Em entrevista ao 247, o publicitário conta ter testemunhado durante o exílio na Europa, durante a ditadura militar, tenebrosas transações protagonizadas por Miguel Arraes, que se envolveu em um confronto com seu assessor no governo de Pernambuco, Silvio Lins, por causa de 3 milhões de dólares oriundos de negócios de petróleo do governo argelino com o Brasil; ele também conviveu com o senador Aloysio Nunes, que era representante de Marighella na Europa; o autor da biografia "Minha vida de terrorista" afirma que Temer "é uma figura transitória... ainda mais fazendo essas bobagens", como as nomeações de ministros como Alexandre de Moraes, e critica o lema "Ordem e Progresso": "Pior que 'Pátria educadora'"; após a perícia do Senado, diz ele, "o impeachment não existe mais " e "é capaz de ela voltar"
Ele também conviveu com o atual senador Aloysio Nunes Ferreira, que era então representante de Marighella na Europa. Nessa entrevista exclusiva ao 247, o autor da biografia “Minha vida de terrorista” também narra como caiu em desgraça com dirigentes cubanos por causa de uma frase e como sua namorada ficou praticamente presa em Cuba durante o treinamento militar. Ele também afirma que Temer “é uma figura transitória... ainda mais fazendo essas bobagens”, como as nomeações de ministros como “Alexandre de Moraes, cujo ‘physique du role’ lembra o dos militantes do CCC e de Raul Jungmann, um brilhante orador” e critica o lema “Ordem e Progresso”: “Pior que ‘Pátria educadora’”. Depois de ter sido provado pela perícia que as pedaladas fiscais não foram assinadas por Dilma ele arrisca dois palpites, do alto dos seus 87 anos: “o impeachment não existe mais “ e “é capaz de ela voltar”.
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Você participou de que ações na ALN?
Uma vez formamos uma caravana de carros que se reuniram na praça do estádio do Pacaembu...para roubar dinamite...
Quantos carros?
Entre cinco e dez, não sei... e como eu tinha o carro mais vistoso, o comandante da operação foi comigo... que era o Marquito... logo depois foi assassinado... e um dos carros... era do Modesto Carvalhosa...ele emprestou pra Ana Corbisier que foi lá pedir um carro pra ele...ele nem sabia pra que...
Participou sem querer...
Era um fusquinha, num fusquinha só cabia uma caixa de dinamite...eu protestei, eu também tinha um jipão onde caberia toda a dinamite, não precisava fazer o espetáculo...
Como vocês entraram no paiol?
Era uma fábrica. O Marquito entrou dando um tiro pro ar. Só tinha operário. Eles ajudaram a carregar a dinamite nos carros.
Assustadíssimos?
Não sei se estavam, eu fiquei mais pra trás.
Essa dinamite foi usada aonde?
Ah, isso eu não sei... eles usavam...e ficou tudo guardado na minha garagem...Me deram a instrução que a cada dois dias eu tinha que ir lá e virar as caixas, se não virasse havia risco de autocombustão.
Tinha muitas caixas?
Tinha. Um dia, o Toledo (Joaquim Câmara Ferreira) apareceu, pediu o jipão, carregou a dinamite e foi embora. Não sei onde ele levou...
O que é que a ALN explodiu?
Teve uma vez que nós saímos de noite no meu carro, não me disseram onde é que nós íamos, eles estavam muito excitados, armando as pistolas no carro, eu sei que fomos até à Vila Prudente. Era tarde da noite, rua escura e nós passamos em frente a um pátio da polícia onde tinha várias rádio-patrulhas que a Ford tinha acabado de entregar para a polícia. E então eles jogaram a dinamite lá, por cima da grade e fomos embora. De longe eu ouvi a explosão.
Jogaram a dinamite do carro mesmo? Acenderam o pavio ou jogando ela explode sozinha?
A gente conhece do cinema... tem que acender...
Mas que aventura, hein! Quanto tempo durou a tua aventura?
Talvez um ano... eu estive refletindo agora que você começou a conversar...uma coisa que eu ganhei com essa experiência é uma imunidade ao patrulhamento...eu já fiz o suficiente na vida para ninguém me cobrar “você é isso, você é aquilo”...Não interessa. Eu nem sei o que eu sou. Sou cidadão do mundo. Você, o que é que você é?
