3.13.2013

A importância da relação parental no desenvolvimento do autoconceito e da auto-estima


A personalidade de cada indivíduo se desenvolve sofrendo influências
genéticas e ambientais, o que torna cada pessoa diferente. Entendendo que cada ser participa ativamente de seu mundo social e que obtém seus conceitos mediante as suas relações socioculturais e as influências que sofrem destas relações, entendemos que o ambiente familiar, o escolar e os outros cenários sociais participam na configuração de nossa individualidade, sejam nos traços psicológicos como nos aspectos afetivos emocionais.
O desenvolvimento da personalidade, segundo Freud, está ligado ao curso
das pulsões sexuais e a forma como cada um resolve os conflitos que devem ser
enfrentados nas fases oral, anal e fálica entre as pulsões libidinais as expectativas e normas sociais implicará o aparecimento e a fixação de determinados traços de personalidade que acompanharão o sujeito até sua etapa adulta (Coll et al., 2004).
A descoberta no plano psíquico do prazer obtido mediante a exploração e
manipulação dos próprios genitais que se dá na fase fálica, provoca sentimentos de angústia e medo da castração no caso dos meninos e o complexo da castração no caso das meninas, denominados respectivamente como complexo de Édipo e de Electra. Os conflitos deste período surgem, essencialmente, devido ao desejo que as crianças experimentam pelo progenitor do outro gênero que fazem com que estes procurem conseguir uma relação privilegiada com um em detrimento do outro, provocando desta forma tensões e hostilidades na relação com o outro progenitor.
O medo do castigo e o principio da realidade faz desaparecer esses conflitos e os desejos edipianos são substituídos pela identificação com o progenitor do mesmo gênero, adotando as características e os valores predominantes destes. Com a interiorização das normas e dos valores socais predominantes no ambiente formas e o superego. A personalidade de cada individuo é determinado pelas relações que forem estabelecidas entre o id, o ego e o superego.
Erickson por sua vez dava maior ênfase aos fatores culturais e sociais que às
pulsões libidinais defendidas por Freud. Para este nas experiências sociais vividas desde o nascimento até a morte reside um conflito psicossocial básico que deve serresolvido entre dois pólos opostos, que são: no primeiro ano, confiança básica e a desconfiança básica nos demais; no segundo e no terceiro, entre a autonomia e a vergonha ou a dúvida; entre os três e seis anos, a iniciativa versus a culpa; dos  aos 12 anos surge a laboriosidade e inferioridade; dos 12 aos 20 anos, a tensão se dá entre a identidade e a confusão da identidade; dos 20 aos 40 anos, a tensão se dá entre a intimidade e isolamento; na etapa dos 40 aos 65 anos, entre produtividade e inatividade e na última parte do ciclo vital, entre integridade e desespero.
A autonomia obtida na etapa entre o segundo e o terceiro ano leva a criança
a experimentar novas capacidades e destrezas e na exploração do mundo que as rodeia constatam os limites que o ambiente social põe as suas condutas. Os pais que favorecem essas iniciativas podem desenvolver nas crianças um verdadeiro sentimento de autonomia, mesmo estabelecendo certos limites. As restrições e as exigências de autocontrole excessivas desenvolvem o outro pólo que é o da culpa, podendo minguar o sentimento de autonomia e, portanto de iniciativa da criança o que poderá dificultar a aquisição dos pólos positivos das etapas seguintes.
O estágio do personalismo descrito por Wallon (1934) surge entre os três e
os seis anos de idade quando a criança está voltada para a construção do eu. A
crise de oposição ou teimosia dá início a este estágio quando esta ao tentar afirmar seu eu, opondo-se aos demais, procura fazer prevalecer sempre a sua vontade.
Esta oposição e negativismo que surgem destas atitudes fazem com que os
adultos não demonstrem o carinho e a aceitação e, caso esta criança conte com um eu mais fortalecido, procura encontrar estratégias que lhe permitam assegurar esse afeto e a aprovação dos demais. Então, em torno dos quatro anos, surge o período da graça, quando as crianças tentam atrair a atenção dos demais e ganhar seu aplauso e reconhecimento, mostrando suas habilidades e destrezas que sentem ser admiradas pelos outros.
Quando as “graças” já não chamam a atenção a estratégia usada é a da
imitação dos demais. Imitando o pai ou a mãe, em seus traços mais externos ou em seus aspectos mais psicológicos e internos as crianças garantem a aprovação dessas pessoas e do seu afeto. O processo final é o de identificação com os adultos mais próximos.
