Parceiro de Veja também caiu com Cachoeira
Araponga Jairo Martins, que gravou a fita de Maurício Marinho recebendo propina em 2005, no marco zero do Mensalão, e a entregou ao jornalista Policarpo Júnior, de Veja, foi pego na Operação Monte Carlo; fonte regular da revista, ele também recebia pagamentos mensais da quadrilha do bicheiro
247 –
Ainda é um mistério por que as revistas semanais continuam ignorando a
Operação Monte Carlo e seus desdobramentos políticos. Uma explicação
possível é o fato de Carlinhos Cachoeira, e seu braço direito Idalberto
Araújo, o sargento Dadá, terem mantido relações próximas com vários
jornalistas investigativos. Dadá, por exemplo, trabalhou com Alexandre
Oltramari, ex-repórter de Veja, na campanha que elegeu Marconi Perillo,
do PSDB, para o governo de Goiás, em 2010. Cachoeira também gravou a
fita de Valdomiro Diniz pedindo propina, que foi entregue à revista
Época, em 2004.
A
nova surpresa da Operação Monte Carlo é o envolvimento de outro
personagem conhecido no submundo da arapongagem e do jornalismo
investigativo. Trata-se do policial Jairo Martins de Souza. Foi ele quem
gravou a fita que detonou, em 2005, o escândalo do Mensalão. Trata-se
da cena em que um ex-funcionário dos Correios, Maurício Marinho, aparece
recebendo uma propina de R$ 3 mil. A fita foi entregue ao jornalista
Policarpo Júnior, que é amigo de Jairo Martins, e hoje, além de dirigir a
sucursal da revista Veja em Brasília, é redator-chefe da publicação.
De
acordo com a acusação do Ministério Público, Jairo Martins era um
“empregado” da quadrilha de Carlinhos Cachoeira. Recebia R$ 5 mil
mensais e tinha a função de cooptar policiais e também levantar
informações que pudessem prejudicar os negócios do grupo.
Em
2005, na crise do Mensalão, Jairo Martins depôs no Congresso, e disse
que gravou a fita com Maurício Marinho por “patriotismo”. Não se sabe,
ainda, se Cachoeira estaria por trás da denúncia.
Leia, abaixo, reportagem do Observatório da Imprensa a respeito:
O
ex-agente da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Jairo Martins de
Souza afirmou ter sido movido por "espírito jornalístico" quando
decidiu entregar ao repórter Policarpo Júnior, da revista Veja, a fita
de vídeo que mostrou a entrega de R$ 3 mil ao ex-chefe do departamento
de Administração e Compras da Empresa Brasileira de Correios e
Telégrafos, Maurício Marinho.
Em
sua exposição à comissão parlamentar mista de inquérito que investiga
denúncias de corrupção na estatal, ele apresentou versão diferente da
que contou o empresário Arthur Wascheck Neto, mandante confesso da
gravação. Ao contrário do que relatou à CPI Wascheck, dono da Comercial
Alvorada de Manufaturados (Comam), Jairo disse que, desde o início,
havia a intenção de repassar o vídeo à imprensa.
-
Mas, independentemente da vontade dele, eu publicaria - afirmou Jairo,
destacando ter sido motivado por "patriotismo" ao realizar a gravação e
ao divulgá-la.
Antes
de prestar depoimento, Jairo pediu que a reunião fosse secreta,
alegando temer que a exposição de sua imagem colocasse em risco a si e a
sua família. Ele informou estar sendo perseguido desde que participou
das gravações que culminaram na cassação do mandato do ex-deputado
federal André Luiz. Os parlamentares, entretanto, preferiram manter a
reunião aberta.
Outra
contradição entre o depoente e Wascheck foi sobre o equipamento
utilizado na gravação. Jairo disse que a maleta com a câmera escondida
tinha sido comprada em Brasília, na feira de produtos importados, a
Feira do Paraguai, exclusivamente para o flagrante de Maurício Marinho.
Afirmou que a própria maleta seria o seu pagamento pelos serviços.
