7.09.2010

Síndrome de Williams; Medo Social; Racismo; Preconceito




O preconceito pode parecer inevitável. Mesmo indivíduos que se autodefinam como não racistas mostram evidências de racismo inconsciente, implicando que o racismo teria base social ou biológica. Mas foi mostrado em um artigo publicado recentemente que um grupo de pessoas parece não formar estereótipos raciais (Santos, A. e colegas, Current Biology, 2010).
A síndrome é rara, causada por uma mutação genética, removendo 25 a 30 genes do cromossomo 7. Como diversas outras doenças raras, a síndrome talvez não chamasse tanta atenção, não fossem as consequências comportamentais que os portadores dessa mutação apresentam. Crianças com a síndrome de Williams são demasiadamente amigáveis, hiper-sociais e apresentam um interesse demasiado em pessoas desconhecidas. “Todas as pessoas do mundo são meus amigos” – frase que se costuma usar para caracterizar crianças com essa síndrome.
Isso porque não apresentam bloqueios sociais ao entrar em contato com estranhos. A razão disso já foi discutida numa coluna anterior e está relacionada à Teoria da Mente (capacidade que temos de imaginar o que o outro estaria pensando). Esse defeito acontece durante o desenvolvimento, e as razões neuronais ainda são obscuras.
O estudo em questão mostra que essas crianças não desenvolvem atitudes negativas contra outros grupos étnicos, mesmo apresentando atitudes estereotipadas comuns a crianças normais da mesma idade. Essa parece ser a primeira evidência sugerindo que diferentes tipos de estereótipos e preconceitos podem ser biologicamente distintos.
Indivíduos adultos com a síndrome de Williams apresentam atividade neuronal anormal numa estrutura cerebral conhecida como amígdala. Essa região está envolvida com a resposta a ameaças sociais, acionando inconscientemente respostas emotivas negativas contra outras etnias. Tendências racistas estão associadas ao medo: adultos são mais propensos a associar objetos negativos ou eventos repulsivos (por exemplo, choques elétricos) a pessoas de outras etnias. Mas de acordo com esse último estudo, seria o medo social que levaria ao preconceito. Uma perspectiva com sérias implicações, sem dúvida. Poderíamos sugerir, por exemplo, intervenções para reduzir o medo social como alternativa contra o preconceito. Mas será que existem evidências suficientes na pesquisa para garantir essa conclusão?
O trabalho consistiu em mostrar imagens de pessoas a 20 crianças de 5 a 16 anos portadoras da síndrome de Williams e outras 20 crianças normais (grupo controle), com mesma faixa etária. Todas de origem europeia e de pele branca. O primeiro teste consistia em pedir para os dois grupos de crianças escolherem as imagens relacionadas com atividades geralmente associadas a homens ou mulheres, como por exemplo, brincar com bola ou bonecas. Os dois grupos mostraram o mesmo tipo de tendência estereotipada, associando figuras de meninos com a bola e figuras de meninas com bonecas.
As crianças também ouviram historinhas sobre os personagens das figuras, descrevendo atributos negativos, como sendo teimosos ou sujos, ou atributos positivos, como bonitos e inteligentes. Pediu-se para as crianças associarem os tipos de histórias com imagens de pessoas de pele clara ou escura. Um exemplo de história consistiu em: “Havia dois meninos, um deles era muito amoroso. Quando viu que o gatinho caiu no lago, o menino salvou o animal, evitando que ele se afogasse. Qual é o menino gentil e amoroso?”
Crianças-controle, sem síndrome de Williams, consistentemente associam características positivas a indivíduos de pele clara e características negativas aos de pele escura. Infelizmente, esses dados confirmam resultados anteriores feitos tanto em crianças claras como em negras. No entanto, as crianças portadoras da síndrome de Williams não mostraram nenhum tipo de bias (preconceito). A conclusão óbvia é que o medo social não é necessário para estereótipos sexuais mas é importante para o estabelecimento de preconceitos étnicos.