Eu sou ucraniano...você fala em termos de...
Ideologia...
Eu sou de esquerda porque não sei conviver com gente de direita...
Também eu...
Fui preso em 73 no DOI-Codi, mas não era de nenhuma organização...eu não tinha disciplina pra isso...
Te torturaram?
Não. Tinha muita gente pra torturar e eu não era conhecido de ninguém, então não tinha informações pra dar. Na época você nunca tinha ouvido falar da Dilma?
Nunca.
Qual era o teu codinome?
Martins.
E quando você fugiu do Brasil com que nome foi?
Henrique Rosman. Eu estava lendo um livro do Kafka, guardado numa casa de amigos... tinha que passar o tempo, estava lendo acho que “América”... e tinha esse camarada chamado Rosman...então, inventei essa identidade... e quando fui pra Alemanha, fui visitar minha tia que me adotou e tal, eu disse pra ela que tinha problema de documentos, mostrei pra ela o documento em nome de Rossman e ela disse: “mas por que você não inventou um nome melhor”? Era preconceito, porque é um nome judeu.
Na Europa você não era Carlos Knapp?
Eliane e eu nos sentíamos muito vulneráveis por estar cruzando fronteiras com passaportes toscamente falsificados. Araújo Neto nos levou para falar com o embaixador brasileiro na Piazza Navona, Roma e nós, alegando perda ou roubo de nossos passaportes, apresentamos as carteiras de identidade que havíamos preparado em São Paulo com a ajuda de Juca Kfouri. Apresentamos também a declaração de perda que tínhamos feito na polícia romana. Durante meia hora de conversa social com o embaixador, os passaportes foram expedidos. Saímos da embaixada levando no bolso passaportes legítimos expedidos para as identidades falsas de Ane Marie e Henrique Rosman. Foi uma ação providencial, tivemos que viver alguns anos com esses nomes. Eliane só recuperou a identidade quando obteve passaporte francês.
Quer dizer que primeiro você foi pro Uruguai e depois pra Europa?
Foi um dominicano que me levou...de carro... dois dominicanos... a Eliane foi depois... foi o Paulo de Tarso Wenceslau que a levou...ele era o nosso guarda-costas e tal...funcionava muito bem. Então, nós viajamos com passaportes falsos. Ficou aquela preocupação. Nós temos que transitar por aqui...já estávamos em Roma, em Roma ela pegou a senha na embaixada da Tchecoslováquia pra ir pra Cuba... ela já estava em boas mãos... mas eu tinha que arranjar uma identidade...então, quando o Araújo nos levou pra embaixada o documento que eu apresentei foi a carteira de identidade feita no Brasil... eu passei a ser Henrique Rosman...a Eliane era Madame Rosman...Quando eu já tinha emprego em Londres, fui trabalhar numa editora, o Pedro Paulo Popovic e o Fernando Gasparian que me arranjaram esse trabalho e eu não podia entrar com falsa identidade na Inglaterra, que era um país sério...era naquele tempo... fui dar o golpe do passaporte perdido na Tunísia, não funcionou...e então o Peralva, que trabalhava na Deutsche Welle conhecia o Lorenzo Fernandez, que era o cônsul brasileiro em Roterdam...e mandou falar com o cônsul... eu fiquei muito preocupado...o Peralva disse: vai na certeza, porque ele faz questão de ajudar brasileiros. Então, recuperei minha identidade e fugi de Roterdam, peguei o primeiro trem, nem sabia pra onde ia, porque eu estava numa zona de risco, ele podia chamar a polícia...a gente fica maluco...foi com esse documento que eu entrei na Inglaterra, meu nome foi logo pra lista telefônica e tal...e depois consegui passaporte alemão, porque meu pai era alemão...a Eliane continuava com passaporte falso, não tinha como...e o pai dela, que era russo, que fugiu da revolução e foi pra Paris menino... era naturalizado francês, mas não tinha passaporte francês, não tinha nada...achei os documentos dele no ministério da Agricultura e reconstituí o passaporte dele e assim consegui o passaporte pra Eliane e para o Marcos, filho dela. Deu tudo certo.
Mas pra Cuba você não quis ir?
