Pagamentos oferecidos a doadoras de óvulos causa alvoroço nos EUA
DAVID TULLERdo The New York Times
Quando era estudante de graduação da Universidade de Washington no final da década de 1990, Wendie Wilson observou alguns anúncios chocantes no jornal do campus: pedidos de que jovens mulheres vendessem seus óvulos pelo que parecia ser uma quantia exorbitante de dinheiro. Mas ela não tinha ideia do que estava envolvido nisso até que ela mesma decidiu passar pelo processo, alguns anos depois.
Para sua surpresa, como Wilson lembrou recentemente, ela descobriu que ajudar um casal infértil a conceber uma criança a fez sentir "fantástica". E certamente apreciou o pagamento de US$ 5 mil. "Parecia uma quantidade relativamente pequena do meu tempo, para o que parecia ser uma compensação bem decente", ela disse. Wilson achou a experiência tão interessante que passou por ela outras quatro vezes, e acabou fundando sua própria agência de doação de óvulos em Los Angeles, a Gifted Journeys, que mantém um registro de 300 a 400 doadoras em potencial.
A demanda por óvulos humanos tem crescido nos últimos anos, alimentada por tratamentos contra infertilidade e o aumento dos investimentos em pesquisas de células-tronco. Jovens mulheres de boas faculdades e universidades, há muito tempo uma fonte valorizada de óvulos, agora estão sendo recrutadas não apenas através de anúncios em jornais estudantis, mas em sites como Facebook e Craigslist, e até mesmo em outdoors nas estradas.
Porém, um estudo publicado na edição mais recente do "The Hastings Center Report", jornal líder em bioética, descobriu que a compensação financeira divulgada em anúncios direcionados a jovens mulheres muitas vezes ultrapassava as recomendações da indústria. O estudo é o estágio mais recente de um antigo debate sobre quanto as doadoras de óvulos devem receber (se é que devem receber alguma quantia).
No estudo, o Dr. Aaron Levine, professor assistente de políticas públicas do Georgia Institute of Technology, examinou mais de 100 anúncios de doação de óvulos encontrados em 63 jornais de faculdades. Ele descobriu que um quarto dos anúncios oferecia compensações que excediam o limite de US$ 10 mil citado em diretrizes voluntárias elaboradas pela Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (SAMR).
As diretrizes afirmam que pagamentos acima de US$ 5 mil ou mais, suficientes para despesas médicas e relacionadas, "exigem justificativa", e que os pagamentos acima de US$ 10 mil "não são adequados". Anúncios em jornais de Harvard, Princeton e Yale prometiam US$ 35 mil para as doadoras, como descobriu o Dr. Levine, enquanto um anúncio colocado em nome de um casal anônimo no "The Brown Daily Herald" oferecia US$ 50 mil por "uma doadora extraordinária de óvulo".
"A preocupação é que algumas jovens mulheres podem escolher doar contra seus próprios interesses prioritários", disse o Dr. Levine. "Elas veem o dinheiro oferecido e ignoram alguns dos riscos".
O estudo observou a possibilidade de que os anúncios representavam uma estratégia de atração, com grandes ofertas elaboradas para seduzir doadoras, mas com preços negociados para baixo uma vez que elas respondem.
Além de limitar a compensação, as diretrizes proíbem o pagamento de valores adicionais para doadoras de óvulos com características especiais. No entanto, o estudo descobriu que cada diferença de 100 pontos na média do exame de admissão de uma universidade estava associada a um aumento de mais de US$ 2 mil nos valores anunciados para potenciais doadoras de óvulos no jornal da universidade.
Clínicas de fertilidade, que mantêm registros de potenciais doadoras de óvulos, tendem a observar as diretrizes em seus anúncios. Agências ou intermediadoras de doações de óvulos, que atuam como corretoras ao conectar doadoras com recebedores em potencial, têm tendência muito maior a anunciar pagamentos mais altos. Ao contrário das agências de doação de óvulos, clínicas de fertilidade geralmente são membros da Sociedade para Tecnologia de Reprodução Assistida, que é afiliada à SAMR, e por isso devem obedecer às diretrizes.
