É fundamental definir o que cada pessoa vai fazer e como vai fazer.
Houve um tempo em que assumir um posto de chefia era uma grande vitória. Hoje em dia, pode ser apenas o começo de um grande desafio. Em "Não tenha medo ser chefe", o consultor empresarial Bruce Tulgan desmistifica a função e aborda o que classifica como maior problema das empresas atualmente: uma "epidemia que subgerenciamento" que afeta toda a escala de comando. Um fenômeno que começou com a chamada geração X (nascidos entre 1965 e 1977) e só se intensificou nos últimos anos.
A função de chefia tem que ser vista não como um fardo ou uma obrigação desgastante, mas como uma oportunidade de ser útil e contribuir para aumentar a produtividade da equipe e ajudar os subordinados a atingirem os resultados que desejam e merecem.
Um cenário bem diferente do que se repete em muitas companhias, onde o gerente se fecha em sua sala para fazer o que julga ser "seu trabalho", mas volta e meia é interrompido para "apagar incêndios". Tanto os funcionários mais brilhantes quanto os menos competentes se desmotivam com situações desse tipo e cobram instruções e reconhecimento. Do outro lado, o superior não ensina a gerenciar nem concede recursos para premiar quem se destaca. E o gerente acaba no meio do fogo-cruzado.
"Não tenha medo de ser chefe" procura mostrar como se tornar o gerente que a pessoa quer ser e que os funcionários esperam, um líder comprometido com seu trabalho. Entre outras coisas, Tulgan destaca a necessidade de dizer a cada funcionário exatamente o que fazer e como fazer, acompanhar e avaliar constantemente o desempenho de sua equipe, corrigir as falhas com rapidez e recompensar os sucessos ainda mais rapidamente.
Ele também se preocupa em quebrar mitos que rondam o gerenciamento, como o de que delegar poder é deixar as pessoas se virarem sozinhas e permitir que gerenciem a si mesmas, que ser justo é tratar todo mundo da mesma maneira, que o único jeito de ser firme é agir como um cretino e que ser um cara legal é deixar cada um fazer o que quiser, que evitar conversas difíceis é a melhor forma de não gerar confrontos com os funcionários, que é preciso ser um líder nato para gerenciar, e que não há tempo suficiente para gerenciar pessoas.
Leia, abaixo, um trecho do livro.
1. A epidemia de subgerenciamento
Você está a caminho da locadora de vídeo. Ao se aproximar, nota dois funcionários batendo papo do lado de fora. Um deles está acendendo um cigarro. Lá dentro, o único atendente parece ocupado demais atrás do balcão para ajudá-lo a localizar o DVD que você procura. Quando você finalmente o encontra, percebe que puseram o disco errado na embalagem. Decepcionado, escolhe outro título e se encaminha para a caixa. Mas, para completar, leva uma eternidade para conseguir pagar. Na saída, amaldiçoa em silêncio o péssimo atendimento e pensa consigo mesmo: "Essa locadora é uma porcaria. Tinham que contratar funcionários mais competentes."
É tentador olhar para esse problema e pôr a culpa nos funcionários ou na empresa como um todo. Mas o verdadeiro culpado está escondido nos bastidores: o gerente. É função dele saber o que está acontecendo na loja e assegurar que o trabalho caminhe da melhor forma possível. Como? Gerenciando as pessoas que trabalham nela! Dizendo aos funcionários o que fazer e como fazer, monitorando, avaliando e documentando seu desempenho, resolvendo problemas com rapidez e recompensando os que se destacarem.
Gerenciar é um compromisso sagrado. Se você é o chefe, é sua responsabilidade garantir que tudo esteja funcionando perfeitamente. Você precisa se certificar de que o trabalho está sendo muito bem feito, com bastante agilidade, o dia inteiro. O chefe também é a primeira pessoa a quem os subordinados vão recorrer quando precisarem de alguma coisa ou quando algo der errado. Se houver qualquer problema, ele é a solução.
Se você é o chefe, é com você que eles vão contar. No entanto é cada vez mais comum deparar com líderes, gerentes e supervisores que não lideram, nem gerenciam, muito menos supervisionam. Simplesmente não tomam as rédeas do trabalho. Não deixam claro o que esperam a cada etapa do processo, não acompanham desempenhos, não corrigem falhas e não recompensam êxitos. Têm medo de fazer isso, não têm vontade fazê-lo ou não sabem como se faz.
Em todo local de trabalho, em todos os níveis hierárquicos, nas empresas de todos os setores, vemos uma chocante e profunda carência de orientação, direção, feedback e apoio diário aos funcionários. É o que eu chamo de "subgerenciamento" - algo bem diferente de microgerenciamento, que peca pelo excesso.
Mostre-me um exemplo de um mau atendimento ao cliente - como o da locadora de vídeos que mencionei - e mostrarei um caso de subgerenciamento. Aliás, mostre-me qualquer problema no local de trabalho e mostrarei um caso de subgerenciamento.
