Hipocondríaco,
mas um pouco relapso. Estressado e com doenças associadas ao estilo de
vida moderno. Esse foi o principal diagnóstico observado na pesquisa
feita pela empresa ePharma,, sobre o perfil de consumo
de medicamentos por executivos e funcionários de grandes corporações do
país, como siderúrgicas, petroleiras, mineradoras, construtoras,
usinas, companhias telefônicas e prestadoras de serviços, que utilizam
plano de saúde e têm cartão de subsídio para compra de remédios
administrada pela companhia. O universo pesquisado foi de 220 mil
pessoas dos quase 1 milhão de vidas do mundo corporativo atendido pela
ePharma.
O comportamento desse
universo corporativo não foge muito à regra geral da população
brasileira, no qual a automedicação para combater uma simples dor de
cabeça, por exemplo, faz parte da cultura do país, e a crescente
substituição de medicamentos de referência por genéricos reforça uma
tendência global de mercado.
O
que mais surpreende nessa pesquisa é o consumo inadequado de alguns
importantes medicamentos cuja prescrição médica é obrigatória, casos do
Rivotril (antidepressivo), Viagra (combate à disfunção erétil), e de
antibióticos. Além disso, os dados compilados pela ePharma mostram o
alto índice de desistência, sobretudo por parte dos homens, em dar
prosseguimento a importantes tratamentos médicos.
A
ePharma elabora relatórios mensais que são repassados aos seus clientes
para que as corporações possam desenvolver políticas de prevenção de
saúde a seus beneficiários, segundo Luiz Carlos Silveira Monteiro,
presidente da companhia.
Os dados da pesquisa mostram que as mulheres são as que mais utilizam o sistema (57%). As faixas etárias que mais usam são dos 18 aos 29 anos e dos 30 a 39 anos, respectivamente.
Os dados da pesquisa mostram que as mulheres são as que mais utilizam o sistema (57%). As faixas etárias que mais usam são dos 18 aos 29 anos e dos 30 a 39 anos, respectivamente.
O
alto consumo de Rivotril, o oitavo item dos medicamentos mais comprados
com receita obrigatória (em 2010 era o primeiro e em 2009 era o nono), é
considerado um dos mais emblemáticos na pesquisa. A droga, desenvolvida
pela farmacêutica suíça Roche, nos anos 70, para tratar de convulsões,
está entre os dez principais remédios de prescrição consumidos por esse
perfil de usuários nos últimos três anos. O curioso é que nos últimos 30
anos uma nova classe de produtos dessa linha de tratamento foi lançada,
mas esse produto continua entre os mais prescritos.
"O
Rivotril é um dos remédios mais vendidos no Brasil, muito mais que
analgésicos e antibióticos", afirmou ao Valor o médico Marcelo Feijó de
Mello, professor adjunto do Departamento de Psiquiatria da Universidade
Paulista de Medicina (Unifesp). O uso desse medicamento, segundo
levantamento do ePharma, é feito na maioria das vezes por mulheres da
faixa etária 4 (de 40 a 49 anos).
Mello
explicou que esse remédio é coadjuvante em tratamento e não a primeira
escolha de um médico especialista. "Mas como o Rivotril tem efeito
imediato e baixa a ansiedade, é receitado por uma classe médica, que não
é a especializada, como ginecologistas e clínicos gerais, por exemplo",
disse.
Ao Valor, o presidente da
Roche no Brasil, Adriano Treve, afirmou que o Rivotril é um fenômeno de
vendas no país, mas quase nada é comercializado em outros países. "A
Roche não investe nada para promover o Rivotril no país", disse. Em
2011, as vendas de Rivotril (clonazepam) atingiram 14 milhões de caixas.
Os principais concorrentes do produto são os genéricos de clonazepam,
comercializados a preços 35% mais baixos se comparados ao produto de
referência. Nos últimos três anos, as vendas da versão genérica do
medicamento, da classe das benzodiazepinas, cresceram 24,3%.
Hipertensão e doenças cardíacas atingem cerca de 15% dos funcionários corporativosOutro
fato curioso é o uso de Viagra e seus genéricos por homens entre 30 e
39 anos. O remédio não está entre os dez mais vendidos, mas faz barulho.
O consumo desse produto deveria ser feito por pessoas acima de 60 anos.