Eu cometi um erro crasso. Quando nós chegamos em Paris foi uma festa, ficamos num apartamento onde estava a Ana Corbisier...que era sobrinha dos Mesquita do Estadão... o Itoby...Itoby Corrêa, que era nosso companheiro... a gente chamava ele de gazeta da esquerda, porque ele ia de casa em casa contando as fofocas...por que eu falei dele mesmo?
Você chegou em Paris, estava num apartamento...
Mas por que eu falei isso?
Você disse que cometeu um erro crasso...
Ah, é. A gente passou a noite jogando baralho. E sempre discutindo se nós devíamos ou não ir pra Cuba. A Eliane fechou questão: eu vou pra Cuba. Mas eu fiquei naquela... eu disse: eu não sei... não tem sentido... eu vou fazer o que em Cuba? Marighella falou que era pra descansar... eu tô farto de descansar...aí, em vez de dizer “eu não sou guerrilheiro” eu disse “eu não sou revolucionário”. Isso ficou marcado na minha ficha, sabe? Aí os cubanos não queriam dar licença para eu chegar em Cuba. Disseram que eu tentei vender o passaporte...a senha...
Você virou suspeito por causa dessa frase?
E quem repetiu essa frase lá em Cuba ou foi a própria Eliane ou foi o Itoby ou pode ter sido o... sei lá! E ela foi. Foi muito dura a nossa separação. Mas ela foi na certeza de que daí a dois meses ela estava de volta. Levou nove meses!
Ficou praticamente presa em Cuba?
Os companheiros ou os cubanos inventaram uma mentira para enganar Eliane, para fazê-la desistir de mim. Disseram-lhe que eu tinha chamado minha ex-mulher e filhos para viver comigo na Europa. Eu desconhecia essa intriga, só vim a saber dela ao me reunir com Eliane meses depois. As cartas que eu escrevia contrariando mentiras como essa eram censuradas, isto é, ela nunca recebeu.
Censuravam as tuas cartas?
Mesmo as que o Itoby levava... ele ia e voltava... o Aloysio Nunes Ferreira também...o Aloysio era nosso companheiro...
Ah, ele também estava lá?
Ele era representante do Marighella.
O Aloysio?! E agora, o que você está achando dele? Ele virou um pittbull da direita...
Eu não gosto de colocar rótulos assim...eu não sei o suficiente...
Eu já vi intervenções dele pela TV Senado... intervenções furiosas... “a Dilma tem que sangrar”...ele já disse isso...
Aquilo é um teatro...
Teatro de horror! Que nível está esse Senado! Tem um senador lá que se vangloria porque nunca passou no vestibular...se orgulha de ser burro...
Tem vários assim. E essa é a elite do Congresso... porque o resto...
Só falta o Incitatus lá.
Agora, também é verdade que todos os Parlamentos são mais ou menos nesse nível. Porque são representação direta do povo. Eu tenho um conceito que é muito de direita: eu acho que assim como você tem que ter carteira de motorista pra conduzir o carro tem que ter um título pra representar o povo.
E você se dava bem com o Aloysio?
Nós não nos víamos muito mas tínhamos uma relação cordial. Ele trabalhava no IRFED, um instituto de pesquisa ligado ao PC que sustentava uma grande parte dos exilados brasileiros e fazia pós- graduação na Sorbonne. Ele era sustentado pela família.
E mandavam grana pra ele?
Um dos poucos, um dos únicos que trabalhava pra sobreviver era eu. E eu era mais velho que todos. Alguns tinham profissões que não dava pra trabalhar. Um cara era professor de Geografia do Brasil...o que é que ele ia fazer na Argélia?
E o Arraes, como se mantinha lá?
Ele ganhou 1,5 milhão de dólares, dinheiro de 1972...vendendo petróleo argelino pro Brasil...
Era lobbysta?
