12.08.2012

Gravidez real

Reais problemas de uma gravidez real

Distúrbio que afeta até cinco gestantes a cada mil, hiperemese gravídica, que levou Kate Middleton a ser internada, é ocasionado por fatores orgânicos e psicológicos


A hiperemese gravídica é marcada por vômitos contínuos no primeiro trimestre da gestação
Foto: AP/Alastair Grant
A hiperemese gravídica é marcada por vômitos contínuos no primeiro trimestre da gestação AP/Alastair Grant
RIO - A gestação já completara 22 semanas, época em que o ganho de peso da grávida deveria se tornar mais estável. Mas, aos 18 anos, Luana (nome fictício) só via o ponteiro da balança pender na direção contrária. Após uma internação por risco de aborto, chegou ao Hospital das Clínicas da UFMG com apenas 37,5 quilos. Nos dois primeiros meses de gestação, havia apresentado hiperemese gravídica (HG), quadro que culminou em anorexia nervosa, fazendo a jovem perder 11 quilos em 9 meses.
O caso extremo, e raro ao combinar dois distúrbios, foi consequência de uma síndrome que atinge entre uma e cinco grávidas a cada mil no mundo. A hiperemese gravídica — que provocou, no início da semana, a internação de Kate Middleton, mulher do príncipe William, do Reino Unido — é marcada por vômitos contínuos no primeiro trimestre da gestação (até a 14ª semana). O quadro acarreta perda de peso materno e pode prejudicar o desenvolvimento do bebê, caso não haja uma reposição nutricional. A redução de peso pode se dar de forma tão rápida que a gestante chega a perder entre 300 e 500 gramas por dia.
A causa e a cura são praticamente desconhecidas — tratam-se os sintomas, ou seja, as náuseas. Sabe-se, entretanto, que a doença está relacionada à intensa produção hormonal, principalmente do hCG (gonadotrofina coriônica humana) e da progesterona. Estudos apontam ainda que 66% das pacientes com HG apresentam também um hipertireoidismo transitório.
— É um quadro tratado como distúrbio próprio da gravidez e não tem origem determinada. Pode acontecer em gestações normais, sem grandes intercorrências. É mais comum, entretanto, em gestações gemilares (de gêmeos), já que tendo duas placentas a produção de hormônios é mais abundante — explica Rita Bormia, vice-diretora da Maternidade Escola da UFRJ, ressaltando que, numa gravidez posterior, 25% das gestantes podem voltar a desenvolver a HG.
Nos casos mais graves, em que há perda de peso acima dos 5%, é possível que a gestante apresente quadro de anemia, desidratação ou problemas renais. O procedimento padrão, então, é a internação para reposição de soluções e vitaminas, além de medicação para controle das náuseas.
— Interrompe-se a alimentação por via oral e a paciente passa a receber hidratação venosa. Ainda não surgiu uma medicação para interromper esse ciclo de vômitos instantaneamente. Mas, em geral, o distúrbio se resolve espontaneamente, com o fim do primeiro trimestre da gravidez — explica Rita.
Outra causa levantada, com muita cautela, por médicos está ligada a fatores psicossomáticos, em geral a depressão. Em alguns casos, o ato de vomitar pode ser, para a gestante, uma forma de expressar a sua rejeição ao feto. Entretanto, especialistas evitam estereotipar essa equação.
— Nenhuma gestação é totalmente rejeitada ou totalmente desejada, isso acontece em maior ou menor grau dependendo do caso. Mesmo na gravidez planejada a mulher passa por um processo de modificação do corpo e do seu papel que traz conflitos internos. Somam-se a isso os problemas familiares, conjugais e financeiros — enumera Marina Herdeiro, autora de um trabalho sobre os aspectos psicológicos da HG e psicóloga do hospital universitário da Unicamp.
Professor de psiquiatria da UFMG, Maurício Daker lembra que o caso de Luana se tratou de uma rara coincidência em que dois distúrbios se sobrepuseram, principalmente por causa do histórico familiar da paciente.
— O caso da paciente é clínico e não estatístico. Mas a associação da hiperemese na gravidez com um quadro de depressão e obsessão levou ao agravamento da anorexia. Já havia uma tendência de se preocupar com o peso, muito ligada à idade e à condição familiar, e a dificuldade de se alimentar ajudou a agravar a questão. Após o nascimento do bebê, ela passou a controlar melhor o distúrbio alimentar — afirma Daker, que atuou no caso.
As causas variadas da hiperemese levam à necessidade de um tratamento multidisciplinar, aponta a psicóloga:
— Como várias patologias que incluem diversos fatores, o importante para a gestante que sofre de hiperemese é ter uma atenção multiprofissional. Não podemos afirmar que o distúrbio é gerado puramente por fatores psíquicos ou orgânicos. É preciso um obstetra atento e acompanhamento psicológico que ajude a gestante a compreender esse momento de mudança.

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