Victoria Hidalgo e Jesús Palácios (2004, p.184) concluem que em todas
estas teorias apresentadas há uma coincidência unânime em assinalar os pais e o contexto familiar como modeladores do desenvolvimento da personalidade infantil:
A forma como os pais manejam a satisfação ou a restrição dos desejos de
seus filhos (Freud), a forma como respondem a suas condutas
exploratórias e as suas iniciativas (Erickson), a forma como agem diante de
sua teimosia ou suas graças (Wallon), a forma como moldam com reforços
diferenciais a s condutas sociais de seus filhos (aprendizagem social) são
consideradas essenciais no desenvolvimento de um caráter mais acanhado
ou mais onipotente, mais seguro de si mesmo ou mais cauteloso, com mais
confiança ou mais inseguro.
Desta forma percebe-se a importância dos pais e/ou cuidadores na formação
e no desenvolvimento do autoconceito e auto-estima das crianças. Uma pessoa que não possui um autoconceito adequado pode não estar aberta as suas próprias experiências afetivas, assim como uma pessoa com baixa auto-estima demonstra dificuldade em sua auto-aceitação e procura representar papéis que considera oportuno em cada momento desejando sentir-se aceita pelos demais. A autodeterminação e a independência afetiva são afetadas negativamente pela falta de um autoconceito bem desenvolvido. O autoconceito não é algo inato, é
construído ao longo do tempo, se desenvolve e evolui com características distintas em cada fase da vida do ser humano e sofre influências das pessoas significativas do ambiente familiar, escolar e social, e das próprias experiências de sucesso e de fracasso.
Apresentaremos duas teorias principais sobre a formação e o
desenvolvimento do autoconceito. O Simbolismo Interativo ou a teoria do espelho e a Aprendizagem Social.
Segundo a teoria elaborada por Cooley (1902) e Mead (1934), o simbolismo
Interativo, o individuo se vê refletido na imagem que os outros lhe oferecem de si mesmo, como se eles fossem um espelho, e assim, o individuo acaba sendo como os outros pensam que ele é. Por esta teoria, os pais e os familiares são os que transmitem quase que exclusivamente, as informações que as crianças têm de si mesmo nos primeiros anos de vida e, na medida em que crescem apropriam-se das informações das outras pessoas, como professores e amigos.
Por esta teoria a criança se limitaria a receber influencias e avaliações
passivamente e não leva em consideração a criança como ser ativo e
experimentador que usa suas próprias ações e experiências como critério na
formação de seu auto-conceito.
Na teoria da Aprendizagem Social, de Wallon e Vygotsky, a criança adquire o
autoconceito por meio de imitação. A criança identifica-se com alguém, imita-a e absorve as características que lhes pertencem, formando um conceito parecido com o das pessoas que a cercam.
Em ambas as teorias, os pais desempenham um papel extremamente
importante na formação do autoconceito de seus filhos. A auto-estima que as
crianças desenvolvem depende das atitudes de seus pais para com elas. Filhos de pais carinhosos e afetivos costumam ter um grau maior de auto-estima do que os filhos de pais afetivamente frios e desinteressados
A evolução do autoconceito no enfoque ontogênico ou evolutivo se forma nas
diferentes etapas do desenvolvimento, com características específicas para cada
uma delas. L’Ecuyer (1985) propõe seis etapas ou pontos de referencia. São estas: de 0 a 2 anos, de 2 a 5 anos, de 5 a 10-12 anos, a adolescência (de 12 a 15-18 anos), a vida adulta (de 20 a 60 anos) e as pessoas de idade avançada (acima de 60 anos).
As características de cada etapa foram assim definidas:
• De 0 a 2 anos – O eu começa a desenvolver desde o nascimento, porém a
criança inicialmente não tem consciência de uma existência separada e
diferenciada de sua mãe. Por meio do processo de diferenciação entre aquilo que é “si mesmo” e o que é “o outro” emerge o autoconceito. Por meio das sensações corporais que experimenta e os contatos com a mãe a criança aprende a distinguir seu corpo daquilo que não é seu corpo. Nesta etapa, são importantes no surgimento do autoconceito, as relações sociais e afetivas que se estabelecem com as pessoas do ambiente, como as trocas vocais e as mímicas que ocorrem entre adultos e a criança.
• De 2 a 5 anos – É caracterizada pela elaboração das bases do autoconceito
que se formam a partir das aquisições da linguagem, quando inicia o termo “eu” e “meu”, indicando que reconhece o si mesmo e o outro, do surgimento da fase de negação, quando procura um sentimento de autonomia na manifestação de sua individualidade e da diferenciação das pessoas significativas ou importantes e do sentimento de valor pessoal que a criança vai formando a partir das reações destas pessoas.
