A cada quatro pessoas com o vírus da AIDS no Brasil, uma não sabe que possui a doença. Esta é a estimativa do Ministério da Saúde, que revela a dimensão da subnotificação dos casos de HIV no País. Apesar de chegar à terceira geração de jovens convivendo com a epidemia – o primeiro caso de AIDS data de 1977 – e das várias campanhas de prevenção, a Bahia soma às estatísticas uma média de 600 novos registros de pessoas infectadas a cada ano.
Em 2008, até 30 de agosto, já foram 403 notificações, segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde (Sesab). O número se aproxima dos registros de 2006, em que 519 pessoas entraram nas estatísticas da doença. No ano passado, o índice chegou a 782 ocorrências, aumento de 50% em relação ao ano anterior. Estima-se em 620 mil o número de pessoas com AIDS no Brasil, sendo 474.273 notificados.
Para a técnica da coordenação de DST/AIDS da Sesab, Tânia Cordeiro, as estatísticas refletem tendência de crescimento da doença no Nordeste e Norte, apesar da estabilização no restante do País. “Muitas pessoas não apresentam sintomas e, por não se submeterem a testes regularmente, não sabem que são portadores. Enquanto isso, podem contaminar eventuais parceiros sexuais”, revela.
O caso exemplificado pela técnica da Sesab aconteceu na família de Jaime (nome fictício), que, a partir de um relacionamento extraconjugal, transmitiu o HIV para a esposa, há cerca de 13 anos. Ele diz que saber lidar com a doença foi fundamental para não transformar o relacionamento num poço de culpa e ressentimento. “Eu não fazia parte de um grupo de risco, nunca podia imaginar. Felizmente, nós conseguimos superar juntos”, comenta.
A partir do tratamento, Jaime tem levado uma vida normal, graças à medicação e ao controle da carga viral. Pintor da construção civil, ele ilustra o avanço da ciência pela qualidade de vida ao lado da esposa, com quem teve uma filha. Hoje com um ano e quatro meses, Alice não contraiu HIV, motivo de felicidade para o casal. “O médico disse: você tem 90% de chance de ter uma filha normal, está disposto a arriscar?”, relembra, mostrando-se recompensado.
Graças à medicina e ao avanço em pesquisas, a sobrevida dos pacientes com HIV permite aos pacientes não encarar a vida como uma contagem regressiva. Pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz, Bahia) e então coordenador da equipe que, na década de 1980, isolou o vírus HIV no Brasil pela primeira vez, Bernardo Galvão desmistifica alguns mitos sobre a doença, especialmente no contágio e na eficiência do coquetel.
“Hoje em dia, é muito baixo o risco de contaminação por transfusão de sangue, mas a mídia deu uma certa descansada, fez as pessoas acreditarem que a AIDS não é mais um problema. As pessoas que antes eram grupo de risco começaram a se prevenir, mas o restante da população, não”, avalia o médico. Para ele, a idéia de que o coquetel equipara a vida de uma pessoa soropositiva à de uma pessoa saudável é outro senso comum.
“Apesar de o coquetel garantir alguma sobrevida, a qualquer momento o vírus pode se reproduzir. Além disso, essas drogas vão dando reações adversas, como lipodistrofia, resistência ao tratamento, diminuição da densidade óssea”, enumera. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) indicam 2,7 milhões de novas infecções pelo vírus e dois milhões de pessoas mortas em decorrência da AIDS somente no ano passado.
“O tempo mediano de sobrevida hoje é de quatro anos, enquanto no início da epidemia era de dois a cinco meses”, explica a diretora do Centro de Referência Estadual de DST/AIDS (CreAIDS) Cristina Camargo, com base em estudos do ex-diretor do Programa Nacional de DST e AIDS, Pedro Chequer. “Em 1997, já se falava em vacina, o que não ocorreu. O HIV é um vírus de mutação muito rápida. É difícil imaginar uma imunização a curto prazo”, comenta Cristina.
Vacina – Na semana passada, o governo federal anunciou o investimento de R$ 25 milhões para desenvolvimento da vacina, durante o I Seminário Internacional sobre Pesquisa, Desenvolvimento e Acesso a Vacinas Anti-HIV. O orçamento será em capacitação de recursos humanos, infra-estrutura laboratorial e plataformas tecnológicas. No mundo, os investimentos chegam a US$ 960 milhões anuais, segundo a Iniciativa Internacional de Vacinas contra a AIDS.
Passados 22 anos da criação do Programa Nacional DST/
AIDS, considerado referência mundial no combate à doença por agências de cooperação internacional, a adesão ao tratamento, no Brasil, é considerado um dos principais desafios. Célia Teixeira, responsável pelo programa de adesão do CreAIDS, lembra que “muita gente deixa de buscar os remédios porque simplesmente não tem dinheiro para o transporte”.
“É uma doença de uso contínuo, que requer disciplina. Há quem suspenda o uso em alguns dias, por conta própria. É preciso adesão acima de 95% das vezes para os remédios terem efeito”, explica. Ela conta que o uso descontinuado prejudica o efeito dos medicamentos. “Quando o paciente pára, aquela medicação pode não fazer mais efeito. Existe um grupo limitado de combinações medicamentosas, e o paciente queima uma das possibilidades”, justifica.
Fonte: E-Hoster
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