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12.20.2009
Discurso de Lula na Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP-15)
Discurso corajoso e emocionante de Lula na COP-15
Resistência da China ao monitoramento de suas emissões foi apontada pelo presidente francês, Nicolas Sarkozy, e pela secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, como um obstáculo para um acordo.
Confira na íntegra o discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, feito hoje durante sessão plenária de debate informal na 15ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP-15), em Copenhague.
"Senhor presidente, senhor secretário geral, senhores e senhoras chefes de Estado, senhores e senhoras chefes de governo, amigos e amigas.
Confesso a todos vocês que estou um pouco frustrado. Porque há muito tempo discutimos a questão do clima e cada vez mais constatamos que o problema é mais grave do que nós possamos imaginar. Pensando em contribuir para a discussão nesta conferência, o Brasil teve uma posição muito ousada. Apresentamos as nossas metas até 2020.
Assumimos um compromisso e aprovamos no Congresso Nacional, transformando em lei, que o Brasil, até 2020, reduzirá as emissões de gases de efeito estufa de 36,1% a 38,9%, baseado em algumas coisas que nós consideramos importantes: mudança no sistema da agricultura brasileira; mudança no sistema siderúrgico brasileiro; mudança e aprimoramento da nossa matriz energética, que já é uma das mais limpas do mundo, e assumimos o compromisso de reduzir o desmatamento da Amazônia em 80% até 2020.
E fizemos isso construindo uma engenharia econômica que obrigará um país em desenvolvimento, com muitas dificuldades econômicas, a gastar até 2020 US$ 166 bilhões, o equivalente a US$ 16 bilhões por ano. Não é uma tarefa fácil, mas foi necessário tomar essas medidas para mostrar ao mundo que, com meias palavras e com barganhas, a gente não encontraria uma solução nesta Conferência de Copenhague.
Tive o prazer de participar ontem à noite, até às duas e meia da manhã, de uma reunião que, sinceramente, eu não esperava participar, porque era uma reunião onde tinha muitos chefes de Estado, figuras das mais proeminentes do mundo político e, sinceramente, submeter chefes de Estado a determinadas discussões como nós fizemos antes (ontem), há muito tempo eu não assistia.
Eu, ontem, estava na reunião e me lembrava do meu tempo de dirigente sindical, quando estávamos negociando com os empresários. E por que é que tivemos essas dificuldades? Porque nós não cuidamos antes de trabalhar com a responsabilidade com que era necessário trabalhar. A questão não é apenas dinheiro. Algumas pessoas pensam que apenas o dinheiro resolve o problema. Não resolveu no passado, não resolverá no presente e, muito menos, vai resolver no futuro. O dinheiro é importante e os países pobres precisam de dinheiro para manter o seu desenvolvimento, para preservar o meio ambiente, para cuidar das suas florestas. É verdade.
Mas é importante que nós, os países em desenvolvimento e os países ricos, quando pensarmos no dinheiro, não pensemos que estamos fazendo um favor, não pensemos que estamos dando uma esmola, porque o dinheiro que vai ser colocado na mesa é o pagamento pela emissão de gases de efeito estufa feita durante dois séculos por quem teve o privilégio de se industrializar primeiro.
Não é uma barganha de quem tem dinheiro ou quem não tem dinheiro. É um compromisso mais sério, é um compromisso para saber se é verdadeiro ou não o que os cientistas estão dizendo, que o aquecimento global é irreversível. E, portanto, quem tem mais recursos e mais possibilidades precisa garantir a contribuição para proteger os mais necessitados.
Todo mundo se colocou de acordo que precisamos garantir os 2% de aquecimento global até 2050. Até aí, todos estamos de acordo. Todo mundo está consciente de que só é possível construirmos esse acordo se os países assumirem, com muita responsabilidade, as suas metas. E mesmo as metas, que deveriam ser uma coisa mais simples, tem muita gente querendo barganhar as metas. Todos nós poderíamos oferecer um pouco mais se tivéssemos assumido boa vontade nos últimos períodos.