O subgerenciamento custa às empresas uma fortuna por dia. Ele impede que uma enorme parcela de profissionais tenha experiências positivas no trabalho, alcance mais sucesso e receba salários e benefícios adequados às suas necessidades. Faz com que os gerentes suem, sofram e obtenham resultados medíocres. Deteriora a relação com fornecedores e clientes. E cobra seu preço à sociedade de muitas formas.
A epidemia de subgerenciamento estava na nossa cara o tempo todo
Em 1993, comecei a investigar o comportamento profissional da geração X (os nascidos entre 1965 e 1977), as pessoas da minha geração que estavam entrando no mercado de trabalho. As empresas começavam a me convidar para falar em seminários, treinar gerentes, analisar operações, conversar com líderes e dirigir grupos de discussão com funcionários. No início, meu interesse estava nas questões ligadas àquela geração. Eu chegava à empresa, entrevistava os mais novos e organizava um seminário com líderes e gerentes para compartilhar o que os jovens funcionários tinham a dizer. Normalmente, a conclusão era a mesma: "Seus funcionários mais jovens sentem que não recebem orientação suficiente dos respectivos gerentes. Querem mais treinamento, apoio e instruções. Querem mais acompanhamento e feedback."
Não percebi na época, mas as pessoas da geração X estavam, de certa forma, reclamando do subgerenciamento. Quase sempre um dos profissionais mais experientes dizia algo como: "Filho, bem-vindo ao mercado de trabalho. Todos querem ter alguém que segure sua mão, mas ninguém fará isso por você. Quando comecei, era nadar ou se afogar - o tempo inteiro!
Se ninguém lhe dizia o que fazer, você se virava para descobrir sozinho. Depois, esperava que seu chefe o notasse. Se ninguém falasse nada, ótimo. Se algo desse errado, aí sim seu chefe se manifestaria. Com o tempo, você vai ganhar status de sênior e o sistema tomará conta de você. Hoje não é diferente. O pessoal da geração X tem que fazer o que todos nós fizemos. Cumprir com suas obrigações e conquistar cargos mais altos." O que esses trabalhadores experientes estavam dizendo é que, desde que se conheciam por gente, o subgerenciamento sempre fora a norma.
Embora o subgerenciamento estivesse bem diante do meu nariz, levei anos para começar a me dar conta do problema. Ao longo dos anos 1990, com a transição do boom tecnológico para o boom das empresas pontocom, o modo de pensar da geração X se alastrou, e não apenas pela geração seguinte de jovens trabalhadores (a geração Y é uma espécie de geração X acelerada e com autoestima turbinada). Quando as pontocom faliram, foi ficando cada vez mais óbvio que aquilo que a princípio parecera "coisa da geração X" tinha se transformado no comportamento predominante dos funcionários de todas as empresas. O fato de as pessoas da geração X estarem na vanguarda dessa mudança foi apenas um acidente de percurso. Algo muito maior estava acontecendo. O tradicional vínculo hierárquico de longo prazo entre empregador e empregado estava se transformando num relacionamento de troca menos duradouro.
Nos primeiros anos do século 21, os trabalhadores de todas as idades deixaram claro que, sem promessas de longo prazo dignas de crédito por parte dos empregadores, não iriam mais se contentar em trabalhar silenciosa e obedientemente num ambiente de competição feroz. Quanto menos acreditavam que o "sistema" iria cuidar deles por um período extenso o bastante, mais exigentes ficavam em relação a seus supervisores imediatos nas questões de curto prazo. Com a pressão no ambiente de trabalho crescendo sem parar, ficou cada vez mais difícil satisfazer os funcionários.
A partir de meados da década de 1990, acompanhei de perto e estudei a dinâmica do local de trabalho. Dediquei a maior parte do meu tempo ao treinamento de gerentes de todos os níveis: dezenas de milhares de profissionais, desde CEOs até supervisores da linha de frente, de praticamente todos os setores - varejista, de saúde, de pesquisa, financeiro, aeroespacial, de softwares, industrial, público e empresas do terceiro setor.
Eu me entusiasmo com o êxito dos gerentes, seus fracassos me deixam arrasado e seus desafios são meus também. Passei tanto tempo nos bastidores, em tantas organizações, que posso afirmar com conhecimento de causa que a maior parte dos problemas poderia ser evitada ou resolvida de imediato por um gerente pragmático e dedicado, um chefe que reconhece a própria autoridade e a responsabilidade que ela traz. Infelizmente, gerentes dedicados são raros. Muitos se esforçam para melhorar. Alguns nem se dão o trabalho de tentar. A maioria dos chefes deixa tudo correr tão solto que, basicamente, não gerencia, a não ser que não tenha escapatória.
Por que isso acontece?
Folha de São Paulo
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