“A forma como as crianças concebem e expressam seu autoconceito varia
notavelmente de uma idade a outra em função tanto do nível de desenvolvimento cognitivo alcançado em cada momento como das experiências sociais” (Hidalgo e Palacios, p.187).
• De 5 a 10/12 anos – É denominado período de expansão de si mesmo. A
criança amplia seus contatos sociais com o ingresso na escola e as experiências
que surgem com estes contatos. As imagens que adquire sobre si mesmo
repercutem sobre seu sentimento de identidade.
• Adolescência, dos 10/12 anos aos 15/18 anos – Se caracteriza pela
conquista da autonomia pessoal. São muitas as transformações físicas que surgem nesta fase e a integração da nova imagem corporal contribui para a valorização de si mesmo e para a afirmação do sentimento de identidade. O adolescente procura se diferenciar de seus pais e na procura de identidade pessoal, identifica-se com
um grupo e por um tempo determinado veste-se e age como o grupo de iguais, até que busca também a diferenciação deste grupo e à elaboração de um autoconceito mais coerente e seguro, porém não imutável.
A maturidade adulta: dos 20 aos 60 anos – O autoconceito evolui e é
submetido a reformulações periódicas em função dos acontecimentos que surgem durante este período da vida, desde o início da vida profissional, as experiências de sucesso ou de fracasso no trabalho, de casamentos, maternidade ou paternidade, das realizações socioeconômicas e culturais, entre outras.
• A idade avançada: 60 anos e mais – A evolução do autoconceito nesta fase
tende a ser, em geral, negativa. A percepção que a pessoa tem da diminuição de suas capacidades físicas, a doença, a aposentadoria, a perda da identidade social e profissional influi em seu autoconceito e seu valor pessoal.
O autoconceito, portanto, está ligado à imagem que temos de nós mesmos e
se refere ao conjunto de características ou de atributos que utilizamos para nos
definir como indivíduo e para nos diferenciar dos demais (Hidalgo e Palácios, 2004).
A dimensão valorativa e julgadora do eu, dentro do conhecimento de si
mesmo ou autoconceito, denomina-se auto-estima. A auto-estima é um produto
psicológico, determinado por nossa subjetividade e, que, assim como o
autoconceito, muda de acordo com a idade, os interesses, os aspectos
socioeconômicos e culturais envolvidos. Na etapa entre os quatro e sete anos, o
instrumento elaborado por Harter e Pike para avaliar a auto-estima, cita quatro
domínios distintos e relevantes nessas idades: competência física, competência
cognitivo-acadêmica, aceitação por parte dos iguais e aceitação por parte dos pais.
As crianças parecem ser capazes de descrever como são competentes e
hábeis em cada fase destas dimensões citadas e podem variar sua auto-estima de forma diferenciada em cada uma delas. Por exemplo, a criança que apresenta alta auto-estima na competência cognitivo-acadêmica pode apresentar baixa autoestima na competência física ou na aceitação por parte dos iguais. As crianças além de poderem se auto-avaliar em uma série de facetas diferentes, vão desenvolvendo uma avaliação geral de si mesmas, não-ligada a nenhuma área de competência específica. Somente a partir do momento em que as crianças conseguem se auto-avaliar de forma mais desligada e independente de sua atuação em situações concretas.
O desenvolvimento da personalidade e das emoções entre os dois e os seis
anos estão relacionados com os processos educativos e socializadores que
ocorrem no interior da família; compreendendo que, as influencias na família não devem ser analisados como um processo unidirecional do adulto para com a
criança, mas como um conjunto de influências bi e multidirecionais.
A análise deve partir de uma concepção sistêmica e ecológica na qual se
entende a família como um sistema que, além disso, não está isolado do
ambiente que o rodeia, mas que mantém relações com outros contextos
importantes para o desenvolvimento de seus membros ( o trabalho dos
pais, as experiências escolares dos filhos) ao mesmo tempo em que uns e
outros se encontram enquadrados dentro de contextos de influencia
superiores (como o contexto cultural) submetidos a mudanças sociais e
históricas (Palacios e Rodrigo, 1998, p.137).
Quanto aos estilos educativos familiares, Maccoby e Martin (1983) ressaltam duas dimensões básicas do comportamento de pais e mães:
• Afeto e comunicação:
Pais que mantém relações acolhedoras e estreitas com seus filhos,
mostrando uma grande sensibilidade diante das necessidades das crianças e
também as incentivam a expressar e a verbalizar essas necessidades e pais que
não demonstram expressões de afeto, apresentam frieza, hostilidade podendo
chegar até a rejeição e a falta de trocas comunicativas.
