).
“A função da língua durante a mastigação é ajudar a mover o bolo
alimentar em direção aos dentes, especialmente para a deglutição”,
explica Lemos Júnior. Sem esse movimento da língua, portanto, torna-se
impossível mastigar um alimento sólido.
Para o cirurgião João de Moraes Prado Neto, presidente da Sociedade
Brasileira de Cirurgia Plástica, trata-se de uma alternativa muito
radical para atingir a perda de peso: “Como pode alterar a anatomia da
pessoa para evitar que ela se alimente com sólidos? Existem tantas
outras alternativas racionais que não passa pela minha cabeça como se
chegou a esse extremo.”
Resultados
Nos Estados Unidos, um dos estabelecimentos que fazem o procedimento é a
Clínica Chugay, com unidades em Beverly Hills e em Long Beach, na
Califórnia. Os cirurgiões Nikolas e Paul Chugay já usaram a técnica em
mais de 80 pacientes. Segundo Paul Chugay, os resultados obtidos serão
publicados no mês que vem no periódico científico “The American Journal
of Cosmetic Surgery”.
De acordo com o artigo, adiantado ao
G1, 81 pacientes
se submeteram ao procedimento na clínica entre 2009 e 2013. A técnica
consiste em uma cirurgia rápida, em que uma malha de plástico comumente
utilizada na medicina é presa à língua por meio de seis pontos isolados.
O paciente recebe anestesia local e, caso não tenha sangramento, é
liberado logo em seguida.
A tela permanece na língua durante 30 dias, nos quais o paciente deve
seguir uma dieta líquida de baixa caloria. Ele também é encorajado a
fazer exercícios e a manter uma higiene bucal específica, para remover
restos de alimento que possam se acumular sob a tela.
Os pacientes do estudo tinham, em média, 39 anos e seu peso médio era
de 85,5 kg antes do procedimento. A média de perda de peso foi de 7 kg
depois de um mês. Segundo o artigo, não foi observada nenhuma
complicação séria durante o período. Dois pacientes pediram para ter a
tela removida por apresentarem dificuldades na fala. Um reportou ter
sentido dor e desconforto por mais de dois dias. Alguns mencionaram a
situação social embaraçosa que é não poder comer com os amigos e a
família durante o tratamento.
O artigo cita, ainda, que alguns pacientes voltaram a seus antigos
hábitos depois da remoção da tela e voltaram a ganhar peso. A conclusão
do artigo é que os pacientes que se submetem à técnica “podem alcançar
uma perda de peso significativa em um período de 30 dias, com riscos
relativamente baixos”.
Saciedade e digestão
O médico Durval Ribas Filho, presidente da Associação Brasileira de
Nutrologia (Abran), observa que – com ou sem a tela plástica fixada à
língua – a adoção de uma dieta exclusivamente líquida pode dificultar a
obtenção da sensação de saciedade. “Temos um sistema que controla nossa
fome e saciedade e esse processo se inicia com a mastigação. A partir do
momento que não se mastiga, não se libera estímulos para os núcleos
hipotalâmicos da saciedade”, diz.
Outra complicação refere-se ao sistema digestivo. “Como a quantidade de
fibras é muito pequena em uma dieta líquida, existe uma tendência de
constipação, o intestino pode não funcionar”, diz. Ele acrescenta que,
como outras dietas da moda, uma alimentação exclusivamente líquida tende
a se tornar enjoativa depois de alguns dias.
Eduardo Ribeiro Augusto disse