6.02.2010

Sentir cólicas fortes não é normal

Dores menstruais, que impedem a mulher de manter as atividades do dia a dia, podem ser sinais de endometriose. Doença pode aparecer na adolescência. As dores no período menstrual foram vistas sempre com preconceito ao longo da vida da empresária Luana Saraiva, hoje com 30 anos. “Cansei que ouvir de professoras que elas também sentiam cólica todo mês, mas nem por isso faltavam ao trabalho como eu deixava de ir à aula”. O que elas não entendiam é que o que Luana sente desde a adolescência era mais complexo e grave. Desde a primeira menstruação, aos 9 anos, passava mal, desmaiava, tinha fluxo intenso, dores fortes, inclusive ao evacuar e urinar. “Aos 14 anos a situa­ção estava insustentável, já tinha procurado vários médicos, mas só anos mais tarde descobri que tinha endometriose.”

Luana é uma das 6 milhões de brasileiras (10% a 15% das mulheres em idade fértil) que, segundo a Associação Brasileira de En­­do­metriose (SBE), sofrem da doença que atinge a cavidade fora do útero. Uma das explicações para a causa do problema é que ocorreria, por meio das trompas, um refluxo do endométrio (tecido liberado por meio da menstruação), causando a implantação anormal desse tecido em outras regiões, como trompas, ovários, bexiga, intestino e pelve.

Em adolescentes, as dores incapacitantes associadas a outros sintomas como os de Luana, devem ser um dos primeiros sinais de alerta para pais e os próprios médicos, afirma o ginecologista do Hospital Sírio Libanês, João Dias, membro da SBE. “É comum a queixa de cólicas menstruais, que melhoram e desaparecem com analgésicos. Nas portadoras de endometriose as dores são intensas, não passam com medicamentos, causando incapacidade funcional, como falta à escola ou ao trabalho”, afirma.

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Veja mais dicas sobre a endometrioseEm alerta
Quando a adolescente deve procurar um ginecologista para uma avaliação sobre endometriose:

- Quando tem dor. Na maioria das vezes, a cólica é fisiológica, acontece com o processo de contração do útero a partir de uma substância liberada durante a menstruação. Estima-se que 40-60% das adolescentes tenham dor menstrual.

- A diferença entre a dor fisiológica e a causada por endome­triose está na intensidade. As cólicas que levam a faltas às atividades corriqueiras, como aca­de­­mia, devem ser relatadas a um gine­cologista.

- Quando a adolescente é ansiosa. Alguns indícios sugerem que mulheres com alto grau de estresse e ansiedade estão propensas a desenvolver a doença. Ela também estaria relacionado a fatores imunológicos: quanto maior o estresse, menor a imunidade, que é a responsável em criar defesas contra diversas doenças.

- A adolescente que menstruou muito cedo, tem enjôo e vômito e fluxo menstrual muito intenso deve ser avaliada por um ginecologista. Outro alerta é para aquelas jovens nas quais o tratamento das cólicas com pílulas contraceptivas não surtem efeito na melhora dos sintomas.

Fontes: ginecologistas João Dias e Maurício Simões Abrão.
A doença pode progredir lentamente até a idade adulta, quando o comprometimento dos órgãos pélvicos poderá ser acentuado. Pesquisas internacionais, segundo o ginecologista Simões Abrão, que dirige o setor de Endometriose do Hospital das Clínicas da Univer­sidade de São Paulo e presidente da SBE, indicam que 70% das adolescentes com cólicas incapacitantes que não melhoram com analgésicos e anti-inflamatórios po­dem ter a doença. “No Brasil fica em torno de 50%.”

Com base nesses números, a SBE mantém uma campanha permanente para que pais, pacientes e médicos fiquem atentos aos sintomas. Estudo brasileiro apresentado no Congresso Mundial de En­do­metriose, em 2008, mostrou que o período entre o início dos sintomas, o diagnóstico da doença e o tratamento é de oito anos. Quando a queixa de dor começa na adolescência, esse intervalo aumenta para 12 anos. “Nesse período, é possível o surgimento de problemas intestinais e infecções urinárias, levando à piora da qualidade de vida”, afirma Abrão.

Por isso, aumentar o conhecimento das mulheres é muito importante. “Em muitos casos, o diagnóstico tardio pode causar infertilidade. Isso acontece quando há acometimento das trompas, órgão que conduz o óvulo ao útero, além se associar a alterações hormonais e imunológicas que dificultam a gestação.