Segundo Sidney Glina, ex-presidente da Sociedade Brasileira de
Urologia, há três grupos que consomem medicamentos de combate à
disfunção erétil: os que realmente precisam, os que buscam turbinar a
relação sexual, geralmente na faixa dos 30 anos, e os que são inseguros.
"Esse último grupo está na faixa dos 18 anos a 20 anos, que tem medo de
não conseguir ter bom desempenho." Segundo ele, o problema de tomar
esse remédio sem precisar é o risco psicológico.
Na
lista dos dez medicamentos com receita obrigatória os antibióticos
genéricos reinam. O consumo inadequado dessa classe é que se pode criar
resistência a antibióticos, observou Múcio de Oliveira, diretor da
unidade de emergência do Incor (Instituto do Coração). "Conforme vai
criando resistência, o paciente vai ter que tomar drogas mais potentes."
O mesmo vale para automedicação. "É o mesmo que comprar uma peça para
carro sem consultar o mecânico."
De
acordo com Pedro de Oliveira, diretor-médico da ePharma, o alto índice
de descontinuidade de tratamento observado pela pesquisa também é
preocupante. "Cerca de 30% dos que desistem têm doenças consideradas
graves." Segundo Oliveira, os homens são os que mais tendem a abandonar o
tratamento.
Homens são os mais propensos a desistir em dar prosseguimento a importantes tratamentos médicos
Essa postura relapsa tem explicação: "Faz parte da cultura feminina se tratar, do homem não. Depois que deixam de ir ao pediatra, eles acham que não precisam se cuidar. Procurar ajuda médica na linguagem masculina é visto como fraqueza. Ele não quer ter nada, então abandona", disse Múcio de Oliveira, do Incor, especialista em hipertensão. "Após os 40 anos, voltam para fazer acompanhamento de próstata e hipertensão."
Essa postura relapsa tem explicação: "Faz parte da cultura feminina se tratar, do homem não. Depois que deixam de ir ao pediatra, eles acham que não precisam se cuidar. Procurar ajuda médica na linguagem masculina é visto como fraqueza. Ele não quer ter nada, então abandona", disse Múcio de Oliveira, do Incor, especialista em hipertensão. "Após os 40 anos, voltam para fazer acompanhamento de próstata e hipertensão."
As
terapias hormonais e de distúrbios emocionais são as de mais demandas
por esse grupo de usuários do mundo corporativo, nas quais predominam o
público feminino, seguidas pelas de cardiopatias e anti-hipertensivas.
"Cerca de 15% da população tem algum problema cardiovascular e
hipertensivo. E no caso da hipertensão a causa nunca é uma só. Além da
predisposição genética, a doença está associada à alimentação rica em
sódio, obesidade, ambiente estressante, sedentarismo e diabetes", lembra
Múcio de Oliveira.
No ranking
dos remédios isentos de receita, os analgésicos genéricos para aliviar
dores lideram, o que indica um comportamento de automedicação. Os de
prescrição médica também são, na maioria, genéricos. A substituição de
medicamentos de referência por genéricos não é visto como um problema
por especialistas. "Nossa orientação é para dar preferência a
laboratórios conhecidos, que preservem a qualidade e que sejam auditados
pela Anvisa [Agência de Vigilância Sanitária]", afirmou Décio Mion,
chefe de hipertensão do Hospital das Clínicas.
Com
essas informações em seu banco de dados, a ePharma pode traçar perfil
de comportamento para cada corporação. Líder de mercado, a ePharma é uma
empresa de Gerenciamento de Benefícios de Medicamentos (GBM), modelo
muito comum nos EUA. Esse serviço é destinado a empresas e instituições
que oferecem acesso à assistência farmacêutica e integra o benefício do
medicamento à gestão da saúde de seus beneficiários.
Pelo
sistema da ePharma, que atende cerca de 20 milhões de vidas e tem cerca
de 60% de seus serviços voltados para rede de farmácia popular, é
possível tabular todas as informações dos usuários que usam o cartão de
sistema de saúde da companhia. "A empresa tem crescido 25% ao ano de
forma consolidada. Ano passado, investimos cerca de R$ 2 milhões em
tecnologia, o que nos permite ter os dados em tempo real nas 14 mil
farmácias associadas em mais de 500 municípios", disse Monteiro.
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