11.09.2015

Fiocruz reafirma as conquistas do povo brasileiro no contexto de luta por direitos e redução das desigualdades sociais




É fundamental a mobilização em defesa da legalidade democrática e do respeito incondicional à manifestação do voto popular, frente às articulações evidentes de certos movimentos políticos, de segmentos de parlamentares e de setores da mídia que tentam impor saídas aventureiras e golpistas que ameaçam com a quebra do Estado de Direito. Defender a democracia é defender o SUS e, simultaneamente, defender o SUS é defender a democracia. Passados quase 30 anos, permanece atual o discurso de Sergio Arouca na 8a Conferência Nacional de Saúde: “Democracia é saúde”.

A FIOCRUZ E OS DESAFIOS DO SUS FRENTE A ATUAL CONJUNTURA POLÍTICA

O VII Congresso Interno da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), reunido em plenária extraordinária para deliberação sobre a estrutura e a governança institucional, reitera os termos da carta política A Fiocruz e os desafios do SUS: a saúde como direito humano e fator decisivo para a inclusão social e para o desenvolvimento, aprovada em novembro de 2014 por esta mesma instância deliberativa.
Naquele momento, reafirmou-se o compromisso da Fiocruz com a promoção da saúde pública como direito humano inalienável, com o avanço do conhecimento científico e tecnológico a serviço da população, com a compreensão da saúde como elemento central para o desenvolvimento sustentável e para a reafirmação da soberania nacional. Entendeu-se ainda como grande desafio da sociedade brasileira aliar crescimento econômico, equidade e inclusão social, o que requer a efetivação do Sistema Único de Saúde (SUS) como um sistema universal e de qualidade e a permanente atualização da agenda institucional e nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I).
Esta visão ampla da saúde e dos desafios para a CT&I encontra-se hoje diante de sérios riscos e exige um claro posicionamento institucional, condizente com sua missão e seus valores. Tais riscos decorrem da interrupção de um ciclo com início nos anos 2000 e que se estendeu por praticamente uma década gerando importantes avanços, em diversas frentes, com destaque para a inclusão social, com expressiva extensão de direitos sociais. Soma-se a esse processo o aumento da renda e expansão do emprego, decorrência da maior ação estatal, mobilizadora direta e indireta de investimentos e sobretudo, de políticas assertivas de caráter social, ainda que insuficientes, consideradas a extrema desigualdade e as grandes necessidades do país. Mais especificamente, observou-se também neste período um significativo incremento no aporte de recursos para CT&I, fruto de uma compreensão da importância deste setor para o desenvolvimento e a soberania do país.
Este ciclo é interrompido recentemente, sendo adotadas medidas de contenção dos gastos públicos, elevação de juros e opções por tentar preservar setores econômicos mediante desonerações fiscais. Para os servidores públicos, a imposição de mais perdas salariais, desmerece sua condição de efetivos servidores à sociedade, acarretando um ambiente de grande insatisfação e graves consequências para as instituições públicas e para seu papel no desenvolvimento da sociedade.
Medidas de ajuste fiscal, ao mesmo tempo que deixam intocados os ganhos do capital financeiro e as grandes fortunas, provocam impactos negativos diretos na vida da classe trabalhadora e começam a gerar resultados contrários às expectativas de uma sociedade que demanda mais desenvolvimento social, econômico e soberania. O ajuste proposto implica menor responsabilidade do Estado pelo desenvolvimento do país, ao privilegiar a contenção dramática do investimento e custeio públicos. O comprometimento do emprego e do nível de renda do trabalho já são claros, com tendências de continuada deterioração e graves consequências à cidadania. Especificamente no campo da saúde, com reconhecida necessidade de mais recursos, novos cortes são anunciados representando perspectivas ameaçadoras ao futuro do SUS como sistema universal. 
Na CT&I, tal como se verifica nos principais instrumentos de fomento e manutenção de programas e estruturas de incentivo à pesquisa e à inovação, os cortes são altamente comprometedores. Para as instituições científicas e tecnológicas são contidos recursos e suspensos concursos, trazendo sérios riscos para a preservação de suas principais ações e comprometendo o seu futuro.
Para a Fiocruz, instituição estratégica de Estado no campo da CT&I em saúde, tais retrocessos ameaçam suas contribuições ao país e à sociedade. Sua expressão e reconhecimento em âmbito nacional e internacional, são decorrentes do compromisso e da qualificação do conjunto de seus servidores e de políticas que a fortaleceram, ao longo de mais de um século e, sobremaneira, nos últimos anos, quando concursos regulares e importantes investimentos contribuíram para o seu desenvolvimento.
