A virologista francesa Françoise Barré-Sinoussi, 61, uma das vencedoras do Prêmio Nobel de Medicina deste ano, elogiou a política do governo brasileiro de distribuição gratuita de medicamentos contra a Aids. "Em nível internacional, as iniciativas do Brasil são louváveis. O país lutou muito para defender a utilização dos genéricos", disse a cientista.
O Brasil defende a quebra de patentes de medicamentos usados no tratamento da doença, baseando-se nas diretrizes da OMC (Organização Mundial do Comércio). "O Brasil deu o exemplo", acrescentou Barré-Sinoussi, durante uma coletiva de imprensa na sede da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), em Paris.
Barré-Sinoussi divide o Nobel com seu ex-chefe, Luc Montagnier, 76, pela descoberta do HIV, em 1983.
Montagnier lembrou, no entanto, que o país possui muitos doentes "não-declarados". "A questão da prevenção e do tratamento também é cultural. Muitas pessoas não querem saber se têm o vírus e se recusam a fazer o teste. Por isso é preciso calcar os esforços em vigilância, pesquisa e prevenção."
Montagnier disse esperar que, apesar do contexto econômico desfavorável, o prêmio sensibilize governo e empresas, atraindo novos financiamentos. "Nosso trabalho não está terminado. Ainda não temos uma vacina para prevenir a infecção ou uma para lutar contra ela. Este prêmio nos encoraja a ir até o fim", afirmou.
O virologista é um defensor da vacina terapêutica, que poderia ser uma alternativa aos pacientes que desenvolvem resistência ao tratamento com drogas antirretrovirais. Ele voltou a afirmar que é possível obtê-la dentro de dois ou três anos. Isso se os testes clínicos nas fases 1 e 2, ainda não iniciados, forem bem-sucedidos.
Barré-Sinoussi, entretanto, disse à Folha que não há previsões para o lançamento de uma vacina. "Houve muitas tentativas, muitos fracassos. É preciso ter um certo distanciamento e entender a importância de retornar à pesquisa básica, que envolve virologia e genética, para entender ainda melhor o funcionamento do vírus."
Os esquecidos
Na França, a grande polêmica na atribuição do Nobel 2008 girou em torno da ausência do pesquisador Jean-Claude Chermann. Ele fazia parte da equipe de Montagnier e Barré-Sinoussi na época em que o vírus foi descoberto, no Instituto Pasteur.
Questionado sobre o assunto, Montagnier respondeu que "infelizmente só havia três vagas para o Nobel, e uma delas foi ocupada por Harald zur Hausen [alemão que descobriu a ligação entre o vírus HPV e o câncer]". "Mas este prêmio vai para toda a equipe que participou deste trabalho."
O virologista francês também colocou um ponto final na polêmica envolvendo o pesquisador americano Robert Gallo.
Durante uma década, Gallo e Montagnier brigaram juridicamente pela autoria da descoberta do HIV. Gallo teria se apropriado de amostras enviadas pelos franceses --acusação nunca comprovada.
Mas o americano teria identificado o microrganismo como causador da Aids. A história terminou com um acordo entre os governos francês e americano, em 1987, dividindo os royalties do teste anti-HIV entre os dois países. Para Montagnier, a contribuição de Gallo é inegável. "Eu mesmo liguei para o Gallo e o parabenizei", declarou. Ontem, ele foi recebido pelo presidente Nicolas Sarkozy no Palácio do Eliseu, sede da Presidência francesa.
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