O dado é extremamente interessante, mas existem alguns detalhes que podem influenciar as conclusões dos pesquisadores. Os pacientes com síndrome de Williams têm outros tipos de problemas, como retardo mental e reduzida capacidade de aprendizado, que podem interferir com as escolhas feitas pelas crianças. Apesar do grupo ter escolhido participantes com QI e nível socioeconômicos parecidos, as crianças com Williams possuem experiências de vida bem diferentes de crianças normais. Até certo ponto, todas as crianças são expostas a modelos baseados em sexo pelo convívio com os pais, mas nem todas têm a chance de refletir sobre a questão do racismo. A exposição reduzida das crianças com Williams a estereótipos racistas pode ser uma outra forma de interpretar os resultados do grupo.
Além disso, o estudo não responde se o preconceito tem bases genéticas predeterminadas ou é baseado em experiência prévia. Alterações genéticas podem fazer alguém nascer sem as mãos e por isso ser incapaz de tocar piano. Não podemos inferir que exista uma base genética para tocar piano nesse caso. Com esse trabalho, a mesma coisa. Para examinar o papel da experiência prévia o grupo poderia, por exemplo, encontrar crianças que foram criadas por pais do mesmo sexo. De qualquer forma, o trabalho precisa ser replicado em grupos maiores e com outras faixas etárias.
O que parece ser um fato é que preconceitos e estereótipos diferentes podem ser biologicamente discriminados. Se isso é por causa de genes, ambiente ou uma complicada interação entre ambos, é uma questão cuja resposta ainda está por vir.
G1.com
Saiba ainda:
A Síndrome de Williams, ou Síndrome Williams-Beuren, é uma desordem genética que ocorre em aproximadamente uma criança a cada dez a vinte e cinco mil nascimentos; apresentando impactos nas áreas comportamental, cognitiva e motora. Dentre suas características, está a facilidade de comunicação, apresentando um repertório bem articulado e fluente; a dificuldade em compreender ironias ou intenções não verbais; comportamento ansioso e/ou hiperativo; dificuldades relativas à orientação espacial e cálculos matemáticos; e hipersensibilidade a sons – principalmente ruídos. Lidar com um portador desta síndrome, em sala de aula, requer conhecimento do professor em relação a ela; a fim de que este seja assistido de acordo com sua capacidade e necessidades, e também sem prejudicar os outros colegas. Assim, este artigo tem como propósito fornecer algumas dicas ao docente em relação a tais aspectos. Estas serão mais efetivas se houver comunicação e trabalho em conjunto entre família e escola. Atividades em duplas, sempre que possível, devem ser utilizadas, já que os portadores de SW são bastante sociáveis, mas nem sempre são aceitos com facilidade pelos colegas. Esta é uma forma, inclusive, de reforçar que estes alunos, apesar de possuírem algumas dificuldades específicas, em diversos outros aspectos têm capacidade de desenvolver atividades tais como outros colegas de sua faixa etária. Quanto a estas dificuldades, a substituição de alguns objetos por outros e adoção de estratégias diferenciadas podem fazer muita diferença no resultado final do processo de aprendizagem do aluno. No caso da dificuldade motora, reduzir o uso de “lápis e caneta” adotando, por exemplo, o computador como ferramenta de trabalho e, quando não for possível, lápis e canetas mais grossos podem ser de grande valia. A utilização da sensibilidade (e memória) auditiva a favor do aprendizado destes alunos também é uma medida interessante. Os de séries iniciais, por exemplo, podem ser estimulados a fazer leituras em voz alta; e os de séries mais adiantadas, apresentar trabalhos criando paródias, ou mesmo música. Utilizar em aula músicas cujas letras tenham relação com o conteúdo estudado também é uma boa estratégia. Além disso, materiais gráficos, como fotografias, vídeos e ilustrações, também são excelentes formas de abordagem, já que os portadores da SW se sentem motivados a trabalhar com este tipo de material, que pode também ser ferramenta eficaz no ensino da Matemática. No que se diz respeito ao falar ou perguntar repetidamente sobre o mesmo assunto, pode ser interessante que ignore a repetição a partir da segunda vez em que esta for feita, ou que se mude o assunto. Outra forma de lidar com este comportamento é pedir para que o próprio aluno repita a resposta dada a ele anteriormente, para que perceba que não existe necessidade da pergunta ser feita novamente.

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