As políticas de contenção de gastos públicos vêm sendo implementadas em quadro de forte deterioração da economia do país, também contaminada pela atual crise econômica mundial.  Neste contexto, caminhos alternativos alinhados à perspectiva do desenvolvimento econômico e social vem sendo propostos por diferentes setores da sociedade e que também se expressam no interior do governo.  Trata-se de reverter o quadro recessivo, preservar direitos, ampliar as conquistas sociais, impedindo perdas aos trabalhadores e à sociedade.
Ao mesmo tempo, emergem movimentos políticos conservadores, com forte representação hoje no Congresso Nacional, que colocam em xeque as conquistas econômicas, sociais e políticas, com sensível impacto na superação das iniquidades sociais e na busca pelos direitos ambientais e os relacionados ao gênero, à etnicidade, à liberdade religiosa. Neste contexto são propostos projetos de lei que provocam retrocessos nos direitos das mulheres, das populações indígenas e outros grupos sociais. O mesmo espectro conservador se faz presente no que se refere às liberdades individuais e à convivência social, como no caso do uso de drogas, porte de armas, maioridade penal. Tais projetos acarretam riscos à efetivação do direito universal à saúde e à agenda contemporânea dos direitos individuais e coletivos.
Neste cenário, um dos mais importantes riscos refere-se à perda da institucionalidade democrática e dos direitos assegurados pela Constituição de 1988. É fundamental a mobilização em defesa da legalidade democrática e do respeito incondicional à manifestação do voto popular, frente às articulações evidentes de certos movimentos políticos, de segmentos de parlamentares e de setores da mídia que tentam impor saídas aventureiras e golpistas que ameaçam com a quebra do Estado de Direito. Defender a democracia é defender o SUS e, simultaneamente, defender o SUS é defender a democracia. Passados quase 30 anos, permanece atual o discurso de Sergio Arouca na 8a Conferência Nacional de Saúde: “Democracia é saúde”.
O processo de implementação da Reforma Sanitária Brasileira e da consolidação do SUS são conquistas do povo brasileiro no contexto de luta por direitos e redução das desigualdades sociais, sendo o SUS uma marca distintiva de uma sociedade que se pretende justa, fraterna e igualitária.
Além de garantir o direito constitucional à saúde e promover a inclusão social e redução das desigualdades, o SUS contribui para o desenvolvimento econômico por intermédio de um complexo produtivo em saúde que movimenta cerca 9% do PIB, constituído por uma rede de serviços públicos e privados e por unidades públicas e privadas de produção de insumos estratégicos, como vacinas e medicamentos, que empregam mais de 12 milhões de trabalhadores. Este complexo deve garantir a soberania e a sustentabilidade do sistema de saúde, ampliação do acesso a estes insumos, além de contribuir para o desenvolvimento científico e tecnológico do país, setor este que responde por mais de 35% do esforço de inovação no país.
O Brasil é o único país do mundo que tem uma rede de saúde gratuita e aberta a toda a população em que o gasto privado é superior ao gasto público.  Por isso, são necessárias novas fontes de recursos para o setor e ampliação do gasto público, para que este se torne condizente com o caráter universal do SUS e acompanhe as exigências demográficas e epidemiológicas, bem como científicas e tecnológicas, permitindo a garantia de acesso de qualidade à atenção à saúde. 
A XV Conferência Nacional de Saúde, que se realiza nos primeiros dias de dezembro de 2015, abordará um ponto estratégico para o bem-estar da população e reforçará o direito assegurado na Constituição Federal: “Saúde Pública de Qualidade para Cuidar Bem das Pessoas: Direito do Povo Brasileiro”. Desde já, todos os governantes devem se comprometer com suas deliberações. A agenda da Conferência reafirma o princípio estruturante de saúde como um direito de cidadania, em contraposição à sua mercantilização e privatização. E esta é a perspectiva adotada pela Fiocruz, que dá sentido à sua missão e está presente nos valores institucionais.
A conjuntura econômica e o contexto político desfavorável não podem justificar quaisquer recuos no caminho trilhado com vistas a assegurar a conquista à saúde como direito humano e fator decisivo para a inclusão social e para o desenvolvimento. Por isso, neste momento, reafirmamos os princípios que orientam nossa atuação como instituição estratégica de Estado, na defesa do SUS, na garantia das políticas de ciência e tecnologia, das políticas de educação pública e das demais políticas sociais e econômicas que possibilitem os avanços garantidos pela Constituição Brasileira.

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