Ele não, mas o Silvio Lins, que tinha trabalhado com ele no governo de Pernambuco mandava numa trading que usava da proximidade do Arraes com o governo argelino... por isso a Sonatrach conseguia vender petróleo pro Brasil...o Arraes não aparecia, mas ele também chefiava uma organização política, que não era de luta armada, chamada MPL. Então, era só de pessoas ilustres da política daqui, sacerdotes, sei lá, que formavam esse clube, que tinha o propósito de combater a ditadura, derrubar a ditadura, mas por meios pacíficos, então o pretexto de fazer negócios e conseguir dinheiro era alimentar esse MPL, dar dinheiro para ele fazer as coisas. Eu já estava em Paris quando tive notícia de que a venda de petróleo argelino ao Brasil tinha rendido 3 milhões de dólares em comissões. Houve então uma briga pelo talão de cheques entre Arraes e Silvio Lins, A briga foi tal que Arraes denunciou Silvio Lins ao governo argelino por corrupção e contrabando.
O Arraes entregou o Silvio Lins?! E ele foi condenado?
Naquele momento, a empresa Intrade estava com os 3 milhões de dólares de comissões em caixa. Silvio foi preso. Seus companheiros acionaram relações, até o arcebispo de Argel foi falar com o presidente Boumedienne. Conseguiram tirar Silvio da cadeia e o embarcaram imediatamente para Paris, ele nunca mais voltou à Argélia. A denúncia de Silvio Lins por Arraes foi um tiro no pé porque, se Silvio fosse condenado por contrabando e corrupção, o próprio Arraes e toda a cúpula do partido, o FLN, também deveriam ser condenados, uma vez que eram coniventes. Parece que o próprio partido intermediou, depois, as negociações entre Arraes e Silvio. Foi feita uma partilha, um milhão e meio para cada um. Arraes recebeu a sua parte em prestações mensais, à medida que a Intrade recebia suas comissões.
Miguel Arraes era então um coronel de esquerda?
Ele tinha todos os preconceitos de coronel, tinha postura de classe dominante, a família dele eram todos frequentadores das melhores escolas.
E era um cara inteligente?
Ele falava pouco. Ficava quieto nas reuniões, não dizia nada, ninguém sabia o que ele pensava. E eu descobri que ele não pensava nada. Ele tinha carisma de líder não sei como. Eu conheci o Arraes aqui em São Paulo, na casa do Marcos Pereira, que representava o movimento de cultura popular do Nordeste no sul do país. A partir daí ele se encaminhou para os discos. O Marcos era um querido amigo meu. Então, quando eu cheguei em Argel eu já conhecia o Arraes. Não conhecia a irmã dele, que era uma espécie de embaixadora brasileira dos exilados.
Violeta Arraes. O Guel Arraes da Globo é filho dele?
Filho. Era um menininho. Estava lá também.
Depois da Eliane você teve outras mulheres?
Eu casei oito vezes. É que eu sou muito fiel. Eu acredito no casamento. Eu nunca pulei a cerca. Descobri que as mulheres são muito parecidas e você está sempre procurando a mesma mulher. Depois eu percebi que o erro era meu, não delas. Uma vez eu me apaixonei pela irmã do Chico. A Miúcha. Cantava no João Sebastião Bar. Mas ela nunca soube que eu me apaixonei por ela.
Oito mulheres. Quase empatou com Vinicius, que teve nove. Mas você está inteiro ainda, pode ganhar dele.
Já estou caquético! Não dá mais! Agora tô feliz.
Sozinho?
Sozinho. Vou te mostrar algumas coisas que escrevi. “Manual do tradutor dinâmico e outras mistificações”... “O Sumiço do Mundo”...
Você disse que estava procurando uma editora para “O sumiço do mundo”. Mas já está editado.
É uma editora universitária...
Bela edição... capa dura...
O editor fazia edições só de Geologia... era geólogo. Vendia nas universidades. O livro do sambista... como é o nome dele?...o intelectual...?
Paulo Vanzolini?
Ele editou um livro grandão, com toda a obra dele. Vendeu quatro mil exemplares na universidade... não vende nas livrarias...e eu convenci ele a fazer literatura...paguei também. Dois mil exemplares. Aí, ele morreu. Editamos e não chegamos a distribuir. Esse aqui (“Manual do tradutor dinâmico”) é muito hermético. É mais um livro pra ler no banheiro.
No colégio eu me apaixonei pela filha do Paulo Vanzolini. A Maria Eugênia. Depois ela virou namorada de um amigo meu, o Paulo Caruso. Irmão do Chico. Fiz o “Bar Brasil” com ele.
Você desenha?
Não, eu fazia o texto.
Eles são ruins de texto.
