Análise facial em 3D pode ajudar a determinar idade biológica de uma pessoa
Por: O Globo
RIO - Qual a sua idade? Em termos cronológicos, não é uma pergunta difícil de responder: basta contar quantos anos, meses e dias se passaram desde a data de seu nascimento. Mas, do ponto de vista biológico, esta questão aparentemente simples adquire uma complexidade que desafia cientistas e médicos na busca por marcadores físicos capazes de indicar quanto e como uma pessoa está envelhecendo. Tais marcadores podem ajudar na decisão de quando começar a pedir exames e prescrever tratamentos preventivos e corretivos de doenças e condições ligadas ao desgaste natural do corpo com a passagem do tempo — como câncer e problemas cardíacos, respiratórios ou neurológicos. Afinal, o envelhecimento biológico é um processo que depende de vários fatores, desde genéticos a ambientais, passando por hábitos de vida, como dieta, prática de exercícios, tabagismo e consumo de álcool.
Nos últimos anos, esta busca por indicadores físicos das marcas deixadas pelos anos no organismo humano se estendeu de estruturas encontradas no interior dos núcleos de nossas células aos níveis de algumas substâncias no sangue, mas agora um grupo de cientistas chineses diz ter encontrado uma maneira simples de determinar se estamos envelhecendo mais rápido ou devagar que nossa idade cronológica. Segundo eles, estas marcas ficam estampadas em nossa cara em alterações de medidas como as distâncias entre nariz e boca e entre os olhos, a largura do nariz e da boca e o direcionamento do canto dos olhos, que podem ser analisadas com tecnologias de imagem facial em três dimensões. De acordo com o estudo, publicado ontem no periódico científico “Cell Research”, pessoas cujos rostos aparentavam ser mais velhos do que sua idade cronológica também apresentavam indicadores de envelhecimento acelerado nos seus exames de sangue, enquanto as que pareciam mais jovens tiveram os resultados destes mesmos exames compatíveis com os de pessoas mais novas do que elas realmente eram.
Para chegar a esta conclusão, os cientistas liderados por Jing-Dong Han, professora de biologia computacional da Academia de Ciências da China e pesquisadora do Instituto Max Planck de Xangai, primeiro escanearam em 3D os rostos de 322 chineses da etnia han, divididos entre homens e mulheres, com idades entre 17 e 77 anos. Com isso, eles montaram os perfis das características faciais comuns de indivíduos pertencentes a cada uma das faixas etárias dos dois gêneros entre os dois extremos de idade cronológica. Em seguida, com base nestes perfis, eles criaram algoritmos que pudessem estimar a idade cronológica de uma pessoa a partir das imagens em três dimensões de seu rosto. Usando a mesma amostragem, os pesquisadores verificaram que, em média, o método teve uma margem de erro de cerca de seis anos para mais ou para menos tanto nos homens quanto nas mulheres, mas que ficava maior nos indivíduos a partir dos 40 anos.
Com estes dados em mãos, os cientistas fizeram exames de sangue em todos os participantes nos quais mediram marcadores comuns associados ao envelhecimento, encontrando uma forte correlação entre os resultados da análise facial em 3D e os dos testes sanguíneos. No caso das mulheres, as que tinham uma aparência considerada mais velha do que sua idade real apresentavam níveis de colesterol total mais altos do que os que seriam esperados para aquele período de sua vida, enquanto nos homens que pareciam mais velhos os níveis de albumina, a principal proteína do plasma, eram mais baixos do que deveriam ser.
— Não esperava ver tantas mudanças marcantes (nas características faciais) com a idade, nem esperava que as imagens em 3D fossem ser tão boas marcadoras da idade biológica — disse Han ao jornal britânico “Guardian”. — As pessoas cujas imagens previam um envelhecimento acelerado de fato tinham perfis sanguíneos de envelhecimento acelerado; e o mesmo ocorreu com as que tinham um envelhecimento retardado.
ESTUDO TEM VÁRIAS LIMITAÇÕES
Embora à primeira vista a análise facial em 3D pareça ser um método promissor, simples e rápido para estimar a idade biológica de uma pessoa, especialistas apontam diversas limitações no estudo que devem ser abordadas antes que ele chegue aos consultórios. A primeira, e mais clara, é de que os algoritmos foram desenvolvidos tendo como base apenas chineses da etnia han, sendo preciso comprovar que também seriam válidos para indivíduos de outras etnias. Além disso, os marcadores sanguíneos usados para fazer a correlação — os níveis de colesterol total nas mulheres e de albumina nos homens — são considerados indicadores “fracos” do envelhecimento.
— Ainda é muito cedo para extrapolar, generalizar e saber qual seria a real utilidade deste método — diz Tarso Morsi, presidente da seção Rio de Janeiro da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia. — Vejo no estudo mais uma tentativa de identificar o estágio do processo de envelhecimento independente da idade cronológica, o que é muito difícil de fazer, já que é um processo muito complexo e heterogêneo, multifatorial e multissistêmico. Se o método se confirmar, porém, ele poderá ser útil e interessante para ajudar a identificar esta idade biológica, talvez somado a outras técnicas e marcadores para termos resultados melhores.
Opinião parecida tem Alexandre Kalache, gerontólogo e presidente do Centro Internacional de Longevidade no Brasil:
— O estudo é interessante e o método pode ser promissor, mas ele está longe de ser comprovado e estar disponível. Seria muito bom com uma simples foto poder identificar pessoas que estão envelhecendo mais rápido do que sua idade cronológica, mas também temos outros meios simples, como questionários, para fazer esta estimativa. Há uma tendência da sociedade e dos cientistas de buscar uma “pílula mágica” que vá resolver um problema ou testes fantásticos que dariam respostas imediatas, mas tudo relacionado a este estudo ainda é muito especulativo.
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