20 jun 2016
Quem é brasileiro e gosta de café - quase uma redundância, já que a
bebida está presente em 98% dos lares do país, segundo a indústria do
setor - pode se surpreender com os métodos caseiros de preparo mais
comuns no exterior.
Na Inglaterra, por exemplo, o café coado, modo de extração mais popular
no Brasil, é raro. Em casa e no trabalho, predomina a chamada prensa
francesa, em que pó e água se misturam e um êmbolo com uma tela faz a
filtragem.
E olhe que o gosto pelo café já se espalhou há muito tempo pela
Grã-Bretanha, coexistindo com a paixão pela cerveja e pelo chá, como
afirmam os historiadores Peter Burke e Maria Lúcia Pallares-Burke,
autores do recém-lançado
Os Ingleses
(editora Contexto).
Mas há um método melhor do que outro? O café de coador de pano da vovó é mesmo insuperável?
Para passar essa questão (e o café) a limpo, a BBC Brasil consultou o
engenheiro agrônomo Pedro Ronca, produtor e especialista em café, que
detalhou prós e contras de cada método tradicional - e a influência no
sabor da bebida.
Coador de pano
Processo
: mais simples impossível: coloca-se pó no filtro e depois despeja-se água quente.
Moagem ideal
: fina a média.
Tempo de infusão
: 3 a 4 minutos.
Prós e contras
: método nostálgico, que costuma preencher o ambiente com aromas porque
o café fica suspenso no suporte. Há o problema da higienização do
coador, pois resíduos se acumulam e passam o sabor ao café seguinte. O
correto é usar água fervida para retirar máximo de resíduos - mas poucos
fazem isso.
"Muita gente no Brasil ainda acha que é o melhor sistema, porque está
muito associado ao café da vovó, essa lembrança emocional. Mas o café da
vovó no Brasil é um café ruim, torrado, muito escuro, queimado e feito
nesse coador de pano. Muito quente e servido em xícaras pequenas: você
toma pouco café, e um café forte e (feito) nesse coador de pano", diz
Ronca.
Coador de papel
Processo
: mesmo do café com coador de pano. Uma dica de preparo, que vale
também para todo café coado, é umedecer o pó com um pouco de água
quente, esperar 30 segundos e aí jogar toda a água em fluxo contínuo.
"A extração será melhor, porque todo o pó estará umedecido. Aí quando
você despeja o restante irá extrair mais aromas, porque o café é uma
bebida extremamente complexa, com mais de 800 aromas identificados
cientificamente", afirma o especialista.
E embora muitas pessoas sejam adeptas dessa prática, baristas não recomendam mexer o café durante a extração.
Moagem ideal do café
: fina a média.
Tempo de infusão
: 3 a 4 minutos.
Prós e contras
: o filtro descartável é mais higiênico, mas pode deixar gosto de papel
na bebida. Para evitar isso, uma dica: passar um pouco de água quente
no filtro antes de despejar o pó.
Sobre a temperatura ideal de preparo, o engenheiro agrônomo e produtor diz que há um "mito de que a água não pode ferver".
"Todo mundo já ouviu isso e faz café com água antes de ferver, aí não
atinge 98ºC que é o ideal para extração. Às vezes está 93ºC, 94ºC,
desliga e a extração não fica tão boa. O único jeito de saber se atingiu
98ºC é deixar ferver."
Cafeteira italiana (moka)
Processo
: a água é aquecida no compartimento inferior, vapor sobe e entra em
contato com café, que está em um compartimento com tela sobre a
"panelinha". O vapor resfria e se condensa ao subir, formando o café.
Gera uma bebida mais forte, mais próxima do expresso, pois fica em
contato direto com o pó. Recomenda-se não compactar, ou seja, amassar o
pó no recipiente.
Moagem ideal
: mais grossa.
Tempo de infusão:
até o café começar a fluir na parte superior da cafeteira.
Prós e contras
: praticidade, evita gastos com filtros e há modelos de diferentes
tamanhos. Mas pode haver erros na extração que acabam queimando o café.
"Em geral, as pessoas erram na hora de preparar nesta cafeteira. O erro
principal é fazer com fogo alto, aí o vapor esquenta demais e o café
fica com gosto de queimado. Pode começar com fogo alto, mas na metade do
tempo de preparo para a frente tem que ser bem baixo", diz Ronca.
Uma dica, afirma o produtor, é colocar algumas gotas de água fria no
compartimento de cima. "Você assim evita que aquele café que está
subindo muito quente entre em contato com o metal que está quente demais
- a bebida queima nesse momento."
Outro equívoco no preparo com a cafeteira italiana, diz, é deixar o
fogo ligado até acabar a água - o que também gera muito vapor e pode
acabar queimando a bebida. Ou seja, o correto é desligar o fogo assim
que a cafeteira começar a "assoviar".
Prensa francesa
Processo
: mistura-se o pó à água, e a filtragem é feita empurrando um êmbolo
com uma pequena tela de metal. Método permite a passagem de mais óleos
que carregam compostos aromáticos e de sabor.
Moagem ideal
: mais grossa. "Nesse método você definitivamente não pode usar café
fino, senão irá sentir na boca o pó, o que é desagradável", afirma
Ronca.
Tempo de infusão:
1 a 2 minutos antes de baixar o êmbolo. Quanto mais tempo, mais cafeína
o café terá, pois se trata de um composto solúvel em água. E mais
amargo, pois a cafeína é amarga.
Há controvérsias sobre a necessidade de mexer ou não o café antes de
pressionar o êmbolo. Para Ronca, pode-se fazer isso sem problemas, para
misturar partes do pó que não tenham entrado em contato com a água.
Prós e contras
: sistema de fácil lavagem. Como a cafeteira italiana, é prática e pode ser de diferentes tamanhos.
Outros métodos
Há ainda maneiras mais modernas de preparo - algumas lembram peças de
laboratório, como o Aeropress, uma mistura de café coado, prensa
francesa e expresso, e o sifão, no qual uma fonte de calor aquece a água
em um balão de vidro inferior, que sobe até o compartimento superior e
encontra o café.
Sem falar nas máquinas de café expresso, popularizadas no Brasil na
década de 1990, e que produzem uma bebida concentrada e cremosa - mas,
como se trata de uma extração rápida e intensa e, está mais sujeita a
erros.
"É importante dizer que não dá para falar que um expresso é melhor que
um filtrado, que é melhor que uma prensa francesa. Na verdade é gosto,
são diferentes extrações que geram diferentes produtos, cada um com sua
característica. Como sempre, é uma questão de gosto", conclui Ronca.
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