10.19.2018

Entre fascismo e democracia não há neutralidade



O Brasil está vivendo um dos momentos mais difíceis da sua História, mas a imprensa nacional finge que não está acontecendo nada. Enquanto os principais jornais e revistas do mundo fazem reportagens com alertas sobre o perigo que Bolsonaro representa para a democracia no Brasil e na América Latina, conscientes da gravidade da situação em nosso país com o avanço do fascismo, a imprensa brasileira encara os acontecimentos com surpreendente indiferença, como se pregar a violência, agredir e até matar adversários políticos, fosse normal.
Com esse comportamento, que revela descompromisso com os interesses nacionais, a nossa imprensa escancara a sua cumplicidade com os inimigos do Brasil e do seu povo, endossando a escalada do fascismo e a criação das condições para a implantação de uma nova ditadura. E com a aprovação silenciosa, também, da mais alta Corte de Justiça do país, que constitucionalmente tinha o dever de defender a nossa democracia e, no entanto, é uma das principais responsáveis, senão a maior, pela grave situação que atravessamos. Foi o Supremo, afinal, o primeiro a dar o mau exemplo, rasgando a Constituição.
Os partidos políticos, especialmente o MDB, o DEM e o PSDB, três das maiores agremiações partidárias do país, também estão dando a sua contribuição para que o fascismo aqui faça morada, na medida em que declaram neutralidade no segundo turno das eleições. Na verdade, quem se declara “neutro” é porque não tem coragem de assumir publicamente uma posição, o que na prática significa apoio velado ao candidato da extrema direita. É surpreendente como figuras que se projetaram na política com aparência de esquerda e de democratas, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, se declarem neutros no momento em que está em jogo a sobrevivência da democracia.
Surpreende, também, a atitude do ex-ministro Ciro Gomes, que preferiu ausentar-se do país, em viagem turística pela Europa, justo na hora em que a sua presença seria de grande importância para ajudar o candidato petista Fernando Haddad na luta para vencer o segundo turno e impedir a implantação do fascismo. Afinal, o momento é de união de todas as forças progressistas para evitar uma nova ditadura.
Enquanto personalidades e organizações internacionais se revelam apreensivas diante da possível vitória do ex-capitão, fazendo seguidas advertências sobre o perigo que ele representa para a democracia não apenas no Brasil mas, também, no mundo, os próprios brasileiros parece que perderam a capacidade de avaliação e não atentam para a gravidade do momento. Muito pelo contrário, o contingente de eleitores de Bolsonaro cresce apesar de todos os avisos. Mais grave ainda, políticos de projeção nacional que sempre se disseram democratas – e de esquerda – entre eles o ex-presidente FHC e candidatos derrotados no primeiro turno das eleições presidenciais, como Ciro Gomes e Marina Silva, por exemplo, declararam neutralidade, ficando em cima do muro justo no momento em que o país mais precisa deles.
O ex-governador cearense, o terceiro colocado no pleito como candidato do PDT, preferiu, inclusive, ausentar-se do país, enquanto seu irmão, o senador eleito Cid Gomes, fez severas críticas ao PT, depois de tê-lo como aliado na disputa pelo Senado. Percebe-se, claramente, que Ciro, seu irmão, seus seguidores e o PDT ficaram magoados, ressentidos porque Lula não escolheu o cearense para substitui-lo na disputa presidencial. Conclui-se, desse modo, que ele estava mais preocupado com o seu projeto pessoal de poder do que com o país.
O fato é que todos os que se declararam neutros neste segundo turno na verdade estão apoiando veladamente o candidato do PSL, indiferentes ao futuro do país. Enquanto isso, membros do Parlamento Europeu assinaram um manifesto contra o fascismo no Brasil, expressando o seu “mais profundo repúdio” por Bolsonaro e conclamando “as brasileiras e brasileiros a refletirem sobre a gravidade deste momento histórico”. E acrescentaram, como um puxão de orelhas nos que ficaram no muro: ”Entre a democracia e o fascismo não pode haver neutralidade”. De fato, ninguém que ame o Brasil ficará neutro no momento em que está em jogo a sobrevivência da democracia. Os que assumirem essa posição não poderão, no futuro, criticar os atos de um eventual governo Bolsonaro ou apresentar-se como candidato a qualquer cargo eletivo com uma falsa bandeira de democratas.
Ciro Gomes, por exemplo, que preferiu fugir para o exterior, já estaria se preparando para concorrer novamente à Presidência da República em 2022, conforme afirmou o presidente do seu partido, mas com que cara e com que argumento pedirá voto aos brasileiros? Além de perder a credibilidade, ninguém pode garantir que haverá eleições em 2022, pois com o ex-capitão no governo, cercado de generais, a ditadura parece inevitável.
O ex-presidente FHC, que se tornou um dos maiores antipetistas do país e, ao mesmo tempo, quer parecer um democrata preocupado com os destinos do Brasil – na verdade um entreguista contumaz – talvez tenha declarado neutralidade neste segundo turno porque suas idéias tem muita afinidade com as idéias de Bolsonaro, especialmente na questão das privatizações. A sua neutralidade, na verdade, é apenas de fachada, porque no fundo torce pela vitória do ex-capitão, que teve sua candidatura turbinada pelas fake News que empestaram as redes sociais, particularmente o whatsApp, usando a mesma técnica – e os mesmos técnicos – que proporcionaram a eleição de Donald Trump.
Ou seja, a disseminação da mentira que, infelizmente, convenceu no Brasil homens e mulheres desencantados com a classe política e, também, descerebrados que se tornaram fanáticos eleitores do ex-capitão. Com a imprensa brasileira acumpliciada com a onda Bolsonaro, escondendo ou minimizando os fatos negativos da sua biografia e ignorando o perigo que ele representa para a nossa democracia, só a imprensa estrangeira consegue enxergar, mesmo de longe, a tragédia anunciada. O jornalista Francisco de Assis, do jornal português “Público”, por exemplo, acaba de publicar um artigo com o titulo de “Um canalha à porta do Planalto”. Ele diz, entre outras coisas, que “uma vitória de Bolsonaro significaria um retrocesso civilizacional para o Brasil e para o mundo”. A julgar pelas pesquisas, a possibilidade de isso acontecer fica maior a cada dia

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