• Controle e exigências:
Pais que são mais ou menos exigentes na hora de propor situações que
suponham um desafio para as crianças e requeiram certa dose de esforço e pais
que controlam em maior ou menor medida a conduta da criança, se estabelecem ou não normas, se exigem seu cumprimento de forma firme e coerente.
Com a combinação destas duas dimensões apresenta-se a tipologia dos
estilos educativos familiar, descrita por Baumirind (1971):
• Estilo democrático: caracteriza-se por níveis elevados tanto de afeto e
comunicação como de controle e exigência. Possuem este estilo pais e mães que
mantêm uma relação acolhedora, afetuosa e comunicativa com seus filhos, mas
que, ao mesmo tempo, são firmes e exigentes com eles. Com diálogo e
sensibilidade em relação às possibilidades de cada criança, esses pais costumam
estabelecer normas que são mantidas de forma coerente, embora não-rígida; na
hora de exercer o controle, preferem as técnicas indutivas, baseadas no bom senso e na explicação. Esses pais também incentivam os filhos para que se superem continuamente, estimulando-os a enfrentar situações que exigem deles um certo nível de esforço, mas que estão dentro de suas capacidades.
• Estilo autoritário: caracteriza-se por valores elevados em controle e
exigência, mais baixos em afeto e comunicação. Pais com este estilo autoritário não costumam expressar abertamente seu afeto a seus filhos e não consideram muito seus interesses e necessidades. Seu excessivo controle pode manifestar-se em algumas ocasiões como uma afirmação de poder, pois as normas costumam ser
impostas sem que haja nenhuma explicação. São pais exigentes e propensos

autilizar práticas coercivas (baseadas no castigo ou na ameaça) para eliminar as
condutas que não toleram em seus filhos.
• Estilo permissivo: caracteriza-se por elevados níveis de afeto e comunicação,
unidos à ausência de controle e de exigências de maturidade. Nesse caso, são os interesses e os desejos da criança que parecem dirigir as interações adulto-criança, pois os pais são pouco propensos a estabelecer normas, fazer exigências ou exercer controle sobre a conduta das crianças; procuram se adaptar a suas necessidades, intervindo o menos possível com atuações que suponham exigências e pedido de esforços.
• Estilo indiferente ou negligente: caracteriza-se pelos níveis mais baixos em
ambas as dimensões, dando lugar a pais com pouco envolvimento nas tarefas de crianças e educação. Suas relações com os filhos se caracterizam pela frieza e pelo distanciamento, mostram pouca sensibilidade com as necessidades das crianças, algumas vezes não atendendo sequer às questões básicas. Geralmente esses pais apresentam uma ausência de normas e exigências, mas algumas vezes exercem um controle excessivo, não-justificado e incoerente.
As conseqüências de as crianças crescerem em famílias exigentes
caracterizadas por um ou outro estilo foram descritas de forma sintética por Moreno e Cubero (1990) e Palacios e Moreno (1994):
• Filhos de pais democráticos: elevada auto-estima, enfrentam novas situações
com confiança e são persistentes nas tarefas que empreendem; se destacam por sua competência social, seu autocontrole e pela interiorização de valores sociais e morais.
• Filhos de pais autoritários: costumam ter baixa auto-estima e pouco controle,
embora se mostrem obedientes e submissos quando o controle é externo.
• Filhos de pais permissivos: se mostram, a primeira vista, como os mais
alegres e vitais; no entanto, também são imaturos, incapazes de controlar seus
impulsos e pouco persistentes nas tarefas.
• Filhos de pais negligentes: têm problemas de identidade e de baixa autoestima; não costumam acatar as normas e são pouco sensíveis às necessidades dos demais; e em geral, são crianças especialmente vulneráveis e propensas a experimentar conflitos pessoais e sociais.
É importante observar que as mesmas práticas educativas podem produzir
efeitos distintos em crianças de características distintas, pois a individualidade
psicológica de cada criança influencia com toda probabilidade nas práticas
educativas que seus pais utilizam. As práticas educativas realizadas pelas famílias sofrem influência de diversas fontes de determinação, tanto intra como
extrafamiliares, e devem ser compreendidas considerando as características
específicas da situação e dos participantes envolvidos.


Texto escrito por AGIVANDA SOARES DE ANDRADE

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