Reinaldo Azevedo
09/10/2019 16h43
Kátia Abreu e Deltan Dallagnol: senadora
pede que procurador seja afastado da Lava Jato. Ela não desiste com
facilidade de uma peleja
Fica clara, assim, de saída a legitimidade da senadora para fazer tal pedido. Em sua petição, a parlamentar afirma: "o presente pedido de remoção por interesse público não representa um ato de hostilidade à 'Operação Lava Jato', mas sim uma medida que busca atender ao interesse público e conferir credibilidade à persecução penal conduzida pela Força Tarefa do MPF em Curitiba." A senadora sustenta que a manutenção de Dallagnol na coordenação afeta a credibilidade da força-tarefa. E em que ela sustenta a sua tese?
A petição apresenta a impressionante lista de nada menos de 17 procedimentos disciplinares que há contra o buliçoso procurador, a saber:
1 – Processo Administrativo Disciplinar nº 1.00898/2018-99: Manifestação pública indevida. Afirmação de atuação leniente de membros do Supremo Tribunal Federal. Entrevista concedida ao Jornal da CBN da Rádio CBN;
2 – Reclamação Disciplinar nº 1.00422/2019-93: Apuração dos fatos noticiados pelo sítio jornalístico "The Intercept", o qual revelou conteúdo de troca de mensagens entre autoridades submetidas à competência deste CNMP (DELTAN DALLAGNOL e outros) e uma autoridade judicial à época dos fatos;
3 – Reclamação Disciplinar nº 1.00212/2019-78: Manifestações em redes sociais. Suposta violação do dever de imparcialidade. Interferência nas eleições para a Presidência do Senado Federal;
4 – Reclamação Disciplinar nº 1.00428/2019-15: Suposta violação de sigilo funcional proveniente de publicações em redes sociais. Conduta incompatível com o cargo ou função;
5 – Reclamação Disciplinar nº 1.00214/2019-85: Suposta violação do dever funcional na celebração de acordo para criação de fundação de combate à corrupção.6 – Reclamação Disciplinar nº 1.00490/2019-06 Apuração de suposta conduta irregular nos ritos e investigações de processo criminal. Suposto conluio entre Procuradores da Força Tarefa em Curitiba e o então Juiz Federal Sérgio Fernando Moro, nos ritos e encaminhamentos das investigações, revelado por meio das reportagens do portal da internet "The Intercept Brasil", no Jornal Folha de São Paulo, no canal "O É da Coisa", na rádio Band News e na Revista Veja;
7 – Reclamação Disciplinar nº 1.00591/2019-97: Apuração de suposta perseguição clandestina a Ministro do Supremo Tribunal Federal;
8 – Reclamação Disciplinar nº 1.00699/2019-61: Apuração de suposta atuação irregular. Eventual perseguição político partidária;
9 – Reclamação Disciplinar nº 1.00509/2019-15: Apuração de supostas ilegalidades praticadas por membros na Força Tarefa da Lava Jato em Curitiba;
10 – Reclamação Disciplinar nº 1.00546/2019-32: Apuração de suposta atuação irregular na utilização de recursos oriundos de processos decorrentes da Operação Lava Jato;
11 – Reclamação Disciplinar nº 1.00555/2019-23: Apuração de suposta conduta irregular no cumprimento de funções públicas e recebimento de vantagens pessoais por parte de integrante da Força Tarefa da Lava Jato;
12 – Reclamação Disciplinar nº 1.00560/2019-08: Apuração de suposta atuação irregular. Percepção de valores por palestra e gravação de vídeo promocional;
13 – Reclamação Disciplinar nº 1.00572/2019-51: Apuração de eventual falta funcional. Suposta realização de investigação ilegal e inconstitucional contra ministros do Supremo Tribunal Federal;
14 – Reclamação Disciplinar nº 1.00579/2019-37: Suposta conduta incompatível com o cargo. Apuração de eventual participação na contratação de publicidade veiculada em outdoor;
15 – Reclamação Disciplinar nº 1.00586/2019-10: Apuração de suposta atuação incompatível com o cargo. Eventual tentativa de investigação de Ministro do Supremo Tribunal Federal;
16 – Reclamação Disciplinar nº 1.00589/2019-81: Representação subscrita em face de membros do Ministério Público Federal (MPF) integrantes da Força Tarefa Lava Jato;
17 – Reclamação Disciplinar nº 1.00698/2019-08: Apuração de suposta atuação irregular. Suposta formulação de pedido de impeachment em face de Ministro do STF.
Kátia lembra ainda o espantoso caso do uso indevido que a força-tarefa pretendia dar a multa paga pela Petrobras, que previa até a utilização de parte dos R$ 2,5 bilhões para a criação de uma fundação privada. A própria Procuradoria Geral da República recorreu contra o acordo espúrio, e liminar do ministro Alexandre de Moraes suspendeu a patuscada. A senadora transcreve trecho da ação movida pela PGR: "Basta verificar que aqueles membros da Força-Tarefa, assumiram compromissos administrativos e financeiros pelo Ministério Público Federal, falando pela própria instituição sem poderes para tanto, de conduzir todas as etapas do processo destinado à constituição de uma fundação de direito privado".
Afirma a senadora:
"A gravidade dos atos praticados pelos membros Força Tarefa do MPF em Curitiba – PR, sob orientação do ora representado, demonstram a falta de apego aos deveres constitucionais, legais e funcionais, para atuar dentro daquilo que entendem por certo, e geram nefastas consequências à ordem jurídica, notadamente pela usurpação de competência das mais diversas autoridades públicas brasileiras, conforme constatado pela própria Procuradora-Geral da República RAQUEL DODGE e o pelo eminente Ministro ALEXANDRE DE MORAES (…)"
Que fique claro: a senadora não está pedindo que Dallagnol sofra uma sanção disciplinar. Trata-se, reitera-se, de afastamento a função a bem do serviço público. As questões disciplinares obedecem a um outro rito. Como resta claro, Constituição, lei e estatuto do CNMP permitem tal procedimento.
É claro que a gente sente um pouco de vergonha alheia quando vê a lista de procedimentos que protocolados contra Dallagnol. E todos por bons motivos. Em todos eles — que remetem a fatos tornados públicos — encontramos um procurador e um coordenador da força-tarefa fora de sua função.
Para lembrar: o Conselho Nacional do Ministério Público conta com 14 titulares: além do procurador-geral, há três indicações dos MPs estaduais, e cada um dos seguintes entes indica um membro: Ministério Público Federal, Ministério Público Militar, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, STF, STJ, Senado e Câmara. Há ainda dois nomes escolhidos pela OAB. As indicações têm de ser referendas pelo Senado.
A situação hoje do Conselho é a seguinte: ativos mesmo, há 10 integrantes. Sandra Krieger, indicada pela OAB, aguarda a nomeação pelo presidente da República. Marcelo Weitzel Rabello de Souza, do Ministério Público Militar, tem de ter sua recondução avaliada pelo Senado. A apreciação de seu nome foi suspensa depois de os senadores terem rejeitado a recondução de Lauro Machado Nogueira e Dermeval Farias Gomes Filho, representantes, respectivamente, do Ministério Público Estadual e do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.
Em agosto deste ano, os três votaram contra reclamação disciplinar apresentada pela própria senadora contra Dallagnol.
DIFICULDADES
Uma das dificuldades do Conselho é justamente esta: se vocês contarem nos dedos, oito dos 14 representantes são ligados a alguma esfera do Ministério Público. O apelo corporativista é grande
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