Ruthie Rosenberg, que se formou na Brown University no ano passado, disse que os anúncios inicialmente a assustaram, mas eram tão comuns que ela acabou se acostumando.
"Primeiro, era chocante para mim que as pessoas estivessem procurando mulheres com características específicas, como religião, nota no exame de admissão ou cor de cabelo", disse Rosenberg, 22 anos. "Mas, como qualquer outra coisa que vi pela primeira vez na faculdade, o choque foi passando".
A doação de óvulos é restrita ou proibida em muitos países industrializados. Nos Estados Unidos, em contraste, quase 10 mil crianças nasceram através do uso de óvulos doados em 2006, quase o dobro do número do ano 2000, segundo os Centros de Controle e Prevenção de Doenças. Críticos afirmam temer que jovens mulheres possam não entender os riscos potenciais físicos e psicológicos de longo prazo, incluindo como elas podem se sentir em relação à experiência anos depois.
Sean Tipton, porta-voz da Sociedade de Medicina Reprodutiva, disse que o grupo tinha pouca autoridade sobre os intermediadores de óvulos e que preocupações expressadas em relação à doação pareciam indicar discriminação de gênero. "É interessante que as pessoas se irritem com a doação de óvulos, o que não ocorre com a doação de esperma", ele disse. "Nunca ouvimos discussões do tipo: 'Ah, o doador de esperma vai se arrepender um dia de ter tido um filho'".
Um pagamento comum para a doação de esperma fica abaixo dos 100 dólares e é rápido conseguir o material. O processo de doação de óvulo, no entanto, leva semanas.
Primeiro, uma série de injeções de hormônios estimulam os ovários a produzir 10 ou mais óvulos em um ciclo. Depois, os óvulos são extraídos cirurgicamente, com anestesia local. O valor recebido pelo doador é por todos os óvulos produzidos no ciclo. Quando os óvulos são fertilizados, um ou mais embriões são implantados na mulher infértil, enquanto o resto geralmente é congelado para uso futuro.
A doação pode causar inchaço abdominal, alterações de humor e ondas de calor. O risco mais significativo é a síndrome da hiperestimulação ovariana, que pode causar inchaço, dor abdominal e, mais raramente, coágulos sanguíneos, insuficiência renal e outras condições fatais.
Apesar do crescimento da doação de óvulos como tratamento de fertilização, é o uso de óvulos humanos para criar embriões para pesquisa de células-tronco que polariza oposição entre conservadores e pessoas que são contra o aborto levando a esforços para impor restrições severas em alguns estados.
No último outono (no Hemisfério Norte), a Califórnia adotou uma lei exigindo que anúncios para doadoras de óvulos incluam alertas específicos em relação a riscos para a saúde. O estado já proíbe a venda de óvulos para fins de pesquisa, de acordo com as diretrizes elaboradas pela National Academy of Sciences.
Em contraste, a comissão de células-tronco de Nova York decidiu, no ano passado, que recursos estaduais para pesquisa poderiam ser usados para pagar a mulheres até US$ 10 mil por óvulos doados.
Wilson, 34 anos, dona da agência de doação de óvulos, se opõe à regulamentação do procedimento, afirmando que, de acordo com sua experiência, pagamentos acima de US$ 10 mil eram raros e geralmente reservados a mulheres que já tinham doado antes e cujos óvulos resultaram em gravidez.
Entretanto, alguns defensores da doação de óvulos temem que, se a auto-regulamentação não for suficiente, autoridades governamentais poderiam se sentir obrigadas a tomar medidas contra a prática, como já fizeram outros países. Marna Gatlin, de Scappoose, Oregon, cujo filho de 9 anos foi concebido através desse processo, disse que ficaria mais difícil para outras pessoas se beneficiarem da tecnologia da mesma forma que sua família.
"É uma indústria bilionária e deveria estar se auto-regulando", disse Gatlin, fundadora de uma comunidade online chamada Pais via doação de óvulos. "Se a indústria está se regulando? Não muito. Mas se eu quero que os EUA a tornem ilegal? Não".
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