Todas as objeções aparentemente técnicas e jurídicas que proliferam nas últimas horas, apresentadas pela oposição para impedir a realização do plebiscito sobre a reforma política proposto pela presidenta Dilma Rousseff, escondem apenas um sentimento muito pequeno alimentado desde sempre pelas nossas elites: o medo da voz do povo.
Quando mídia e oposição pensaram que as manifestações nas ruas poderiam ser uma oportunidade de emplacar sua agenda antipetista e antipopular, tentaram jogar no colo da presidenta da República a responsabilidade de atender a todas as demandas. Ela não se intimidou: identificou, corretamente, que a origem do descontentamento estava no modelo de representação política e sugeriu, de forma corajosa, uma reforma no sistema.
Não há a menor dúvida de que a melhor forma de atender aos gritos do povo é dar voz a esse mesmo povo, por meio de um plebiscito, uma consulta direta à população para que indique as linhas fundamentais da reforma a ser implantada no país. Tanto isso é verdade que pesquisa Datafolha mostrou que 68% dos entrevistados apontaram que a presidenta agiu bem ao propor a consulta popular e 73% se manifestaram favoráveis à apreciação do tema.
Quem pode dizer que a presidenta não está atendendo à voz das ruas?
O fato é que a grande mídia e a oposição esperavam conseguir manipular o povo para promover e impor sua agenda de interesses particulares e elitistas. Ouvir, de verdade, o povo para colocar em prática a reforma política que os brasileiros querem, eles não aceitam. É por isso que, de uma hora para outra, deixou de ser tão urgente atender às demandas populares e inúmeras dificuldades começam a ser colocadas para a realização da reforma política.
Intensificam-se as reações à proposta de plebiscito popular, sempre travestidas de restrições técnicas, jurídicas, práticas. Um dos maiores despautérios que têm sido ditos sobre o plebiscito é o de que o PT quer aproveitar o clima de insatisfação para empurrar "goela abaixo" seu próprio projeto de reforma política. Um argumento sempre usado quando o debate sobre a reforma política começa a avançar.
De fato, o PT, historicamente, defende a reforma política e quer mudar o sistema político brasileiro, reduzindo o espaço para corrupção e privilégios. Em contraste, muitos partidos trabalham para mantê-lo como está, falido e com todos os seus velhos defeitos. A maior prova de que o PT quer a reforma política é que existe um relatório pronto para ser votado na Câmara dos Deputados, de autoria do deputado Henrique Fontana (PT-RS).
Avançar, mesmo que seja necessário flexibilizar em alguns pontos
Um texto que coloca em discussão questões como o financiamento exclusivamente público de campanhas, um sistema misto que mantém o voto proporcional uninominal combinado com o voto em lista aberta e o fim das coligações para eleições proporcionais. Essas sempre foram as propostas defendidas pelo PT. Até as manifestações, porém, não houve interesse em votar o projeto.
Agora, a prioridade é avançar, mesmo que para isso seja necessário flexibilizar alguns pontos. Os que dizem que o PT legisla em causa própria esquecem que um plebiscito é exatamente o oposto de imposição: afinal, ao levar a aprovação da reforma política para um plebiscito, o PT corre o risco de ver ideias que defende rejeitadas pela vontade popular. A possibilidade não é um problema justamente porque será a soberana vontade popular que estará decidindo. Já a oposição e a grande mídia temem o plebiscito porque fogem da vontade popular.
E o que apavora a mídia? O plebiscito também vai permitir a quebra do monopólio da informação sobre reforma política. Como o assunto não é de interesse da imprensa, ela reduz ao máximo o espaço dedicado aos defensores da reforma. Com um plebiscito, os lados pró e contra a reforma teriam igualdade de condições de apresentar seus argumentos, que chegariam aos eleitores sem o filtro viciado dos jornais e TVs que querem deixar tudo como está.
Diante da situação a que chegamos, da mesma forma que as pessoas se organizaram para reivindicar a redução das tarifas do transporte público e mais recursos para Saúde e Educação, elas precisam se mobilizar - especialmente em Brasília, centro das decisões -, ir às ruas para que o plebiscito seja realizado e a reforma política aconteça.
José Dirceu
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