Até outro dia, elas eram ficção científica: drogas capazes de apagar a memória, como no filme estrelado por Jim Carrey, "Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças" (2004). Mas o assunto já ganha as páginas da revista "Nature".
No cinema, um coração partido faz com que o personagem vivido por Carrey queira apagar a sua ex-mulher da memória.Na realidade, com a criação de substâncias capazes de manipular até lembranças antigas no cérebro, surge um movimento em favor desses medicamentos --ao menos para casos especiais.
"Dada a conexão entre a memória e o senso de si mesmo, alguns bioeticistas argumentam que, em vez de buscar uma solução numa pílula, deveríamos fazer o trabalho difícil, de transformar más experiências em coisas boas", diz Adam Kolber, da Escola de Direito do Brooklyn, em Nova York, em seu artigo publicado na "Nature".
"Esses argumentos não são persuasivos. Algumas lembranças, como a de bombeiros que vasculham cenas de destruição em massa, podem não ter nenhuma qualidade que as redima", retruca.
Editoria de Arte/Folhapress | ||
Um consenso quase unânime na discussão é que pesquisas nessa direção devem continuar, porque é por meio delas que os cientistas estão destravando os enigmas em torno da formação e do funcionamento das memórias.
"O propósito dos nossos experimentos era tentar entender a base molecular do armazenamento de lembranças, que antes disso era um mistério científico completo", afirma Todd Sacktor, líder do grupo de pesquisadores da Universidade Estadual de Nova York que, em 2009, descobriu uma droga capaz de apagar memórias específicas no cérebro de camundongos.
A defesa de Sacktor é acompanhada pelos bioeticistas. "A busca do conhecimento, se eticamente desenvolvida, deve ser estimulada", diz Volnei Garrafa, especialista em bioética da UnB (Universidade de Brasília).
"Mas a aplicação prática do conhecimento conquistado pela pesquisa deve ser controlada pelas leis, por comitês de ética e bioética, pelo Estado e pela sociedade."
Em seu artigo na "Nature", Kolber sustenta que esses mecanismos de controle já existem, e que incluir muitas barreiras ao uso desses medicamentos pode acabar sabotando seu potencial médico.
"Todas as drogas apresentam risco de uso inadequado. Uma droga desse tipo presumivelmente seria controlada e exigiria uma prescrição médica", conclui Kolber.
SALVADOR NOGUEIRA- FOLHA
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