A ciência afirma que ficar sem comer por períodos determinados pode ajudar a combater a diabetes, doenças cardiovasculares, epilepsia e até o câncer
Cilene PereiraHá várias formas de realizar jejum, mas o modelo básico consiste em alternar os dias em que se come normalmente com aqueles nos quais o consumo calórico é diminuído. É o jejum intermitente. Uma das investigações mais aprofundadas sobre essa versão e suas repercussões para a saúde cardiovascular está sendo conduzida no Instituto do Coração, em São Paulo, pela pesquisadora Edielle Melo, sob a orientação do professor Bruno Caramelli. Eles querem descobrir os mecanismos e as bases genéticas e moleculares associadas a essa modalidade de jejum e sua relação com os fatores de risco cardiovascular, em especial a obesidade e o processo de depósito de gordura nas artérias que irrigam o coração. “Estudos prévios reportaram que a aderência a esse tipo de dieta é maior, sendo, portanto, uma alternativa eficiente”.
INVESTIGAÇÃO
Edielle pesquisa as bases moleculares e genéticas
do jejum e sua associação com as doenças cardíacas
Nos Estados Unidos, o grupo do pesquisador Benjamin Horne, do Intermountain Medical Center Heart Institute, é um dos mais experientes no estudo das repercussões sobre o coração. Suas pesquisas mais recentes somam a análise das reações de 230 pessoas submetidas a regimes diferenciados de jejum. No último trabalho, 30 pacientes tomaram apenas água durante 24 horas. Para esses cientistas, as evidências angariadas ao longo dos anos são de benefício claro. “As pessoas que rotineiramente se abstêm de alimentos por um período apresentam menos risco cardiovascular”, disse Horne à ISTOÉ. Na sua opinião, jejuar por 24 horas, uma vez por mês, é suficiente para produzir benefícios ao coração de pessoas saudáveis. “Para indivíduos que apresentam fator de risco, não está claro qual seria o regime ideal. Mas estamos estudando essa questão”, revelou.
EFICÁCIA
Estudo de Hartman (à frente) mostrou que jejuar reduz crises de epilepsia
Em suas investigações, Horne também constatou que o método pode
auxiliar no controle da diabetes. À igual constatação chegou o cientista
James Brown, da Aston University, na Inglaterra, após fazer uma revisão
dos experimentos sobre o assunto. “O modelo intermitente reequilibra os
níveis de insulina, hormônio que permite a entrada da glicose dentro
das células, e melhora a sensibilidade das células à sua ação”.
Estudo de Hartman (à frente) mostrou que jejuar reduz crises de epilepsia
No Brasil, a ideia de usar a alternativa contra a doença não é consenso. “Na prática, opta-se por uma dieta com restrição calórica e exercícios, que produzem os mesmos efeitos quando associados”, diz a endocrinologista Olga First, do Hospital São Camilo. É preciso avançar nas pesquisas”, completa a endocrinologista Luciana Cavalcante, do Rio de Janeiro.
Essa cautela também se faz presente quando o assunto é a aplicação da descoberta de que jejuar torna as células cancerígenas mais vulneráveis à radioterapia e à quimioterapia. Esta é a conclusão do pesquisador Valter Longo, da Universidade do Sul da Califórnia (EUA), depois de anos investigando o tema. “Privar as células doentes de nutrientes por um tempo causa um estresse adicional a elas e as torna mais sensíveis aos remédios”, disse à ISTOÉ. O especialista acredita que a melhor forma de usar a manobra é prescrever ao paciente jejum três dias antes e um dia depois das sessões. Porém, a médica Maria Aparecida Conte, do A.C. Camargo Cancer Center, de São Paulo, pondera que é necessário mais tempo antes de incluir a técnica na rotina. “Quimicamente faz sentido, mas é preciso entender como seria aplicado.”
fotos: Rodrigo Dionisio/Frame
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