6.07.2013

Os vilões para a saúde do consumidor

Produtos de origem animal são os que apresentam maior risco

  Getty Images

O brasileiro está disposto a pagar mais pela qualidade

Falhas em produção, transporte, armazenamento e manuseio podem levar a contaminação

RIO - Os produtos de origem animal, principalmente as carnes, são os mais suscetíveis a problemas que podem afetar a saúde do consumidor. Esses alimentos são mais perecíveis e propensos ao desenvolvimento de bactérias. Já os de origem vegetal — que também podem ser vetores de agentes letais — geralmente carregam microtoxinas que são menos perigosas para a saúde humana, como fungos. E os problemas podem ter origem na produção, mas também no transporte, no armazenamento e no manuseio no ponto de venda, explicam os especialistas.

Existe três formas de periculosidade para o consumidor:

a) periculosidade inerente (que está intrínseca ao produto ou serviço, a periculosidade está dentro da normalidade e previsibilidade do consumidor com relação ao uso e funcionamento do produto ou serviço);

b) periculosidade adquirida (o produto ou serviço torna-se perigoso em razão de um defeito);

c) periculosidade exagerada (periculosidade que vai além da periculosidade inerente).


“Doença de bicho pode pegar em gente. Doença de planta não.” A afirmação é de Ricardo Cavalcante, diretor do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Vegetal (Dipov) do Ministério da Agricultura (Mapa), que acrescenta que os produtos de origem vegetal oferecem muito menos riscos do que os de procedência animal.
— Os produtos de origem vegetal têm uma acidez muito maior do que os de procedência animal, inativando uma série de patógenos. Uma das funções do Mapa é monitorar microtoxinas — substâncias produzidas por fungos — que fazem mal à saúde e podem até matar. Se acender a luz amarela, já tiramos o produto do mercado , destacando que 99% dos problemas de ingestão humana são por descaminho, ou seja, causados propositalmente.
No caso das bebidas, explica Cavalcante, as polpas de frutas são as mais propensas a problemas. Já as alcoólicas são menos problemáticas, uma vez que o etanol já é um sanitizante. As destiladas, por sua parte, podem conter resíduo de cobre, o que faz mal ao organismo.
— Conhecemos os riscos de cada produto, avaliamos cada um deles e distribuímos nossos esforços de fiscalização e controle com isso em mente — afirma o diretor do Dipov, alertando que as empresas clandestinas devem ser denunciadas para que possam ser fechadas. — A tributação sobre s bebidas alcoólicas, por exemplo, é muito alta e, por isso, há muitas clandestinidade. As ações acontecem também com o auxílio da Receita Federal e de órgãos de saúde.
 Não há produto estéril. A exceção é o leite longa vida, o UHT, devido ao processo industrial pelo qual passa, mas mesmo ele, não está livre de uma contaminação ou fraude, como se viu recentemente no Rio Grande do Sul:
— O que é preciso é estabelecer pontos de controle na indústria, seja ela grande ou pequena, com limpeza de equipamentos e utensílios. Não adianta adotar uma série de práticas e colocar um produto num tanque contaminado. Além disso, há outras potencias fontes de contaminação, como microfuros nas embalagens, que não são perceptíveis ao olho humano, mas que permitem o desenvolvimento de fungos ou bactérias.
Bonnet, que também é pesquisador da Embrapa e coordena o MBA em Gestão da Qualidade e Segurança dos Alimentos da Universidade Veiga de Almeida, a fiscalização tem o importante papel de mostrar ao consumidor que uma determinada empresa está conforme os padrões de qualidade.
— A evidência é muito importante para o consumidor. E se algo der errado, se houver um problema, o atendimento ao consumidor é muito importante. O registro do cliente também é crucial para que uma empresa possa cobrar ou rastrear sua rede de distribuidores. Quem não registra seus problemas não está ajudando nem as empresas nem a si mesmo, gerando um círculo vicioso. A responsabilidade é de todos. O consumidor também tem que ser um fiscal.
