2.18.2010

Mania de Calmante

A fórmula química que combate o sofrimento

Especialistas advertem que psicofármacos só melhoram a ansiedade e a depressão se aliados a psicoterapias

Para o psicanalista Benílton Bezerra Júnior, o consumo desenfreado de psicofármacos está mudando até o modo de se compreender o sofrimento. Os conflitos existenciais não fazem parte de uma sociedade em que as pessoas buscam apenas imagens de sucesso:
— O sofrimento hoje é um desvio, uma disfunção cerebral que deve ser corrigida com um medicamento.
A expectativa de solução desse “distúrbio” é imediata, a partir, segundo Benílton, da própria propaganda dos laboratórios que vendem produtos como drogas do bem-estar:
— Como a indústria precisa expandir a sua base de consumo, há uma tendência de uso experimental mesmo — alerta Benílton.
O psicanalista Eduardo Losicer concorda que o consumo de psicofármacos é desenfreado porque, segundo ele, são fabricados desenfreadamente:
— O mal-estar do século passado era existencial. Hoje é a depressão, vista como vazio interno, que leva à compulsão, inclusive de calmantes.

Uma pílula para uma noite de sono profundo

Para o psiquiatra Guilherme Toledo, a mania de calmantes não é um fenômeno urbano, mas alarmante também em cidades do interior:
As pessoas também não vivem sem calmantes.
Pacientes querem apenas receita de calmante,

— O calmante é um alívio imediato, mas de nada adiantará se não for associado a um trabalho terapêutico.
As famílias pobres vivem desamparos insolúveis:
— A mulher que não sabe o que faz com o marido bêbado que maltrata os filhos precisa, ao menos, dormir à noite.
Há os que recorrem às drogas apenas para dormir, um Dormonid para dormir nos dias em que está excitado demais:
— Se eu passar a noite acordado, fico simplesmente insuportável — diz.

Muitas pessoas também recorrem ao Lexotan para relaxar. O designer de bolsas Gilson Martins, depois de tomar ansiolíticos como Olcadyl, relaxa com acupuntura:
— Não funciona como um coquetel de remédios mas, com o tempo, me estabiliza.
Noa EUA as pílulas são vendidas em supermercados. Você toma e bumba: uma hora depois você já está dormindo. Se eu não dormir, fico lerdo. Depois de tomar um comprimido, ir ao banheiro, para mim, se torna uma viagem longa.


Pesquisa comprova ‘uso irracional’ de calmantes

Uso incorreto pode agravar a depressão

Em apenas uma das lojas da rede de drogarias Pacheco, no Leblon, pode-se comprovar o alto consumo de psicofármacos, especialmente os vendidos com retenção de receita azul: o campeão de vendas é o Lexotan, da Roche, 20 caixas por dia; seguido por oito caixas diárias de Frontal, da Pharmacia; seis de Olcadyl, da Novartis; quatro de Lorax, da Wyeth. Dos antidepressivos, o mais vendido é o Aropax, da Smithkline: oito caixas; depois vem o Zoloft, da Pfizer, seis caixas; e em terceiro o Prozac, da Lilly, com quatro caixas. O Brasil tem 48 mil farmácias, o dobro do necessário, segundo a OMS. Trata-se de “uso irracional” de psicotrópicos, segundo constatou pesquisa do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid) da Unifesp, que analisou 108.215 receitas retidas em farmácias de cidades paulistas, das quais 42% não estavam preenchidas corretamente. Para os psiquiatras, o problema mais grave é o erro da prescrição, que agora é feita também por clínicos e endocrinologistas. Um calmante ministrado para um paciente com depressão, por exemplo, pode agravar a doença e até levá-lo ao suicídio.

Os efeitos colaterais
TRANQÜILIZANTES: São drogas chamadas de ansiolíticos e indicadas para os transtornos de ansiedade generalizada (TAG), que podem se agravar e levar à angústia e impedem, por exemplo, que a pessoa durma normalmente, segundo o psiquiatra Guilherme Toledo. Os mais comuns são Lexotan, Olcadyl, Frontal, Lorax, Diasepan, Rivotril. São medicamentos perigosos que podem levar à dependência não só psíquica, mas também física, o que torna muito difícil a interrupção do uso continuado. A venda é controlada e a receita do médico que o receitou, com o nome do paciente, fica retida na farmácia.

ANTIDEPRESSIVOS: São os antidepressivos tradicionais, conhecidos como tricíclicos, entre eles o Triptanol, Anafranil e Tofranil. São vendidos com receita comum, mas produzem efeitos colaterais como tremores, taquicardias, secura da boca e tonteiras.

INIBIDORES: São os antidepressivos de última geração, conhecidos como inibidores seletivos da captação de serotonina pelo cérebro, entre eles o pioneiro Prozac, seguido de novas drogas como o Aropax, o Zoloft, o Efexon e o Remeron. São conhecidos como as novas drogas do bem-estar e têm a vantagem de não oferecer tantos efeitos colaterais quanto os tricíclicos. Não causam dependência física, apenas dependência psíquica. São vendidos nas farmácias com receituário comum.

O Estado do Maranhão

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