- Geraldo Magela - 12.mai.2015/Agência SenadoRaimundo Lira (PMDB-PB) diz que pode escolher se declara ou não o dinheiro que tem
Já o senador alega que houve um erro de informação e que os depósitos foram feitos por meio de depósitos de cheques na boca do caixa, que foram erroneamente computados pela contabilidade de campanha como "doação em espécie". No último dia 26, o senador chegou a apresentar à reportagem cópias de cheques que teriam sido utilizados por ele para efetivar a doação, embora não tenha permitido ao UOL fotografar ou copiar os documentos.
De qualquer forma, na declaração de bens que o senador apresentou à Justiça Eleitoral em 2010, para fazer parte como suplente da chapa do então candidato Vital do Rêgo Filho (PMDB-PB), ele declarou um patrimônio de R$ 54,3 milhões, o que o colocou na lista dos 30 candidatos mais ricos daquela eleição. Este montante incluía imóveis, automóveis, barcos, um jatinho e ações de empresas de capital aberto, mas nenhum real em dinheiro vivo ou depositado em conta bancária.
Em entrevista ao UOL, Lira admite que não declarou à Justiça o dinheiro que tinha em casa e no banco e que foi esse capital em espécie que utilizou para financiar a própria campanha.
Com os R$ 870 mil que doou à chapa encabeçada por Rêgo Filho, ele acabou por se tornar o suplente que mais doou para a própria campanha em 2010, tendo sido responsável por 28,9% dos recursos totais declarados por sua chapa eleitoral. Além desse valor, um filho, a mulher e mais três parentes de Lira doaram para Rêgo Filho. Assim, a família Lira é responsável por cerca de 40% do dinheiro utilizado na campanha do atual presidente da comissão de impeachment.
Raimundo Lira afirma que não declarou os valores que detinha em dinheiro porque não tinha a obrigação de fazê-lo. "A Lei Eleitoral deixa a critério do candidato apresentar, na declaração, os recursos financeiros depositados em conta bancária. É prevista esta possibilidade por questão de segurança", afirmou Lira, em entrevista ao UOL. Segundo ele, o candidato poderia correr risco de assalto "se [ladrões] ficassem sabendo quanto dinheiro o cidadão guarda em casa ou no banco".
Sua afirmação não encontra unanimidade nos meios jurídicos. A reportagem questionou o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) sobre o assunto, que afirmou, por meio de sua assessoria de imprensa: "Não há nenhuma lei que faculte aos candidatos deixar parte de seus bens de fora da lista apresentada à Justiça Eleitoral".
Alexandre Rollo, advogado e professor na pós-graduação de direito eleitoral do Instituto Damásio Educacional, também não enxerga qualquer possibilidade legal para que candidatos deixem de declarar a totalidade de seus bens para a Justiça eleitoral. "A Lei Eleitoral (9.405/97) não prevê a possibilidade de o candidato deixar de fora da declaração parte de seus bens. A declaração de bens serve para que a população tenha um controle de quanto o candidato tinha antes do mandato e quanto passou a ter após o mandato. Se ele deixa o dinheiro em espécie de fora da declaração, como poderá ser feito este controle?", indaga o jurista.
Já uma advogada eleitoralista que presta serviços a um partido político, e que por isso pediu para ter sua identidade preservada, afirma poder haver uma interpretação da lei que faça com que seja permitido ao candidato não declarar seus bens em dinheiro. "O artigo 11º da Lei 9.405/97 fala em 'declaração de bens'. Há uma interpretação possível de que dinheiro em espécie não caracteriza bem, no sentido de patrimônio. Por essa interpretação, ele não precisaria declarar dinheiro em conta", afirma a advogada.
De qualquer forma, ainda que a omissão da parte em dinheiro de seu patrimônio fosse considerada irregular, Raimundo Lira não poderia sofrer mais nenhuma punição em relação ao seu mandato. A ocultação de bens poderia configurar crime eleitoral, o que daria margem para uma ação de impugnação de mandato. A propositura de tal ação, no entanto, só poderia ter se dado em até 15 dias depois da diplomação do parlamentar no Senado.