PREVENÇÃO

Tratamento depende de abordagem correta

A melhor prevenção é a mulher ficar atenta à dor, seja durante a menstruação ou nas relações sexuais, e procurar um médico ginecologista. O diagnóstico é clínico, considerando os sintomas, e complementado por exames por imagem, como ultrassom transvaginal e ressonância magnética. Segundo Abraão, no Brasil foram desenvolvidos métodos mais eficientes de usar o ultrassom, preparando a paciente com o uso de laxantes, para se diagnosticar formas mais agressivas da doença.

Endometriose não tem cura, mas pode ser tratada cirurgicamente, por meio de videolaparoscopia ou com medicações que bloqueiam a produção dos hormônios femininos.

Apesar de ser uma das doenças mais estudadas na atualidade, o que acontece é um número repetitivo de cirurgias. Mas, para o especialista, isso acontece porque a abordagem do tratamento, em muitos casos, não é a mais correta. “Tenho observado que as ações relacionadas à doença melhoraram muito nos últimos cinco anos.”

Se houver ainda dificuldade para engravidar e desconforto nas relações sexuais é preciso investigar, pois podem ser sintomas de endometriose, doença que acomete quase 5 milhões de mulheres no Brasil

São Paulo, junho de 2008. Considerada pelos médicos como uma das doenças ginecológicas benignas mais freqüentes entre as mulheres jovens, a endometriose é caracterizada pela presença de células do endométrio - tecido que cobre a camada interna do útero - fora da cavidade uterina e acomete cerca de 10% a 15% das mulheres no menacme (período reprodutivo).

A endometriose foi relatada pela primeira vez no início do século passado (1917), no entanto, sua importância e o diagnóstico correto vêm crescendo nos últimos 15 anos. O diagnóstico é feito através do quadro clínico (sintomas específicos), de exame físico ginecológico adequado (toque vaginal), exames de imagem (como ultra-som trans-vaginal e ressonância nuclear magnética da pelve) e, finalmente, confirmado pela cirurgia laparoscópica, realizada por meio de pequenas incisões.

Entre os sintomas mais importantes, destacam-se as fortes cólicas menstruais, dores nas relações sexuais, dor pélvica crônica e infertilidade. O ginecologista Giuliano Borrelli, alerta que dores na região pélvica e cólica menstrual freqüente são, muitas vezes, os primeiros sintomas da endometriose. "Mas também dores para evacuar e sangramento nas fezes que aparecem ou pioram no período menstrual podem sinalizar o acometimento intestinal da doença, forma mais severa e de difícil tratamento", afirma o doutor. Da mesma forma que agride o intestino, pode também atingir outros órgãos como bexiga, vagina, colo do útero e ligamentos uterinos.

São conhecidas três formas diferentes de apresentação dessa doença: a primeira delas é a endometriose ovariana, que se caracteriza pela formação de cistos nos ovários (endometriomas). Essa variedade pode estar associada à infertilidade, porém, raramente é causa de dor importante. É considerada pelos médicos como a forma mais comum e que, na maioria das vezes, dependendo do tamanho, deve ser tratada cirurgicamente por meio da remoção dos cistos.

As outras formas de apresentação são a endometriose superficial, em que ocorre uma invasão de até 0,5cm de profundidade no peritônio de órgãos como bexiga, intestino, colo uterino; e a profunda, que infiltra 0,5cm ou mais o peritônio desses órgãos. Nesse último estágio os sintomas são mais exuberantes e os tratamentos cirúrgicos mais complexos. No caso do acometimento profundo do intestino, por exemplo, pode ser necessária a remoção de um segmento intestinal para o tratamento adequado.

Nenhum tratamento pode curar definitivamente a endometriose, a não ser a retirada de ambos os ovários, o que teoricamente acabaria com a fonte hormonal que mantém a doença ativa e faz proliferar os focos de endometriose. No entanto, este procedimento não é muito adequado para a grande maioria das portadoras da doença, que são jovens e sofreriam conseqüências danosas com a falta de estrogênio causada pela ausência dos ovários.

"Não existe cura para endometriose, é importante que as pacientes portadoras sejam diagnosticadas e tratadas precocemente antes que a doença atinja suas formas mais agressivas", afirma Borrelli. "É possível controlar os sintomas através de tratamentos clínicos e cirúrgicos, melhorando muito a qualidade de vida dessas jovens mulheres, mas, para isso, as pacientes devem ser acompanhadas por profissionais capacitados e treinados", completa o especialista.

Ao perceber qualquer um dos sintomas descritos acima, a mulher deve procurar um ginecologista especialista, com a finalidade de fazer investigação adequada e, principalmente, o diagnóstico precoce, para que possa ser corretamente orientada e tratada.

Dr. Giuliano Borrelli
Ginecologista do Hospital San Paolo, formado pela Faculdade de Ciências Médicas de Santos. Especialista em Ginecologia e Obstetrícia e pós-graduando na área de endometriose no Hospital das Clínicas da FMUSP.

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