10.15.2018

Não é sobre política: é sobre meu risco de morrer por ser gay





O problema é que, nesta eleição, não são questões econômicas e sociais que estão em jogo. O que está em jogo é o meu direito à vida.simpatia pelo Partido dos Trabalhadores, pelos movimentos sociais e pelo campo progressista sempre foi minoritária. Isso nunca impediu, ainda que em um ninho tucano, eu vivesse os natais e as festas de família sem maiores problemas e discordâncias ideológicas. Votar em outro candidato é da democracia, e ainda que eu discorde das análises políticas de pessoas que eu amo muito, elas tem o direito de pensar diferente em questões econômicas e sociais.
A relação de declarações homofóbicas do candidato que lidera as intenções de voto no segundo turno, Jair Bolsonaro (PSL) é extensa. Entre os mais famosos ataques que o candidato da extrema-direita já proferiu, estão "Seria incapaz de amar um filho homossexual. Prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí" e "Não vou combater nem discriminar, mas, se eu vir dois homens se beijando na rua, vou bater". Ele ainda disse que homossexuais não produzem "nada de bom" para a sociedade e que para "corrigir" um "filho assim gayzinho" é só dar uma surra. Armado de mentiras, ele sempre foi um dos maiores detratores dos direitos da comunidade LGBT no Brasil, e promoveu a homofobia e a transfobia como ferramenta política para crescer entre as rodas conservadoras.
Deu certo.
Ainda que ele se explique longamente sobre as declarações que ele mesmo deu durante 30 anos de vida pública, está muito claro o que Bolsonaro pensa sobre o meu direito de existir enquanto homem gay. Suas declarações como deputado sempre reforçaram essa relação violenta para com os LGBT, no país que mais mata gays, lésbicas, travestis, transexuais e bissexuais, elas tem relação direta, aliada a outros atores reacionários, para a escada de violência homofóbica que vivemos.
Segundo o Grupo Gay da Bahia, a cada 20 horas um LGBT morre de forma violenta no país. A homofobia e a transfobia deixaram 445 mortos em 2017. Elegendo um candidato progressista, que pautasse políticas públicas de criminalização dos crimes de ódio e uma educação para a diversidade, este panorama reduziria gradativamente, mas ainda com a dificuldade em um país que historicamente nega direitos aos LGBT e os trata como cidadãos de segunda categoria. Com a eleição de Bolsonaro, entretanto, o discurso se empodera.
Quem odeia os LGBT, se sentirá permitido a odiar, já que compartilhará das mesmas opiniões do presidente da República, respaldado por eleições democráticas. Os crimes de ódio terão uma escalada nunca antes vista desde que a pauta da diversidade ganhou uma maior proporção, na metade dos anos 90. Grupos religiosos fundamentalistas, neonazistas, fascistas, conservadores radicais e toda sorte de reacionários que nunca teve pudores para expressar seu desprezo pela dignidade da comunidade sexodiversa, terá uma carta branca tácita para tirar a violência do campo das ideias e levá-la ao campo de batalha.
E isso não é só teoria. Nos Estados Unidos, desde novembro de 2016, quando Donald Trump foi eleito com um discurso semelhante de negação de direitos à minorias, os crimes de ódio estão em alta. Um estudo do Centro para Estudo de Ódio e Extremismo, da California State University, aponta um aumento de dois dígitos no número de casos em muitas regiões metropolitanas em 2016. Em cidades como Washington, capital americana esse número cresceu 62%. A lista de ocorrências inclui ataques a diversas minorias étnicas e religiosas mas, é claro, é engrossada por crimes contra os LGBT.
Assim sendo, eu não tenho a intenção de fazer o papel de profeta das tempestades, mas me debruçar sobre a realidade que se avizinha. Nem tenho a intenção de fazer terrorismo político, porque isso não muda a intenção de voto de ninguém, mas apenas de registrar, de maneira antecipada, que haverá mais sangue de LGBT nas ruas, e que anuência do Governo Federal, por omissão, será peça fundamental em cada assassinado e agressão que pessoas como eu estarão vulneráveis a sofrer.
Deixo, por fim, um recado que pode vir a ser póstumo: se eu for assassinado em um crime de ódio com um homofóbico declarado no Governo e você depositou seu voto pra ele, não venha no meu velório, não chore minha morte, não lamente pelo crime. Suas mãos estarão tão sujas de sangue quanto as dele, e minha memória, que viverá pra sempre, deixará marcado que cada facada, pancada ou tiro que terei recebido, terá a sua participação em essência.
Depois, não adiantará chorar sobre o meu sangue derramado.

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