O Chico é melhor que o Paulo.
Esse aqui é outro livro que eu publiquei... não posso te dar porque só tenho esse...”Um filme americano – e seis histórias para boi acordar”...esse é um livro de contos...de um dos contos eu quis fazer um filme de um minuto e não consegui. Era assim: um parque público, domingo de sol e lá no fundo do quadro tem dois velhinhos conversando num banco de jardim. A câmera vai se aproximando, tem o canto dos passarinhos e tal, até que quando chega suficientemente perto a câmera para de espanto. São ex-torturadores contando barbaridades como “eu enfiei um ratinho na boceta dela”... como dois garotos que contam vantagem um para o outro...Eles saem da cena, cruzam com um carrinho de bebê com uma moça bonita, cumprimentam com muita educação, agradam o bebê e acaba o filme. O título é “Aposentados”. Esse aqui é outro projeto... eu sou o campeão de não conseguir emplacar as coisas! É uma maquete, é uma “boneca” pra tentar vender. “Novo corpo humano – 13 propostas”. É um apelo com 1 milhão de assinaturas para Deus mudar o corpo humano. Dois corações. Cinco membros. Dedos para digitar. Reprodução ovípara.
Você nunca publicou isso?
Não. Tentei...
Por que os editores são tão burros?
Deus fez a gente com dois olhos, dois pulmões, dois rins e um coração só e nós dependemos dele! Em Londres eu tentei vender pro Monthy Pyton uma história de sequestro de cachorros de estimação. Aqueles que relutavam em pagar o resgate eles mandavam um pedacinho do rabo e pronto eles já pagavam o resgate.
Você conheceu quem do grupo?
O Richard Taylor, que era documentarista da BBC, onde eu trabalhei, levou o roteiro para eles. Eu não falei com eles. Um deles, não sei qual deles, falou: achamos a ideia ótima – e então ele abriu uma gaveta e falou – aqui dentro estão ideias nossas que nós não conseguimos produzir... você acha que nós vamos pegar a ideia do outro??? Eu fui a Frankfurt. Agora os agentes literários viraram uma máfia. Eles têm um andar só deles e você só consegue entrar lá, passar pela portaria se tiver um “appointment”. Não consegui entrar. Então, mandei à merda.
Na época em que você estava exilado?
Não, foi recentemente, faz dois anos. Depois deixei com uma agente literária em Barcelona. Ela nem abriu. Essa gente é muito arrogante. Na minha época de Frankfurt eles eram office-boys.
Você é um grande autor desconhecido...
É que aqui é terra de cegos. Os cegos é que mandam.
É difícil emplacar uma coisa boa aqui. Merda emplaca fácil. Agora, coisa boa é complicado.
Merda todo mundo sabe fazer...eu tenho uma ideia também que eu vou trabalhar nela agora...porque as editoras todas são dirigidas por homens de marketing...por executivos... que zelam pela economia da empresa...então, eles rejeitam autor nacional...não querem saber... aliás, um editor brasileiro, numa viagem comigo pra Frankfurt, tomando uísque no avião ele me disse, já estava meio bêbado “eu odeio autor nacional”! Que que ele ia fazer em Frankfurt? Comprar negócio certo, comprar direitos de best-seller. Não tem risco.
Eles preferem o Paulo Coelho. Já viu coisa pior que Paulo Coelho? Já leu algum?
Não consigo ler.
Como é que ele vende milhões de livros?
No mundo todo...
Como é que ele consegue? Deve ser um pacto com o diabo.
Um dia eu recebi uma indenização do governo. Pensei: que que eu faço com esse dinheiro? Vou comprar uma livraria. Procurei o Ary da Nobel pra ver se ele tinha franchise. Ele mostrou as dele em algumas cidades do interior. Eu tinha algumas ideias pra vender livro. E aí fui ver as listas dos livros mais vendidos, era tudo auto-ajuda. Tudo auto-ajuda. Desisti. É isso que as pessoas procuram nas livrarias. Livraria é um negócio prostituído. Eu acho que esse mercado tinha que ser do estado.
Mas esse estado do Temer?! Pelo amor de Deus! Você viu quem ele colocou no ministério da Educação? Mendonça Filho. A primeira audiência foi com Alexandre Frota!