Todos nós sabemos que é preciso, para manter o compromisso das metas e para manter o compromisso do financiamento, a gente, em qualquer documento que for aprovado aqui, a gente tem que manter os princípios adotados no Protocolo de Kyoto e os princípios adotados na Convenção-Quadro. Porque é verdade que nós temos responsabilidades comuns, mas é verdade que elas são diferenciadas.
Eu não me esqueço nunca que quando tomei posse, em 2003, o meu compromisso era tentar garantir que cada brasileiro ou brasileira pudesse tomar café de manhã, almoçar e jantar. Para o mundo desenvolvido, isso era coisa do passado. Para a África, para a América Latina e para muitos países asiáticos, ainda é coisa do futuro. E isso está ligado à discussão que estamos fazendo aqui, porque não é discutir apenas a questão do clima.
É discutir desenvolvimento e oportunidades para todos os países. Eu tive conversas com líderes importantes e cheguei à conclusão de que era possível construir uma base política que pudesse explicar ao mundo que nós, presidentes, primeiros-ministros e especialistas, somos muito responsáveis e que iríamos encontrar uma solução. Ainda acredito, porque eu sou excessivamente otimista. Mas é preciso que a gente faça um jogo, não pensando em ganhar ou perder. É verdade que os países que derem dinheiro têm o direito de exigir a transparência, têm direito até de exigir o cumprimento da política que foi financiada. Mas é verdade que nós precisamos tomar muito cuidado com essa intrusão nos países em desenvolvimento e nos países mais pobres. A experiência que nós temos, seja do Fundo Monetário Internacional ou seja do Banco Mundial nos nossos países, não é recomendável que continue a acontecer no século XXI.
O que nós precisamos... e vou dizer, de público, uma coisa que eu não disse ainda no meu país, não disse à minha bancada e não disse ao meu Congresso: se for necessário fazer um sacrifício a mais, o Brasil está disposto a colocar dinheiro também para ajudar os outros países. Estamos dispostos a participar do financiamento se nós nos colocarmos de acordo numa proposta final, aqui neste encontro.
Agora, o que nós não estamos de acordo é que as figuras mais importantes do planeta Terra assinem qualquer documento, para dizer que nós assinamos documento. Eu adoraria sair daqui com o documento mais perfeito do mundo assinado. Mas se não tivemos condições de fazer até agora - eu não sei, meu querido companheiro Rasmussen, meu companheiro Ban Ki-moon - se a gente não conseguiu fazer até agora esse documento, eu não sei se algum anjo ou algum sábio descerá neste plenário e irá colocar na nossa cabeça a inteligência que nos faltou até a hora de agora. Não sei.
Eu acredito, como eu acredito em Deus, eu acredito em milagre, ele pode acontecer, e quero fazer parte dele. Mas, para que esse milagre aconteça, nós precisamos levar em conta que teve dois grupos trabalhando os documentos aqui, que nós não podemos esquecer. Portanto, o documento é muito importante, dos grupos aqui.
Segundo, que a gente possa fazer um documento político para servir de base de guarda-chuva, também é possível fazer, se a gente entender três coisas: primeiro, Kyoto, Convenção-Quadro, MRV, não podem adentrar a soberania dos países - cada país tem que ter a competência de se autofiscalizar - e, ao mesmo tempo, que o dinheiro seja colocado para os países efetivamente mais pobres.
O Brasil não veio barganhar. As nossas metas não precisam de dinheiro externo. Nós iremos fazer com os nossos recursos, mas estamos dispostos a dar um passo a mais se a gente conseguir resolver o problema que vai atender, primeiro, a manutenção do desenvolvimento dos países em desenvolvimento. Nós passamos um século sem crescer, enquanto outros cresciam muito. Agora que nós começamos a crescer, não é justo que voltemos a fazer sacrifício.
No Brasil ainda tem muitos pobres. No Brasil tem muitos pobres, na África tem muitos pobres, na Índia e na China tem muitos pobres. E nós também compreendemos o papel dos países mais ricos. Eles, também, não podem ser aqueles que vão nos salvar. O que nós queremos é apenas, conjuntamente, ricos e pobres, estabelecer um ponto comum que nos permita sair daqui, orgulhosamente, dizendo aos quatro cantos do mundo que nós estamos preocupados em preservar o futuro do planeta Terra sem o sacrifício da sua principal espécie, que são homens, mulheres e crianças que vivem neste mundo.
