4.19.2013

Para comer sem culpa


Por Riad Younes

Há uma redução impressionante do risco de morrer de doenças cardiovasculares pela simples mudança de dieta. Mortes causadas por infartos ou acidentes vasculares cerebrais diminuídas em mais de 30%. Não há nenhum tratamento, remédio ou cirurgia que consegue tamanho impacto na saúde da população. Os dados apareceram recentemente na mais prestigiosa revista de medicina, a New England Journal of Medicine.
Um time de cientistas espanhóis, do Centro de Pesquisa Biomédica do Instituto de Saúde Carlos III, em Madri, liderado pelo doutor R. Estruch, selecionou 7.447 pacientes com elevado risco cardiovascular, mas que ainda não tinham apresentado doença clinicamente identificável. Os voluntários eram 57% mulheres, com idades variando entre 55 e 80 anos. Todos foram sorteados e separados em três grupos, baseados nas sugestões de alimentação: dieta do Mediterrâneo suplementada com azeite extravirgem, ou dieta do Mediterrâneo suplementada com nozes, ou dieta geral com a sugestão de reduzir a gordura nos alimentos.

A pesquisa monitorou 7.447 pacientes e revela que simples mudanças nos hábitos alimentares reduzem as chances de infartos e derrames. Foto: IstockPhoto
A pesquisa monitorou 7.447 pacientes e revela que simples mudanças nos hábitos alimentares reduzem as chances de infartos e derrames. Foto: IstockPhoto

Os voluntários foram seguidos de perto pelos pesquisadores durante cinco anos. Registraram o que eles comeram e os problemas de saúde que eventualmente foram diagnosticados e tratados. As causas de óbitos nesses grupos foram detalhadas, com o objetivo de avaliar o número de mortes devidas ao infarto, ao derrame ou à obstrução arterial.  Durante o estudo, 288 pessoas morreram (3,8%). Os resultados foram óbvios, com redução de 30% no risco de uma pessoa morrer de doença cardiovascular, simplesmente adotando qualquer uma das duas dietas do Mediterrâneo enriquecidas em azeite extravirgem ou nozes.
Com a licença do meu amigo e colega de CartaCapital Marcio Alemão e de seu “Refogado”, ouso me aventurar um pouco na área da dieta do Mediterrâneo. Não existe uma dieta padronizada e consumida por todos os habitantes da bacia do Mar Mediterrâneo. Desde 1949, quando Fernand Braudel publicou sua obra colossal O Mediterrâneo, tentando criar uma identidade naquela região, a diversidade étnica e cultural, e consequentemente culinária, se tornou mais clara e díspar.
Várias são as dietas dos cidadãos do Mediterrâneo, mas todas têm uma base comum: são ricas em gordura insaturada, e pobres em gordura saturada, que realmente faz mal à saúde. As cozinhas do Mediterrâneo se fundamentam no uso, e até abuso, de frutas e verduras, grãos, cereais, azeite de oliva do simples ao extravirgem, peixe e vinho. Pouca carne e reduzidas quantias de laticínios.  O estudo espanhol conseguiu, através da suplementação de azeite extravirgem e nozes, elevar consideravelmente a ingestão de polifenóis, protetores contra as lesões vasculares e suas complicações.
Olhando com detalhe as dietas sugeridas, percebe-se que o que realmente fez diferença foi o acréscimo do azeite e das nozes. Não ficou claro qual seria o papel real da própria dieta do Mediterrâneo nesse contexto, visto que a quantidade de verduras e de gordura consumida pelos três grupos de voluntários foi semelhante. Por outro lado, o maior impacto dessas dietas foi na redução de mortalidade por causa de derrames cerebrais. Parece que essas dietas reduzem efetivamente os níveis de pressão arterial, o que protege o cérebro de hemorragias e obstruções.
O estudo é interessante, porém não conseguiu testar o real impacto isolado da dieta do Mediterrâneo, do consumo mais intenso de azeite extravirgem ou de nozes. Mas o grande mérito dessa pesquisa foi o de confirmar que mudanças de hábitos como a dieta podem influenciar positivamente as chances de uma pessoa experimentar um infarto ou derrame.
Como nosso Ministério da Saúde e outras autoridades públicas agirão com base nos resultados dessa publicação, ficará a cargo da imaginação e do entusiasmo dos responsáveis. Basta lembrar que a principal causa de mortes no Brasil, hoje, são as doenças cardiovasculares.

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