Não se preocupe... ele é uma figura transitória...ainda mais fazendo essas bobagens...
Cada ministro que ele escolheu!
Tenho particular desconfiança de Alexandre de Moraes, cujo “physique du role” lembra o dos militantes do CCC e de Raul Jungmann, um brilhante orador.
Eu não acho que nem Fernando Henrique, nem Lula, nem Dilma foram brilhantes. Mas, comparados com Temer são gênios! Não sei de que século ele veio! Parece alguém das cruzadas! É um cara antigo. Ele usa mesóclise. Ele fala “ao depois”.
Eu nunca vi ele falar...e a marca do governo que ele inventou?!
“Ordem e Progresso”! Caralho!
É muito pior do que “Pátria Educadora”!
Já era uma bobagem porque pátria não educa ninguém! Quem educa são os professores.
A pátria é múltipla.
“Pátria educadora”!
São essas cabeças de marketing...
Eu trabalhei na Secom em 2000, com o Alex Periscinoto...
Então estivemos cruzando porque em 2000...
Você estava lá na Secom em 2000?
Eu fui colega do Alex lá em Brasília...
Eu escrevia comerciais institucionais com ele...para as Forças Armadas... eles rejeitavam tudo o que a gente fazia... o Alex queria renovar esses comerciais tradicionais, mas eles não deixavam, queriam aquela coisa batida “a pátria precisa de você”...
Que mundo o nosso, não? Eu sempre fui cine-maníaco. Você vai ver que isso aqui (mostra o livro “O sumiço do mundo”) é um roteiro pronto. Quando eu era adolescente eu quis trabalhar de graça com o Alberto Cavalcanti. E teve um crítico de cinema da Folha que me barrou. Eu ia largar tudo e trabalhar de graça com o Cavalcanti! Eu tinha paixão por cinema! Eu ainda penso só em termos de imagem.
Você fez muitos roteiros de comerciais?
Muitos! Mas nada muito importante. Um dia eu mostro pra você. Um dia meus filhos invadiram a casa blindada pelo exército, onde eu morava, na rua Sofia e tiraram coisas minhas, por isso eu fiquei sabendo que o Exército retalhou todos os meus ternos...
Você está brincando! Fizeram isso???
Fizeram vandalismo. Invadiram a agência. Molecada. Eles pulam o muro, não sei o que. Então eu acabei recuperando alguma coisa que eu tinha.
Eles blindaram a tua casa? Como assim?
Tinha sentinela na porta o tempo todo. O dono da casa morava duas casas além...era quase vizinho...
Ah, tua casa era alugada?
No dia seguinte ao dia em que aconteceu ele ia indo pra casa e viu aquele ajuntamento de milicos e tudo o mais e um militar falou “circular, circular!”. “Eu não vou circular, não, essa é a minha casa”! “Então desce”! E prenderam ele. Era um italiano, gerente de uma companhia de seguros. Era assim. Eu é que não podia aparecer.
Você já estava na Europa?
Não, estava escondido.
Você viu que agora anularam as pedaladas? A perícia constatou que não tinha assinatura da Dilma, então como ela pode ser acusada de uma coisa que não assinou?
São duas e quinze. Tenho uma consulta. Tenho que passar no oculista e pegar os óculos.
Mas o que você acha dessas pedaladas?
Mas a perícia diz uma coisa e o TCU diz outra coisa?
Não, o relator das contas da Dilma também disse que não teve pedalada...e agora? Como é que fica? O impeachment tem duas acusações, mas uma delas não existe... é uma comédia! E os decretos? Eles passavam da meta fiscal, mas no fim do ano a meta foi aumentada, então couberam. Que crime é esse?
Então é capaz de ela ficar.
Que absurdo é esse??? E vem o Ricardo Noblat e escreve que “com pedalada ou sem pedalada, Dilma não volta”. Como é que os senadores podem votar numa coisa que todo mundo está vendo que não existe mais? É Kafka...
O sujeito foi assassinado... mas apareceu...
É o país do absurdo... e os senadores estão lá todo dia dizendo que os decretos provocaram essa recessão toda! Estão loucos! É meio impeachment...meio impeachment não existe... então não existe impeachment!
Não tem mais impeachment...
Você é acusado de dois crimes: você matou Fulano e Sicrano. Mas Fulano está vivo.