Muito obrigado."
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5 comentários:
O nosso presidente Lula mandou muito bem. A conta deve ser paga pelos paises mais ricos que são os que mais poluidores deste planeta com emissão de CO2 e na grande maioria das veses com mão de obra dos países pobres.
Não é um assunto qualquer, é um assunto crucial! Todos tem alguma responsabilidade e não adianta fugir, essa demora a entrar em acordo ainda vai custar caro, e todos nós vamos pagar. O lula está corretíssimos no tom, foi razoável quando precisa e endureceu agora que há um impasse. O Brasil não tem dinheiro sobrando, mas nunca estivemos tão bem, quem esta ai criticando não deve estar muito atualizado quanto à nossa economia. Edemilson Lima: Se temos um governante 'alcólatra' e analfabeto que 'aprovou' a lei seca e a reforma ortográfica isso quer dizer que ele é um homem admirável, não? Alguém que mesmo sem ter ido à escola entende necessidade que gente que estudou a vida inteira em escolinha particular não viu.
enviado por: Welington Veiga em 18/12/2009
Acho a postura do Lula correta nesse caso, mostrar boa vontade e interesse em ajudar nos planos de diminuição de emissões é algo muito correto, serve para precionar outros lideres mundiais para que assumam um papel mais ativo nesse sentido. Agora corrupção é algo que deve ser combatido mas não em troca de uma paralisação da máquina pública que tem de fazer seu papel, que nesse caso ao meu ver foi uma atitude correta.
enviado por: Eduardo Castro em 18/12/2009 - 16:56
Interessante a postura dos comentaristas abaixo. É por pessoas como estas que a Conferência sobre o Clima foi o fracasso que foi. Todos só olham pro próprio umbigo. Vocês esquecem que o Brasil é o 4º (QUARTO) maior poluidor mundial. Esquecem que o país é gerido por PREFEITOS, não pelo presidente como deveria ser. Desde que se municipalizou (obra e graça de FHC) educação e saúde, toda verba escorre ralo abaixo. Que adianta aumentar verba de saúde e educação se ela é mal usada? Quanto mais se aumenta, mais roubam. Interessante que o presidente ANALFABETO fez mais universidade federais que o sociólogo poliglota que vivia pedindo dinheiro emprestado ao FMI. Talvez para ele mesmo, Lula, se matricular nelas, mas fez. Deveriam tirar sarro do Obama, que se revelou, como era de se esperar, igual ao Bush e ao Clinton. No fundo o pensamento de Obama, visto o teor dos comentários abaixo, é idêntico: temos nossas prioridade internas, o mundo que se foda!
enviado por: Rodrigo Melo em 19/12/2009 - 12:00
Luiz Claudio Vieira de Oliveira 18/12/2009 -
O texto fala uma linguagem comum, sem retórica. Ou melhor, sua retórica é a simplicidade. Ao mesmo tempo em que é humilde, o texto é orgulhoso. É uma fala aberta, de peito aberto, de braços estendidos. Não sei se os estadistas, presidentes e técnicos que estavam lá entenderam a mensagem. Nem sempre entendem o que é simples e direto, sem subterfúgios ou metáforas. Esses, que estavam lá, estão habituados às manobras, às desculpas, às palavras vagas e evasivas, ao vazio das mentiras. Mas estas são aquelas em que as pessoas acreditam, como as palavras que dizem que a guerra irá trazer a paz. Há quanto tempo já ouvimos isso? Por quanto tempo mais continuaremos a ouvir? Eu li o texto do Lula e me emocionei. Cheguei às lágrimas. Espero que todos que o tenham ouvido, que todos os que estavam presentes, que todos o guardem e o conservem para, à noite, ao se deitarem, se lembrem dele e permaneçam acordados, deixando as palavras ressoarem dentro deles. Por outro lado, fiquei feliz, porque as palavras que o Lula disse foram as palavras que todos nós, que acreditamos na utopia e vimos lutando por ela há tanto tempo, as palavras que todos nós gostaríamos de dizer.
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