3.17.2009

A planta que cura feridas

Cicatrização de ferida em membro humano antes e após tratamento com a enzima presente na planta Carica candamarcensis


Espécie da família do mamão melhora cicatrização em até 60%, mostram cientistas

Um ataque externo. Baixas no exército. Cidade parcialmente destruída. Tropas vizinhas chegam para a reconstrução. É preciso limpar o terreno e preparar novas edificações. Em alguns dias, tudo volta ao normal. A descrição lembra uma batalha, mas, nas devidas proporções, mostra o que ocorre num organismo vivo quando sua pele é lesionada. Animais e plantas têm na cicatrização um importante mecanismo que impede a perda excessiva de sangue (ou seiva) e a exposição de tecidos. <

Dois pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) perceberam que uma planta era bastante eficaz na realização desse 'serviço'. Quando o fruto da Carica candamarcensis era cortado, liberava o látex que fechava sua 'ferida' rapidamente. Assim, os cientistas tiveram a idéia de adotá-lo em ferimentos de mamíferos. O resultado foi surpreendente: até 60% de melhora na cicatrização das lesões promovidas.

A espécie, da família do mamão, é nativa do litoral pacífico da América do Sul -- incluindo o do Chile. Lá nasceu um dos idealizadores do estudo, o bioquímico Carlos Edmundo Salas Bravo. Da terra natal, trouxe a planta e a apresentou a Miriam Lopes, especialista em estudos celulares. Juntos, eles começaram a estudá-la e, em 1997, iniciaram experimentos in vitro.

Primeiramente, eles isolaram substâncias que poderiam ser responsáveis pela cicatrização da planta -- enzimas do tipo cisteíno-proteinase. Uma delas quebra proteínas localizadas no ferimento e contribui para limpar a área do corte. Ao mesmo tempo, é provável que alguns produtos da quebra contribuam para aumentar a divisão celular. "Para haver cicatrização é necessário que o tecido atingido seja substituído por outro", explica Miriam. "Isso é feito pelas células vizinhas, que se dividem e ocupam o lugar do tecido morto."

Algum tempo depois, os pesquisadores passaram a realizar o teste em animais e humanos. Os resultados, com 20 voluntários, foram especialmente bem-sucedidos em indivíduos com problemas de cicatrização e/ou que não respondiam a outras medicações. Outro alvo dos testes foi a úlcera gástrica. Nos testes realizados em animais, uma enzima isolada foi efetiva na redução de úlceras gástricas, que em alguns casos desapareceram completamente.


Remédios cicatrizantes não chegam a ser novidade, mas, segundo Miriam, nenhum deles é completo. "Eles limpam os detritos, mas não estimulam a divisão das células em volta, como fazem os componentes do látex da C. candamarcensis", afirma. Agora, Miriam e Carlos se concentram em decifrar a seqüência dos aminoácidos da(s) proteinase(s) da planta, que não existe no Brasil. A solução seria obter a substância ativa com técnicas de biologia molecular.
Mas ainda é cedo para imaginar a venda de medicamentos à base da planta. "A pesquisa deve continuar até que a substância possa ser aprovada", diz a pesquisadora. "Dependemos do interesse de laboratórios em produzir o medicamento para que possa ser comercializado."

Rafael Barros
Ciência Hoje On-line

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