Wascheck apresentou a versão de que o material de espionagem era do
ex-agente e que teria sido apenas alugado.
O
deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP) apontou ainda divergências entre
os depoimentos do jornalista Policarpo Junior à Polícia Federal e o de
Jairo à CPI: à PF, Policarpo disse ter sido procurado por Jairo sobre um
esquema de corrupção envolvendo o PTB, sobre o qual garantiu ter
provas. À CPI, Jairo afirmou não ter comentado o assunto com o repórter e
que, à época do contato, anda não existiam provas. O jornalista,
prosseguiu Cardozo, afirmou ainda que a primeira fita que viu não foi a
divulgada, ao contrário do que afirmou o ex-agente da Abin.
Jairo
disse ser amigo do empresário de jogos Carlos Ramos, o Carlinhos
Cachoeira. Afirmou não conhecer Arlindo Molina, que mostrou a gravação
ao deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), e José Fortuna Neves, ex-agente
do Serviço Nacional de Informações. Mas confirmou conhecer Edgar Lange,
conhecido como Alemão, que teria relatado a Fortuna a participação da
Casa Civil nas investigações sobre a Unisys, que tem convênio com a ECT.
Jairo afirmou também ser amigo de Paulo Ramos, diretor de operações de
inteligência da Abin. O deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ) identificou
nessas declarações um forte indício de que o ex-agente da Abin sabia da
investigação nos Correios patrocinada pela agência.
Vários
parlamentares da oposição mostraram-se contrários ao depoimento dos
envolvidos com a gravação, que, a seu ver, deveria ser executado pela
Polícia Federal. Os senadores César Borges (PFL-BA) e Alvaro Dias
(PSDB-PR) e os deputados Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA), Juíza
Denise Frossard (PPS-RJ) e Onyx Lorenzoni (PFL-RS) afirmaram ser preciso
investigar o braço político por trás do esquema de corrupção e desvio
de verbas públicas montado nas estatais. Onyx acusou ainda o PT de ser
uma "camarilha" e destacou não acreditar que o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva seja um "inocente útil". Os parlamentares também pediram
agilidade para a aprovação de requerimentos que não deixariam a comissão
à reboque da imprensa, como o que determina a tomada de depoimentos do
presidente do PT, José Genoíno, do ex-tesoureiro do partido Delúbio
Soares, do ex-secretário-geral Silvio Pereira e do ex-ministro e atual
deputado José Dirceu (PT-SP).
Um
dos depoentes chamados para esta terça-feira (5), Kasser Bittar, enviou
requerimento à CPI alegando ser impossível prestar depoimento, já que
não está em Brasília. O vice-presidente da comissão, senador Maguito
Vilela (PMDB-GO), pediu que a Polícia Federal verifique se a informação é
verdadeira. Kasser é obrigado a depor, já que a CPI tem poder de
convocar os depoentes.
Leia,
ainda, reportagem publicada pelo jornalista Luís Nassif sobre os
vínculos entre o jornalismo investigativo e o submundo da arapongagem:
A parceria com o araponga
Nas
alianças políticas do governo Lula, os Correios foram entregues ao
esquema do deputado Roberto Jefferson. Marinho era figura menor, homem
de propina de R$ 3 mil.
Em
determinado momento, o esquema Jefferson passou a incomodar lobistas
que atuavam em várias empresas. Dentre eles, o lobista Arthur Wascheck.
Este
recorreu a dois laranjas – Joel dos Santos Filhos e João Carlos Mancuso
Villela – para armar uma operação que permitisse desestabilizar o
esquema Jefferson não apenas nos Correios. como na Eletrobrás e na BR
Distribuidora. É importante saber desses objetivos para entender a razão
da reportagem da propina dos R$ 3 mil ter derivado - sem nenhuma
informação adicional - para os esquemas ultra-pesados em outras
empresas. Fazia parte da estratégia da reportagem e de quem contratou o
araponga.
A
idéia seria Joel se apresentar a Marinho como representante de uma
multinacional, negociar uma propina e filmar o flagrante. Como não
tinham experiência com gravações mais sofisticadas, teriam decidido
contratar o araponga Jairo Martins.
