9.25.2011

Agora, as mulheres sauditas vão poder votar



Em uma ação surpreendente, o rei da Arábia Saudita, Abdullah, anunciou neste domingo (25) a abertura de direitos políticos para as mulheres do reino. A partir de agora, as mulheres poderão integrar o Conselho Shoura, um proto-Congresso que examina as legislações propostas pelo rei, e votar e disputar cargos nas eleições municipais. O jornal saudita Arab News traz parte da justificativa de Abdullah:
Porque nos recusamos a marginalizar as mulheres
na sociedade em todos os papéis que cumprem com
a sharia [a lei islâmica] decidimos, depois de
deliberações com os principais ulemás
[líderes religiosos] e outros, envolver as mulheres
no Conselho Shoura, começando a partir do próximo
mandato”, disse o rei Abdullah. Em segundo lugar,
as mulheres têm o direito de concorrer para integrar
os conselhos municipais. Elas também têm o direito
de votar segundo as regulamentações da sharia.
A notícia foi recebida com elogios por alguns analistas e como um “passo importante na expansão dos direitos das mulheres” pelo governo dos Estados Unidos. Ainda que seja uma medida de impacto, é preciso ter cautela para avaliar as intenções do rei saudita.
É preciso reconhecer que esta é a segunda reação positiva de Abdullah à Primavera Árabe, um fenômeno que vem mostrando com clareza a insatisfação das populações árabes com seus governos autoritários, corruptos e incompetentes. Há alguns meses, ele lançou um pacote de US$ 130 bilhões em benefícios para a população, uma forma de reduzir as insatisfações.
A ampliação dos direitos políticos das mulheres, no entanto, é uma medida meramente cosmética. Na dimensão política, nada muda. O Conselho Shura, que deve observar o trabalho do rei, continuará sendo nomeado integralmente pelo próprio rei. E os conselhos municipais, que podem promover leves mudanças nas cidades sauditas, continuarão tendo 50% de seus membros nomeados. Os outros 50% serão eleitos, e as mulheres poderão concorrer. Na dimensão social, pouco muda. As mulheres agora podem votar em eleições que não passam de uma farsa, mas continuam proibidas de dirigir e continuam precisando de autorização de parentes homens para trabalhar, reservar um quarto de hotel ou mesmo para alguns tratamentos médicos.
A Arábia Saudita existe hoje graças a uma aliança entre a casa real Saud e clérigos wahabistas. Estes professam uma versão ultrarradical do Islã, que defende fidelidade ao governante, independentemente de sua atuação, enquanto ele se mantiver fiel à religião e que dá ênfase a aspectos formais da religião, como as vestes, as peregrinações e a quantidade de vezes que o muçulmano reza por dia, em detrimento de questões como direitos humanos e liberdades civis. Para um rei que comanda uma sociedade como esta, é muito mais fácil aceitar que as mulheres votem em uma eleição que nada vale do que permitir que elas mostrem o rosto em público e dirijam.
Foto: Hassan Ammar / AP
José Antonio Lima
Revista Época

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