Segundo o advogado Alexandre Rollo, porém, seria possível propor uma ação penal por falsidade ideológica, cuja pena é de um a cinco anos de reclusão. mas o advogado ressalva: "Não quero dizer que a conduta do senador se enquadra no tipo penal previsto. Seria necessário um estudo minucioso do caso para poder afirmar tal coisa. Caso fosse possível, como se trata de um senador da República, apenas o procurador-geral da União teria a competência para propor tal ação", explica o jurista.
De suplente a presidente da comissão
A
indicação de Lira para presidente da comissão de impeachment não gerou
polêmica nem descontentamento, nem dentro nem fora do PMDB.
Desde que foi indicado, tem dito que não sabe em quem votará e que não
levará em conta suas posições políticas enquanto estiver atuando como
presidente da comissão.O presidente da comissão do impeachment é um senador que ficou 20 anos afastado da política e que voltou em 2012, sendo eleito suplente do senador peemedebista Vital do Rêgo Filho.
Lira só assumiu a titularidade do mandato quando seu companheiro de chapa foi nomeado ministro do TCU (Tribunal de Contas da União), em dezembro de 2014. De lá para cá, tornou-se membro titular em quatro comissões do Senado Federal e suplente em outras seis.
Lira é um empresário de 72 anos que não começou ontem na política. O primeiro partido a que se filiou foi o antigo PDS (Partido Democrático Social), atual PP (Partido Progressista), em 1981. Em 1983, deixou a legenda e ingressou no PMDB, sigla pela qual foi eleito senador constituinte em 1986, para um mandato de oito anos com início em 1987.
Trocou de partido no ano seguinte, foi para o PRN (Partido da Reconstrução Nacional). Apoiou o então candidato a presidente Fernando Collor de Mello e fez parte depois da base de sustentação de seu governo até o início de 1992. Nessa época, tiveram inícios denúncias contra o ex-presidente que terminaram por levar à abertura de um processo de impeachment contra Collor e sua posterior renúncia, em dezembro do mesmo ano. Assim, Raimundo Lira deixou de apoiar o então presidente e saiu de seu partido, indo para o PFL (Partido da Frente Liberal, atual Democratas). No Senado, acabou votando a favor do impeachment do ex-aliado.
Ao término de seu mandato, Lira tentou a reeleição, mas não conseguiu. Passou, então, 20 anos afastado da política, dedicando-se às suas empresas, a maioria no ramo de comércio de veículos.
Foi só em 2009 que o empresário paraibano decidiu voltar a concorrer a um cargo eletivo. Para tanto, filiou-se novamente ao PMDB. Com a chapa eleita e Rêgo Filho no TCU, Lira assumiu o mandato. Rêgo Filho ocupava, à época, a presidência de duas CPIs (Comissão Parlamentar de Inquérito), ambas instauradas para apurar denúncias de corrupção na Petrobras.
Já neste ano, no TCU, passou a relatar o processo que julgava as contas do governo federal de 2014. O ministro rejeitou as contas do governo, no que foi acompanhado pelo órgão de contas. A rejeição das contas de 2014 foi o que permitiu a abertura do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff (PT).
Duas semanas antes da votação pela abertura do processo de impeachment na Câmara dos Deputados, Raimundo Lira informou à imprensa nacional e paraibana que a bancada do PMDB daquele Estado havia fechado posição em favor do impeachment da presidente. Posteriormente, quando foi escolhido pelo PMDB para presidir a comissão de impeachment, passou a dizer que não declararia o seu voto nem se deixaria influenciar por suas próprias convicções: "Enquanto eu estiver presidindo (a comissão de impeachment), não vou escutar o meu íntimo".
* Colaborou Leandro Prazeres, em Brasília
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