E,
aí, tem-se um dos episódios mais polêmicos da história do jornalismo
contemporâneo, um escândalo amplo, do qual Veja acabou se safando graças
à entrevista de Roberto Jefferson à repórter Renata Lo Prete, da Folha,
que acabou desviando o foco da atenção para o “mensalão”.
Havia
um antecedente nesse episódio, que foi o caso Valdomiro Diniz, a
primeira trinca grave na imagem do governo Lula. Naquele episódio
consolidaram-se relações e alianças entre um conjunto de personagens
suspeitos: o bicheiro Carlinhos Cachoeira (que bancou a operação de
grampo de Valdomiro), o araponga Jairo Martins (autor do grampo) e o
jornalista Policarpo Jr (autor da reportagem).
No
caso Valdomiro, era um contraventor – Carlinhos Cachoeira – sendo
achacado por um dos operadores do PT, enviado pelo partido ao Rio de
Janeiro, assim como Rogério Buratti, despachado para assessorar Antonio
Palocci quando prefeito de Ribeirão.
Jairo
era um ex-funcionário da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência),
contratado pelo bicheiro para filmar o pagamento de propina a Valdomiro
Diniz.
Tempos depois, Jairo foi convidado para um almoço pelo genro de Carlinhos Cachoeira, Casser Bittar.
Lá,
foi apresentado a Wascheck, que o contratou para duas tarefas, segundo o
próprio Jairo admitiu à CPI: providenciar material e treinamento para
que dois laranjas grampeassem Marinho; e a possibilidade do material ser
publicado em órgão de circulação nacional.
Imediatamente
Jairo entrou em contato com Policarpo e acertou a operação. O
jornalista não só aceitou a parceria, antes mesmo de conhecer a
gravação, como avançou muito além de suas funções de repórter.
O
grampo em Marinho foi gravado em um DVD. Jairo marcou, então, um
encontro com Policarpo. Foi um encontro reservado - eles jamais se
falavam por telefone, segundo o araponga -, no próprio carro de
Policarpo, no Parque da Cidade. Policarpo levou um mini-DVD, analisou o
material e atuou como conselheiro: considerou que a gravação ainda não
estava no ponto, que havia a necessidade de mais. Recebeu a segunda,
constatou que estava no ponto. E guardou o material na gaveta,
aguardando a autorização do araponga, mesmo sabendo que estava se
colocando como peça passiva de um ato de chantagem e achaque.
Wascheck
tinha, agora, dois trunfos nas mãos: a gravação da propina de R$ 3 mil e
um repórter, da maior revista do país, apenas aguardando a liberação
para publicar a reportagem.
Quando
saiu a reportagem, a versão do repórter de que havia recebido o
material na semana anterior era falsa e foi desmentida pelos depoimentos
dados por ele e por Jairo à Policia Federal e à CPI do Mensalão.
Pressionado
pelo eficiente relator Osmar Serraglio, na CPI do Mensalão, Jairo negou
ter recebido qualquer pagamento de Wascheck. Disse ter se contentado em
ficar com o equipamento, provocando reações de zombaria em vários
membros da CPI.
Depois,
revelou outros trabalhos feitos em parceria com a Veja. Mencionou série
de trabalhos que teria feito e garantiu que sua função não era de
araponga, mas de jornalista. O único órgão onde seus trabalhos eram
publicados era a Veja. Indagado pelos parlamentares se recebia alguma
coisa da revista disse que não, que seu objetivo era apenas o de
"melhorar o pais".
Segundo o depoimento de Jairo:
‘Aí
fiquei esperando o OK do Artur Washeck pra divulgação do material na
imprensa. Encontrei com ele pela última vez no restaurante, em Brasília,
no setor hoteleiro sul, quando ele disse: ‘Eu vou divulgar o fato.
Quero divulgar’. E decorreu um período que essa divulgação não saía. Aí
foi quando eu fiz um contato com o jornalista e falei: ‘Pode divulgar a
matéria’’.
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