5.09.2009

Biblioteca de Medicamentos

Superbiblioteca de medicamentos ajuda a criar novas drogas a partir de antigas
Pesquisadores da Universidade Johns Hopkins guardam 3.000 princípios.
Vantagem é uso de remédios já aprovados e sem royalties sobre eles.

Mantidos numa fila de refrigeradores brancos, num laboratório da Escola de Medicina da Johns Hopkins University, em Baltimore, estão mais de 3.000 – de um total estimado de 10.000 – medicamentos conhecidos da medicina. Não há uma placa na porta para indicar que esta talvez seja a maior biblioteca de medicamentos disponível a pesquisadores interessados em descobrir novos usos para remédios antigos e muitas vezes esquecidos.

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Até hoje, pesquisadores já utilizaram a biblioteca para descobrir que o itraconazol, remédio usado durante décadas para tratar fungos na unha do pé, pode também inibir o crescimento de alguns tipos de tumores e evitar a degeneração macular. Outro medicamento, a clofazimina, usado há mais de um século para tratar lepra, pode ser eficiente contra doenças autoimunes como esclerose múltipla e psoríase.

“Leva 15 anos e custa quase um bilhão de dólares para se desenvolver um novo medicamento”, disse Jun O. Liu, professor de farmacologia e diretor da Biblioteca de Medicamentos Johns Hopkins. “Por que não começar com compostos que já possuem segurança e eficácia comprovadas?”

Ele e seus colegas constroem a coleção desde 2002 e esperam completá-la até 2011. Os pesquisadores adquirem os medicamentos através de doações, compras e algumas vezes por síntese em laboratório. Eles enviarão aos pesquisadores um conjunto completo – quantidades minúsculas de cada medicamento na biblioteca – por US$ 5.000, o que cobre os custos de envio e renovação.

Sem patente
Como os remédios contra lepra e fungo na unha do pé são aprovados nos Estados Unidos e não possuem proteção de patente, experimentos clínicos para testar seus novos usos estão sendo realizados ou perto de obter a aprovação regulatória, disse Liu. Remédios ainda sob proteção de patente são mais complicados; detentores de patente raramente permitem pesquisas independentes sobre usos alternativos. “As empresas de medicamentos não têm estado muito entusiasmadas em nos ajudar”, disse Liu.

Existem outras bibliotecas de medicamentos, comerciais e não-comerciais. Fornecedores comerciais, dos Estados Unidos e de outros países, oferecem consideravelmente menos remédios que a Johns Hopkins (embora detenham remédios que não existem lá), e cobram muito mais. Bibliotecas não-comerciais incluem a do Instituto Nacional de Saúde dos EUA; a da Universidade da Califórnia, em São Francisco; e a da Universidade McMaster, em Hamilton, Ontário. Mas elas geralmente não enviam remédios a pesquisadores não-afiliados.

Independente da fonte, pesquisadores geralmente solicitam cópias de coleções completas, ao invés de medicamentos individuais que eles acreditem funcionar em seus experimentos. “Encontramos medicamentos que são ativos de maneira que ninguém jamais teria suposto”, disse Marc G. Caron, professor de biologia celular na Universidade Duke que está usando a biblioteca da Johns Hopkins para encontrar remédios capazes de acalmar a síndrome de abstinência em usuários de drogas.

Os testes desses compostos se tornaram muito mais simples nos últimos anos. Isso é possível através do uso de uma tecnologia automatizada conhecida como HTS – do Inglês high-throughput screening. Os medicamentos são dissolvidos numa solução e armazenados em pratos retangulares, compartimentados, que lembram fôrmas de gelo; eles podem então ser entregues a pesquisadores para testes sobre sua eficácia contra várias doenças e mecanismos de doenças, como as inflamações.

Conta-gotas computadorizados, agitadores de pratos e leitores de imagens microscópicas atualmente conseguem em dias o que antes levava anos para os cientistas. Embora o HTS já esteja em uso há pelo menos uma década, foi apenas nos últimos cinco anos que a tecnologia se tornou amplamente disponível. Anteriormente, somente grandes companhias farmacêuticas podiam pagar os testes de milhares de componentes; hoje, mais instituições públicas e acadêmicas estão fazendo isso. Sua ênfase tende a ser mais em redescobrir ou alterar a estrutura química de velhos medicamentos do que desenvolver novos compostos.

“A instrumentação para fazer testes sofisticados, e em larga escala, de medicamentos se tornou significativamente melhor e mais barata”, disse Michelle Arkin, diretora-associada do Small Molecule Discovery Center da Universidade da Califórnia, São Francisco. Algumas instituições, como a McMaster, em Ontário, e a Rockefeller University, em Nova York, permitem que pesquisadores externos utilizem suas estruturas de HTS por valores entre 10 mil e 20 mil dólares, dependendo da complexidade do projeto.


Menos taxistas
“Não permitimos que entrem motoristas de táxi direto da rua, mas somos bastante abertos”, disse Eric Brown, professor e presidente de bioquímica da McMaster, que junto a outro professor, Gerry Wright, inspeciona a biblioteca de medicamentos local. (Ela é conhecida por lá como Gerry and Eric's Excellent Screening Collection, ou GEEC, um trocadilho em Inglês para a palavra que designa aqueles mais obcecados por tecnologia e estudos.)

O acesso a tais aparatos aumentou a demanda pela análise de compostos, particularmente pelos medicamentos já aprovados e fora de patente. A Johns Hopkins e fornecedores comerciais relatam uma explosão de pedidos nos últimos dois anos – não só por haver mais laboratórios de HTS, dizem eles, mas também graças a esforços mundiais na busca por tratamentos mais baratos contra os males do mundo em desenvolvimento, como a malária e a tuberculose.

“Remédios antigos representam a fruta pendurada mais baixo, em termos de tratamentos seguros e baratos para essas doenças”, disse Carl Nathan, presidente de microbiologia da Escola de Medicina Weill Cornell, em Nova York. Nathan recebe pratos de medicamentos da Johns Hopkins e de fornecedores comerciais. Ele também realiza o HTS na Rockefeller, onde possui uma parceria com a Weill.

Globo.com

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