Os produtos prontos e semiprontos também estão muito sujeitos a contaminações. Para avaliar e controlar tal risco, o Mapa está implementando, desde 2009, um modelo utilizado internacionalmente que tem o objetivo de gerar estatísticas que permitam controlar com mais segurança os focos de risco.
— No caso das carnes e produtos prontos e semiprontos, como embutidos e frios, buscamos bactérias, identificamos os riscos para o consumidor e verificamos como a empresa age para garantir a segurança e qualidade do que comercializa. Isso permite avaliar o desempenho de cada uma. Nas salsichas, identificamos a prevalência da bactéria listeria e começamos a gerenciar este elemento — explica Ari Crispim, coordenador de Programas Especiais do Mapa.
E já há dados que permitem ações para a imposição de procedimentos que garantam a qualidade. Segundo Crispim, fatiados vendidos já embalados, por exemplo, são mais propensos à contaminação do que os produto comercializados em peças inteiras. Por isso, eles têm que ser mais controlados e fiscalizados:
— Queremos reduzir a exposição dos consumidores a perigos veiculados pelos alimentos. A atenção maior, num primeiro momento, foi sobre os produtos prontos para o consumo, pois levam o perigo diretamente à mesa do brasileiro. Os próximos produtos a entrarem no modelo de gerenciamento de risco, ainda este ano, são as carnes bovina, suína e de aves. Em até quatro anos rastrearemos 40 famílias de produtos.
Esse sistema de monitoração e avaliação de risco dos produtos, afirma Crispim, pode gerar critérios de valorização com base nas características e garantias de qualidade. E isso poderá nortear as escolhas do consumidor na hora de fazer uma compra.
Produtos no fundo das geladeiras dos mercados são mais seguros
A doutora em alimentos e nutrição e professora da Unisantos Elizabete Lourenço da Costa lembra que o problema num produto pode ser provocado por armazenamento inadequado e que o varejo tem responsabilidade nesses casos.
— As falhas também estão nos varejistas. As geladeiras de frios e iogurtes, por exemplo, são abertas e, assim, não conseguem manter a temperatura do alimento. Neste caso, a dica é pegar os produtos que estão no fundo pois mantêm a temperatura mais perto da ideal — diz Elizabete.
Os produtos perecíveis, por exemplo, devem ser adquiridos no fim da compra para reduzir a exposição à temperatura inadequada e evitar sua deterioração devido a má conservação.
Como falha não intencional, mas que gera defeitos nos produtos que chegam ao consumidor, Bonnet cita o pão de forma produzido em uma padaria de bairro. O pão sempre mofava. A causa era simples: a área de refrigeração era inadequada, pois havia excesso de condensação de água no local, gerando o bolor. Bastou mudar o espaço, colocando por exemplo um exaustor, para que o problema acabasse.
— Muitas vezes, os problemas e defeitos nos alimentos chegam até nós por falta de informação do produtor. Não por má-fé —acredita o especialista, que ensina um macete. — E o consumidor deve sempre guardar pães quentes em embalagens abertas, de forma a evitar o aumento da umidade no interior da embalagem que pode levar ao crescimento de microrganismos
Embalagens amassadas ou enferrujadas, de maneira geral, não devem ser adquiridas, pois tais danos aumentam o risco de contaminação por microrganismo, diz Bonnet. E ao observar indício de contaminação de um produto, ele não deve ser consumido. Quanto às frutas e hortaliças, o especialista destaca a importância de serem higienizadas antes do consumo, para retirara o acumulo de microrganismo que podem ser levados ao prato e também contaminar à cozinha.
Série “Insegurança à mesa”

DOMINGO: Qualidade de alimentos em xeque no país
SEGUNDA-FEIRA: Na busca por qualidade, consumidor tem papel importante
TERÇA-FEIRA: Falta de tudo um pouco para garantir segurança à mesa do brasileiro
QUARTA-FEIRA: Por querer ou sem querer? As diferenças entre fraude e falha de produção
ONTEM: Quem fiscaliza o quê na cadeia de produção de alimentos



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