RIO - A professora Lucy Corrêa Bauly, de 58 anos, trabalhou em escolas
particulares por 23 anos. Foi um período em que, na média, os profissionais
que davam aulas na rede privada recebiam salários maiores do que no
setor público. Segundo ela, para os padrões da profissão, o pagamento
que recebia por hora aula era até bom. No entanto, uma reestruturação no
colégio onde trabalhava alterou esse quadro. Foi aí que decidiu, em 2012,
fazer concurso para o município.
— Já entrei com um salário maior do que ganhava na rede particular.
Era algo em torno de R$ 2.600. Logo depois, o sindicato brigou para que
existisse uma equiparação dos nossos salários com uma outra categoria
que exercia as mesmas funções e, aí, nosso salário aumentou para quase
R$ 5 mil. É óbvio que o professor merece mais, mas, para mim, foi um
aumento salarial relevante.
Dados tabulados pelo GLOBO na Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílio, do IBGE, mostram que a rede pública já paga, em média,
salários melhores aos seus professores na educação básica em comparação
à particular. Até o final da década passada, o padrão era o contrário.
Em 2002, considerando todos os professores com diploma de nível
superior dos ensinos fundamental e médio, um docente da rede privada
recebia, em média, 18% a mais em seu trabalho principal para uma
jornada de 40 horas semanais. Ao longo da década passada, a distância
entre as duas redes em termos salariais foi diminuindo, até que, em 2011,
pela primeira vez, a rede pública superou a particular.
Os últimos números da Pnad, de 2013, mostram que o
rendimento médio de um professor da educação básica na rede pública
é 6% maior do que na rede privada.
LEI DO PISO CONTRIBUIU
A reversão desse padrão aconteceu principalmente por causa da melhoria
salarial verificada no setor público no ensino médio e no segundo segmento
do ensino fundamental, o antigo ginásio. Nesses dois segmentos, enquanto
os profissionais da rede pública registraram aumentos reais
(superiores à inflação do período) entre 2002 e 2013, os que davam
aulas no ensino particular viram seus salários caírem, quando considerada
a inflação. No primeiro segmento do ensino fundamental (antigo primário),
os salários da rede pública já superavam os da particular em 2002,
e houve aumento real no período nos dois setores.
Para o presidente do Consed (Conselho Nacional de Secretários
de Educação), Eduardo Deschamps, um dos fatores que contribuiu
para os rendimentos do setor público terem superado os da rede
privada foi a Lei do Piso Nacional do Magistério, aprovada em 2008.
Deschamps, que é também secretário em Santa Catarina, defende
ajustes na lei para, segundo ele, garantir que ela seja sustentável
— os secretários pedem mais recursos da União ou mudanças
na forma de cálculo do reajuste —, mas reconhece que a legislação
tem proporcionado aumentos superiores à inflação no setor público.
— Enquanto os salários da rede privada são reajustados
normalmente pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor),
o piso variou entre 2011 e 2014 algo em torno de 78%, para uma
inflação que não chega à metade deste percentual.
A secretária municipal de educação do Rio, Helena Bomeny,
conta que a melhoria dos salários tem feito também a relação
candidatos por vaga aumentar em concursos para o magistério.
O salário base hoje no município para 40 horas semanais
é de R$ 4.410, chegando a R$ 4.947 quando somados
benefícios como auxílio transporte, alimentação e bônus cultura,
que elevam o valor do salário inicial para R$ 4.947.
— No nosso último concurso, foram 54 candidatos por vaga —, diz a secretária.
REDE PRIVADA TEM MAIS DISPARIDADES
Na comparação entre rendimentos dos setores público e privado,
é preciso considerar que os salários tendem a ser mais homogêneos
no setor estatal. No município do Rio, por exemplo, há colégios de elite
no ensino médio que pagam R$ 60 por hora de aula, enquanto outros
pagam somente o piso, de R$ 15. Ou seja, o salário mensal de um
professor da rede privada que consegue fazer 40 horas semanais
nesses valores de hora aula pode variar de R$ 9.600 a R$ 2.400.
Algumas pesquisas publicadas nos últimos anos já vinham registrando
a diminuição desse diferencial entre as redes. Um estudo apresentado
em 2007 pelos pesquisadores Samuel Pessoa, Fernando Barbosa Filho
e Luis Eduardo Afonso, da FGV e da USP, indicava que a vantagem
salarial dos professores da rede privada variava apenas de 5% a 11%,
a depender do nível de ensino. Os autores argumentavam na época,
no entanto, que a carreira no setor público já era mais vantajosa do
que no privado, se fossem consideradas as regras de aposentadoria,
mais favoráveis para servidores públicos do que na iniciativa privada.
Lucy Bauly, a professora que trocou a rede privada pela pública há
três anos, diz que a estabilidade é outro fator a favor do setor estatal.
— No colégio particular você pode ser o melhor professor do mundo,
mas é o aluno que dá o dinheiro. E a direção, na dúvida, geralmente
aceita mais a versão do aluno do que a do professor em momentos de crise.
Ela afirma que a maior diferença que ela percebeu logo que trocou
de rede foi na infraestrutura.
— A primeira escola municipal em que atuei não tinha ar-condicionado,
eu levava ventilador de casa e o material para sala de aula era escasso.
que eu estou agora possui uma direção muito atuante que muda esse cenário.
Mas deveria ser assim em toda escola: com bons salários
e uma infraestrutura adequada.
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