Mata um que você também vai pra cadeia...
Mas a pena tem que cair pela metade...e no impeachment então? Nem sei pra que tem impeachment na constituição. Isso é coisa de inglês.
Mas tem que ter uma hipótese de afastamento do presidente, tem que ter.
Mas não com essa redação. Uma coisa totalmente vaga... não pode descumprir a lei orçamentária...o que quer dizer isso?
Aí que vem toda essa discussão...
Como os políticos brasileiros não têm muita credibilidade...
Nenhuma...
O inglês é diferente do brasileiro. O Cameron perdeu o plebiscito e no mesmo dia renunciou. Se fosse aqui o cara ia pedir recontagem...o técnico da seleção inglesa também... perdeu da Islândia, renunciou na hora...
Você conhece a autora que escreveu... como é o nome do livro...? Ela historia as oito ou dez ocasiões em que uma sociedade inteira, ou um país inteiro atuam contra seus próprios interesses. “The march of folly”. “A marcha da loucura”. Começa na Guerra de Troia e termina no Vietnã. Mas um dos episódios narra como a Inglaterra perdeu a maior riqueza dela que eram os Estados Unidos. Uma burrice e autossuficiência deles. Eles impuseram um imposto que era injusto. Os americanos se revoltaram. Eles insistiram. Era o imposto do chá. Os americanos afundaram no porto um navio carregado de chá. Eles mandaram o exército. Todo fardadinho, bonitinho. E os americanos quase não tinham farda, eram franco-atiradores. E assim, de burrice em burrice eles perderam a coisa mais preciosa do império deles. Que era a América do Norte. O Canadá eles por pouco não perderam para os franceses. Mas eles continuam fazendo burrice até hoje. Esse Brexit foi uma burrice!
Total!
Agora eles vão perder a Escócia, a Irlanda e vão ficar com um reininho do tamanho da Suíça. Continuam fazendo burrada. É a arrogância deles! O império onde o sol jamais se põe...
Agora o império onde o sol jamais se levanta...eles conseguiram. Mas o Brasil é mais extravagante ainda! Não tem igual no mundo!
Não tem.
Eles conseguem piorar a cada governo.
E só pode piorar, porque a educação piora... a saúde piora... a injustiça social se agrava...então, a burrice só pode aumentar!
E esse Eduardo Cunha então? Ele já é réu duas vezes e está impondo condições pra renunciar! Só renuncia se fizer o sucessor.
É o quintal dele...
Você já viu uma coisa dessas? É réu, é denunciado, é delinquente e pra renunciar impõe condições?! E o Temer aceita.
O que o Cunha tem de trunfo?
Ele deve saber alguma coisa do Temer que nós não sabemos. Eu não entendo porque ainda não está preso. Ele apresenta todos os requisitos previstos no artigo 312 do Código Penal, que é o da prisão preventiva.
Daqui a alguns dias nós vamos saber... chegou no limite agora, não tem como...
Agora ele quer escapar da cassação com a votação do recurso na CCJ...parece vampiro... tem que enfiar uma estaca no coração...é caso único na história do Brasil...qual é o poder dele?
É uma figura de ficção, né?
O apelido dele é caranguejo, né? E existe na biologia o caranguejo-ladrão! Que adora roubar relógios e coisas brilhantes... joias...
Brasileiro?
Não existia aqui...rouba coco e relógios...
Tem um passarinho americano que faz isso também.
Em entrevista ao 247, o publicitário conta ter testemunhado durante o exílio na Europa, durante a ditadura militar, tenebrosas transações protagonizadas por Miguel Arraes, que se envolveu em um confronto com seu assessor no governo de Pernambuco, Silvio Lins, por causa de 3 milhões de dólares oriundos de negócios de petróleo do governo argelino com o Brasil; ele também conviveu com o senador Aloysio Nunes, que era representante de Marighella na Europa; o autor da biografia "Minha vida de terrorista" afirma que Temer "é uma figura transitória... ainda mais fazendo essas bobagens", como as nomeações de ministros como Alexandre de Moraes, e critica o lema "Ordem e Progresso": "Pior que 'Pátria educadora'"; após a perícia do Senado, diz ele, "o impeachment não existe mais " e "é capaz de ela voltar"
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