A vida durante a Sibutramina: e depois?
Nesta terça-feira, completa-se uma semana que passei a fazer parte do mesmo time que os consumidores de maconha, cocaína, heroína, crack, ecstasy e LSD. Sim, nesta terça-feira faz uma semana que sou um adicto. Um usuário de drogas. Mais precisamente a Sibutramina, droga lícita vendida nas farmácias com retenção de receita médica, com preço variando entre R$ 45 e R$ 55. O nome genérico é sibutramina, mas nas farmácias o cidadão pode encontrar sob os nomes de Reductil e, last but not least, Plenty. Esta droga dá poder, um poder incomensurável, uma força que eu jamais imaginei ter: a força de agüentar o horário das 17h às 19h sem comer um sanduíche, um salgado ou besteira qualquer. Sim, é o remédio para emagrecer que treina você para ser faquir. Dá a quem toma poderes incríveis, que eu jamais imaginei. Calma. Posso ser preso por apologia às drogas.
A Sibutramina é uma droga que se compra com receita médica, como eu já disse. Não chega a ser tarja preta, mas se não houvesse receita, a coisa desandava. Quem, afinal, não gostaria de ter o poder de enganar de verdade o estômago, de maneira a impedir que ele seja ferroado pela fome nos horários-chave? Quem não quer ter o poder do faquir, controlar os próprios estímulos nervosos da parede estomacal? Entre isso e voar, muita gente, aposto, escolheria tomar Sibutramina. Até porque deve ser difícil voar com barriga ou acima do peso.
A Sibutramina, em uma semana, já me deu vitórias espetaculares. Já entrei na cantina do meu trabalho várias vezes sem pedir duas coxinhas com catupiry. Já fiquei, de madrugada, com uma fome leve, vendo um amigo comer uma pizza calabresa e minha mulher comendo um penne à putanesca. E eu lá, impávido. Tal e qual um Rajneesh, passando um tantinho de manteiga numa torradinha de alho e achando que aquilo equivalia a comer um avestruz inteiro. E, maior das vitórias, já vi pão francês quentinho e mortadela fresca, em plena redação, e....comi um só. Pô, remédio também não faz milagre. Pão francês quentinho, não há ser humano que agüente.
O problema é que obviamente não se pode tomar Sibutramina pelo resto da vida. Não é como cachaça. Hehehe. Tou brincando. Mas, enfim, uma hora vou ter que parar. A barriga vai dar uma diminuída, vou recuperar minhas sete calças perdidas, vou festejar mais uma vitória parcial sobre a balança – e festejar no melhor estilo Pedra-de-Sísifo, claro. E aí? Há vida depois da Sibutramina?
Procurei a resposta em comunidades do Orkut, como essa, essa e essa aqui,
mas, sinceramente, ou procurei mal ou simplesmente não havia o debate sobre a vida pós-Sibutramina. Talvez precisemos de um médium para falar sobre o assunto.
Já imagino quando eu tiver de passar em zonas conflagradas, como por exemplo o corredor do Shopping Rio Sul em frente à loja Pizza e Cia., onde o aroma despejado propositadamente no ar é mil vezes melhor que qualquer pizza no mundo. Chego a ficar paranóico, pensando nos caras que ficam jogando as massinhas ainda brancas para o alto, fazendo malabarismos com a pizza, olhando para mim e pensando, “Ahá! Esse largou a Sibutramina ontem!”. E como conseguirei passar em frente ao Galeto Liceu, ali no Centro, e sobreviver incólume ao cheio de galeto e de lingüiça toscana na brasa que emerge impiedosamente de churrasqueiras movidas a carvão de verdade?
Eu sei que a resposta para tudo isso é “força de vontade”, esse sentimento que os imortais cultuam...Como estou muito longe da ABL, minha força de vontade tem muito mais a ver com meu bolso do que com meu estômago. E creio que a coisa é mais ampla.
Se o governo taxasse a pizza a 150% (sinceramente? Deveria) de impostos e a fatia da calabresa subisse para uns R$ 50, sim, acho que eu pararia com a pizza. Ou me atiraria em dívidas. “Meu bem, recebi hoje, vamos até a Capricciosa abrir um crediário?” ou “Garçom, me vê uma quatro queijos em 10 vezes sem juros” seriam frases constantes do meu anedotário. E eu estaria sozinho? Não! Afinal, vivemos em um país no qual a comida está fazendo mal. A quantidade de gente obesa e acima do peso é cavalar. Ou melhor, elefantar. O que diabos está acontecendo com a comida? Será que a solução será taxar muzzarelas, frituras, salsichas, pães, refrigerantes e chocolates a um preço assustador?
A força de vontade é algo que precisa de ajuda. Principalmente em se tratando de estômago, este ser que comprime algo em nós com um ferrão, beliscando e exigindo “Pão! Pão! Pão!” durante nossa curta caminhada até a cozinha.
Não sei o que farei depois que acabar meu tratamento com Sibutramina. Espero estar uns 15 quilos mais leve, claro. Mas precisarei reajustar rotinas. É claro que eu não como em quantidades para ter engordado tanto, mas devo ter um tipo de síndrome metabólica que faz o cidadão inchar. Algo que começa com o engorduramento do fígado.
No fim, com várias calças no armário prontas para usar, restará eu e minha força de vontade. Sozinhos, os dois. Como numa ilha. Eu vou começar a conversa, e minha força de vontade vai responder, porque ela cuida muito de mim. E me ama, eu sei.
Eu: - Hum, acho que um cachorro-quente cairia bem.
Força de vontade: - Gustavo, você acabou de perder quinze quilos. Larga disso, garoto.
Eu: - Cara, mas imagina só: pão francês quentinho, salsicha Santo Amaro, catchup Heinz, mostarda, maionese....
Força de vontade: - Larga disso, larga disso....o pior mesmo é o pão francês quentinho.
Eu: - Pior, por quê?
Força de vontade: - Ah, você sabe...
Eu, sorrindo e gesticulando com as mãos: - Umas batatinhas palha...
Força de vontade: - Carboidrato com proteína engorda tanto....
Eu, quase me afogando em saliva e com os olhos em chamas: - Com uma tirinha de bacon em volta da salsicha...
Força de vontade: - Você está abusando.
Eu, à beira do colapso: - E uma colherada de maionese Hellman’s para arrematar. Ah, e mostarda escura.
Força de vontade: - PQP. Mostarda escura. O.K., corta a maionese e o bacon, manda para dentro que a vida é curta.
E o telefone tocará. Será a Sibutramina pedindo para voltar. Ainda bem que nunca tomo remédio de barriga vazia.
PS - MEGA post-scriptum: quero convidar aos que ainda chegam neste post aqui (escrito em 1º de abril) a ler o texto escrito no dia 14 de julho, ou seja, três meses e alguma coisa depois de começar a dieta: cliquem aqui. Ah, e não esqueçam: a URL do Eclipse é http://www.interney.net/blogs/eclipse.
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